Pronto para a largada: com a Mobiauto, Sant Clair de Castro Júnior quer fazer frente à concorrência (Crédito:Claudio Gatti)

Não foram poucas as vezes em que os sócios e vizinhos Sant Clair de Castro Júnior e Guilherme Braga passaram noites em claro para trabalhar num projeto que facilitaria a compra e venda de automóveis seminovos e usados no País. Entre 2017 e 2018, a rota traçada no caminho da dupla envolveu dias de trabalho no corpo diretivo do iCarros, e-commerce controlado pelo banco Itaú, e madrugadas voltadas ao embrião de um novo negócio que ganhou tração no início deste ano. Batizada como Mobiauto, a startup não demorou para decolar.

Se em janeiro eram apenas sete funcionários numa apertada sala de coworking, hoje já são 64 pessoas instaladas em um dos principais arranha-céus corporativos da cidade de São Paulo. A largada para a plataforma da marca só veio em julho, mas os executivos garantem que, apesar do pouco tempo de operação, já contam com 140 mil veículos anunciados no sistema. “Em pouco mais de um mês, já firmamos contratos com 5,5 mil concessionárias de todo o Brasil”, afirma Castro Jr., CEO da Mobiauto. “Mas esse número de clientes tende a aumentar em, pelo menos, 1.300 no próximo mês.”

A evolução rápida só foi possível graças aos relacionamentos que o executivo construiu em seus quase sete anos na iCarros, mas sobretudo ao fundo de private equity americano Zion, que em junho adquiriu uma participação do negócio por R$ 40 milhões. Parte do aporte, no entanto, está atrelado a metas de desenvolvimento nos próximos dois anos. Na primeira fase do modelo de negócios, a principal fonte de renda será a venda de pacotes de anúncios das ofertas. A Mobiauto garante que o veículo esteja presente em todos os meios possíveis.

A empresa, porém, ainda não participa da parte transacional, diferentemente do que já acontece com suas principais concorrentes. “A ideia é oferecer essa etapa do processo no futuro”, diz Castro Jr. “Mas isso só vai acontecer quando tivermos protocolos de segurança com geolocalização para mapearmos a transação”. Até pouco tempo atrás, a Mobiauto atuava em duas etapas do processo de compra e venda de automóveis: B2C e C2C.

Em 13 de agosto, a empresa comprou a PasseCarros – segunda maior plataforma de repasse de veículos entre concessionárias e lojistas no País – e agora marca presença em todas as etapas. “Estamos preocupados em conseguir ajudar a concessionária a vender o estoque dela. Com esse serviço, agora eu consigo ajudar ela a vender para outra empresa”, comenta. As ações devem impulsionar os ganhos da operação, que pretende faturar R$ 18,6 milhões em 2020.

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Não deve demorar muito para que o destino da Mobiauto passe por outros países. A empresa pretende escalar o modelo de negócios na América Latina e já iniciou negociações com possíveis parceiros na Argentina. Hoje, o negócio atende, principalmente, quem quer vender ou comprar carros de passeio ou utilitários pequenos. Em 2020, a empresa deve inserir motocicletas no catálogo e, no ano seguinte, caminhões. Quando questionado sobre os motivos que o levou a investir nesse mercado, o executivo é claro: “Nós somos a primeira plataforma de automóveis com expressão nacional que não é vinculada a bancos”, diz. “Quando um classificado pertence a um banco, ele automaticamente privilegia a si próprio em relação ao financiamento”. Virou comum ver essa ligação no e-commerce de automóveis brasileiro. A Webmotors, por exemplo, pertence ao banco Santander. O iCarros é ligado ao Itaú. A Autoline, por sua vez, é controlada pelo Bradesco. E o Meu Carro Novo é um braço do Banco Votorantim.

