26/02/2016 - 20:00
A XP tem levado à risca o ditado popular “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Em suas propagandas, a empresa de investimentos incentiva os brasileiros a saírem dos bancos, trocando produtos tradicionais como cadernetas de poupança por instrumentos financeiros mais rentáveis, como fundos e ações. No entanto, longe dos holofotes, Guilherme Benchimol, fundador e principal executivo da companhia, tem flertado com essa indústria. No início de 2016, Benchimol admitiu formalmente o flerte, divulgando sua intenção de montar um banco. Porém, ele pode encurtar o caminho comprando uma instituição financeira.
Até agora, a XP não participou da disputa de nenhum dos bancos que mudaram de dono. Desde 2011, trocaram de mãos o PanAmericano e o BicBanco, e as operações brasileiras do inglês HSBC e do português Espírito Santo. Todos ficaram com concorrentes com muito mais sinergias – e dinheiro – do que a empresa. Agora Benchimol tem mais uma chance de entrar para o seleto grupo de banqueiros brasileiros. Na sexta-feira 19, o Citibank anunciou que vai se desfazer de suas unidades de varejo no Brasil, na Argentina e na Colômbia.
Permanecerá nesses países atendendo apenas clientes corporativos e institucionais. “(A aquisição) faria todo sentido para nós agora. Um passo relevante para a nossa estratégia”, disse Benchimol à Agência Estado, na segunda-feira 22. “Vamos nos aproximar por meio de nossos sócios estrangeiros, que são muito capitalizados.” Dois fundos de private equity possuem 43% do capital da XP, o americano General Atlantic, que administra US$ 17 bilhões e o britânico Actis, que gerencia US$ 7,6 bilhões.
Os 57% restantes das ações estão distribuídos nas mãos dos sócios e executivos. Benchimol detém a maior fatia. Procurado, o executivo não concedeu entrevista. Por que a XP se interessaria por uma operação que o Citi percebeu que não era tão rentável? A primeira, e principal, razão é a orientação do Banco Central (BC). A ideia original da XP, de montar um banco virtual aos moldes do americano Simple Bank foi desestimulada pelo BC. O plano era ter uma operação sem agências bancárias, permitindo oferecer custos menores para os correntistas.
“A corretora e o banco serão empresas separadas, mas o cliente terá uma experiência única, que vai desde fundos até conta-corrente”, explicou Benchimol em uma entrevista à DINHEIRO em 2014. No entanto, o BC incentivou a XP a comprar uma instituição de pequeno porte para aprovar a sua licença de operação. O Citi está longe de ser pequeno, o que facilita o crescimento e também proporciona boas sinergias, por reunir clientes de alta renda, que, em geral, já possuem uma cultura de investimentos. O apetite da XP pode parecer muito grande quando se comparam os números das duas operações.
No ano passado, a casa de investimentos alcançou uma receita de R$ 700 milhões e teve lucro recorde de R$ 140 milhões, mesmo em um cenário econômico bastante conturbado. “A nossa meta é dobrar o lucro novamente”, afirma Bruno Constantino, sócio da XP. “Temos aberto 7 mil contas por mês, e temos visto oportunidades mesmo nessa crise severa que estamos enfrentando.” Atualmente, a XP possui 120 mil clientes espalhados em 180 cidades, e R$ 30 bilhões de ativos sob custódia. Conta ainda com 1.700 agentes autônomos credenciados. Já a unidade de varejo do Citi no Brasil inclui uma rede de 70 agências, 450 mil clientes ativos e cerca de 1 milhão de cartões de crédito e débito em circulação. Ainda é cedo para se falar em preço.
As operações de varejo ainda estão sob o comando de Hélio Magalhães, presidente do Citibank, e, antes da venda, terão de ser desmembradas do banco e transferidas para a empresa de participações Citi Holdings, algo que só deve ocorrer em meados do ano. Só então os consultores começarão a calcular os valores. Nesse meio tempo, vários concorrentes da XP já estarão se preparando para entrar na disputa. Um dos prováveis candidatos é o Santander, que estava bastante interessado na clientela abonada do inglês HSBC, mas perdeu a disputa para o Bradesco. Ou seja, a XP terá muito trabalho para deixar de ser desbancarizada.