Na semana passada, DINHEIRO publicou, em sua reportagem de capa, a história envolvendo o empresário José Roberto Lamacchia, sócio da financeira Crefisa e da Faculdade das Américas (FAM), e Glória da Graça de Souza, ex-faxineira e funcionária pública aposentada. Eles travam uma disputa milionária na Justiça sobre a transformação irregular do Centro Brasileiro dos Servidores Públicos de São Paulo (Cebrasp), uma associação de classe, no Cebrasp Ensino Ltda, uma empresa privada com participação em várias empresas de Lamacchia. O empresário tornou-se presidente vitalício da entidade e, numa assembleia considerada forjada pela Justiça, mudou a razão social do Cebrasp. Glória, única associada que teve seus dados pessoais considerados válidos naquela assembleia, entrou com pedido de anulação do ato. O Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão ratificada pelo Superior Tribunal de Justiça, em medida cautelar, considerou procedente o pedido da associada e, portanto, o Cebrasp Ensino Ltda. tem de voltar a ser uma associação. Agora, a Justiça analisa o pedido de extinção da entidade, que, se for aceito, pode fazer de Glória a gestora do patrimônio milionário do Cebrasp.

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Depois da publicação, Lamacchia tentou impedir a circulação da DINHEIRO nas bancas e a divulgação do conteúdo da reportagem na internet e nas redes sociais. Porém, o juiz Fernando Antonio Tasso, da 16a Vara Cível do Foro Central de São Paulo, indeferiu a liminar pedida por ele no dia 5 de março. Na quarta-feira 9, o empresário publicou um informe publicitário de meia página nos principais jornais do País, sob o título Nota de Esclarecimento. Em vez de esclarecer, ele distorceu fatos e atacou a revista no anúncio, que em alguns jornais foi assinado por sua “Assessoria de Imprensa” e, em outros, pela Assessoria de Imprensa – FAM – Faculdade das Américas. O texto foi enviado à DINHEIRO em e-mail assinado por Josefa Araujo – Marketing da Crefisa.

Ao contrário do que diz o anúncio, não há motivos para classificar como “completamente falsas as acusações feitas a José Roberto Lamacchia”. O fato, irrefutável, é que o empresário perdeu na Justiça uma ação movida por Glória contra a fraude, na qual foi declarada a nulidade da assembleia que originou o Cebrasp Ltda. A DINHEIRO reconheceu um erro de interpretação na primeira versão da reportagem, que dizia que Lamacchia “perdeu um processo de R$ 500 milhões” para a ex-faxineira, sem possibilidade de recursos. Na verdade, no processo mencionado na reportagem, a decisão definitiva do Superior Tribunal de Justiça refere-se à nulidade da assembleia fraudulenta. O mérito da questão, que pode resultar na condenação do empresário e na devolução dos R$ 500 milhões, ainda não foi julgado e segue em outra ação movida por Glória, com base na decisão já proferida. A revista, que republicou a versão digital da reportagem na segunda-feira 7 com essa correção, mantém as demais informações publicadas com base em documentos e no depoimento de Glória da Graça de Souza.

No anúncio, Lamacchia diz que “não houve a fraude alegada e a cifra de R$ 500 milhões citada pela matéria é inexistente, o que já foi reconhecido pelo Poder Judiciário em decisão proferida em ação cautelar proposta no último dia 5/03/16.” Não é o que diz a Justiça. Primeiro, e por decisão unânime, a fraude foi reconhecida pelo relator do processo citado na reportagem, Roberto Solimene, na época da Sexta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça (TJ). Em sua decisão favorável a Glória, ele deu “provimento ao apelo para julgar a ação, pelo mérito, procedente, nulificada a assembléia e cancelados os seus efeitos, sem prejuízo de oportuna repetição, respeitando os lineamentos do voto”. Na conclusão dessa frase, o desembargador mostra que a repetição do mesmo ato não pode ser feita sem considerar tudo o que foi escrito por ele anteriormente, como “maior diligência e respeito à transparência”, identificação e relação dos associados, além dos ativos que a entidade dispõe. Sem isso, o Cebrasp não poderá se apresentar socialmente. “São imprescindíveis tais dados para a migração patrimonial, pena de se conceber novo ser jurídico já contaminado”, diz o acórdão. Por esse motivo, não se sustenta a versão publicada por Lamacchia de que “houve apenas uma determinação para que fosse refeita a assembleia de uma associação, o que já foi devidamente cumprido”.

Em novembro de 2012, numa nova convocação, ele excluiu Glória do quadro de associados e refez a assembleia, sem a presença dela, na tentativa de validar novamente a transformação da associação Cebrasp em empresa. Na nova assembleia, estavam presentes somente Lamacchia, sua esposa Leila Mejdalani Pereira, e Mara Silva Ramos, secretária particular do empresário. Segundo a ata, o trio “não reconhece” (SIC) a decisão judicial que considerou Glória uma associada legítima. “A Associação não concorda com as conclusões a que chegou o Acórdão proferido e não reconhece que a Sra. Glória da Graça de Souza tenha, algum dia, pertencido aos quadros da associação”. A verdade é que a Junta Comercial de São Paulo (Jucesp) rejeitou as inúmeras tentativas de registro desses documentos, em razão da decisão do TJ continuar válida. Tudo o que se refere ao Cebrasp na Jucesp permanece cancelado.

Também não se sustenta o desmentido sobre a cifra de R$ 500 milhões. O valor, como diz a reportagem da DINHEIRO, seria uma atualização monetária da cifra original do processo, referente ao patrimônio de R$ 150 milhões. No futuro, esse valor poderá ser ainda maior, conforme a correção monetária que for adotada no processo. Somente as três aplicações financeiras no total de R$ 41,4 milhões que a associação Cebrasp possuía na Crefisa antes da fraude valeriam, em fevereiro deste ano, R$ 518,9 milhões, segundo a planilha de correção de débitos judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo, incluídos os honorários advocatícios. Também não houve, ao contrário do que o empresário publicou, reconhecimento sobre isso na decisão que negou a liminar na ação cautelar movida por ele contra a revista. DINHEIRO reafirma seu compromisso de respeito ao leitor e de precisão em toda e qualquer informação publicada. Por isso, a reportagem foi retirada da internet no final de semana para a realização de correções pontuais, como um sinal de boa-fé da Editora Três, e republicada na segunda-feira.

O anúncio do dono da Crefisa também diz que “não é verdadeira a afirmação de que a Faculdade das Américas tenha relação com esse processo e que não pertença a José Roberto Lamacchia, que sempre foi acionista e é o acionista majoritário”. DINHEIRO reitera que, segundo o contrato social de 5 de abril de 2010, o Cebrasp Ensino tinha 90% do capital de R$ 8.000.010,00 da Sociedade Educacional das Américas, a mantenedora da FAM. Alterações realizadas depois dessa data mexem com o patrimônio do Cebrasp, o que pode ser revertido pela Justiça.

Também não procede a afirmação de que o jornalista “não teve a prudência de investigar com afinco o caso e de ouvir o envolvido”. A DINHEIRO procurou José Roberto Lamacchia, na sede da Crefisa, na quinta-feira 3, mas o mesmo não atendeu o pedido de entrevista, nem respondeu às perguntas enviadas por e-mail. O executivo Eduardo Rodrigues, apresentado pela secretária de Lamacchia como diretor de marketing da Crefisa, afirmou que o empresário dificilmente fala com a imprensa, e solicitou o envio de um e-mail para verificar se poderia atender à DINHEIRO. “Vou bastante na sala dele e descubro se ele vai querer falar ou não”, afirmou. No final da tarde, após as 18h00, Rodrigues atendeu uma ligação da revista e disse que não poderia atender ao pedido de entrevista com Lamacchia, pois estava a caminho do jogo entre Palmeiras e Rosário Central, no Allianz Parque, que aconteceu naquela noite. Até agora, as perguntas continuam sem respostas.