A RIVAL Se a Mobiauto ainda aquece os motores para dar passos mais largos em busca de desenvolver esse mercado, o mesmo não pode se dizer da Volanty. Criada em 2017, pelos amigos Mauricio Feldman e Antonio Avellar, a empresa tem evoluído de forma contínua e, no início de agosto, atraiu os olhares do SoftBank, conglomerado japonês que é dono do maior fundo de investimentos em startups do mundo. A rodada ainda contou com aporte do fundo argentino KaszeK Ventures, que foi criado por executivos do Mercado Livre e já apoiou projetos como Nubank e Quinto Andar; e rendeu um investimento total de R$ 70 milhões para a conta da Volanty. “Esse aporte vai ajudar bastante o nosso processo de expansão”, diz Feldman, cofundador e CEO da Volanty.

O modelo de negócio da empresa é um marketplace de seminovos e usados, com 11 centros de inspeção em São Paulo e 3 no Rio de Janeiro. “Ainda dá para crescer muito nos estados em que atuamos. Mas não tenha dúvidas que o nosso objetivo final, daqui a dez anos, é estar no Brasil inteiro, talvez na América Latina”, complementa. Feldman ainda não definiu os próximos passos no roteiro, mas garante que as cidades de Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS) e Brasília (DF) estão no radar.

Esse foi o terceiro aporte conquistado pela Volanty. No início de 2017, um investimento semente de R$ 2,5 milhões, realizado pelo fundo brasileiro Canary, ajudou a transformar o que era apenas uma ideia em empresa formalizada. Não demorou para que outro fundo nacional, o Monashees, aportasse R$ 20 milhões, em 2018. Os investimentos demonstram como o modelo de negócios da empresa é tida como inovador pelo mercado. Quem nunca teve uma dor de cabeça na hora de vender ou negociar a compra de um veículo seminovo que atire a primeira pedra. Na Volanty, o modelo de negócios é simples, mas funcional. Para vender o automóvel, a pessoa acessa o site e realiza um cadastro.

Em seguida, o interessado agenda uma visita aos pontos de inspeção da empresa. No horário marcado, a startup checa 150 pontos do automóvel em até 30 minutos. Quando aprovado, o veículo passa por uma sessão de fotos. Depois disso, o solicitante assina um contrato em que aceita que a Volanty tome conta do processo para a venda em troca de 7% da comissão sobre o valor final. “Como meu objetivo é vender o carro da forma mais rápida possível, o anúncio vai para todos os sites: OLX, Webmotors, Mercado Livre. E também para o nosso próprio portal”, diz Feldman. “Nós tiramos as fotos, inspecionamos o carro e ficamos responsáveis por toda a negociação. As ligações, os e-mails e as mensagens no WhatsApp ficam por nossa conta. Enquanto isso, você pode usar o carro à vontade”.

Segundo Feldman, a Volanty consegue vender o automóvel em até três dias após o anúncio. Em média, quem usa o serviço da startup embolsa 18% a mais que nas negociações realizadas por meio do método tradicional. Uma das próximas etapas da empresa será introduzir um serviço que garanta a opção de desistência do veículo mesmo até sete dias após a compra efetuada. “Se você comprar um carro e não gostar, nós compraremos de volta. Esse serviço, que nós vamos criar em breve, vai ajudar a fazer com que as compras sejam efetuadas diretamente pela internet. Hoje, apenas uma pequena parte disso é feita sem que a pessoa veja o carro pessoalmente na loja”, afirma o CEO da Volanty. “Nos Estados Unidos, mais de 100 mil carros são vendidos 100% on-line a cada ano. Aqui no Brasil, menos de 5% das nossas vendas são efetuadas desta forma.”

A Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto) estima que o mercado de compra e venda de veículos seminovos e usados movimente cerca de R$ 380 bilhões ao ano. Para Ilídio dos Santos, presidente da entidade, é preciso apoiar esse movimento capitaneado pelas startups: “Hoje, a tecnologia é importante para tudo. Ninguém sai de casa para comprar um carro sem ter pesquisado as condições técnicas dele pela internet antes”. De janeiro a julho, a venda de carros seminovos e usados avançou 2,2%, de acordo com a Fenauto. Um estudo da plataforma AutoAvaliar mostra que o comércio eletrônico de automóveis seminovos movimentou R$ 30 bilhões em 2018, resultado 66% acima do verificado no ano anterior. “Essas startups estão criando uma rede para cobrir todo o mercado. A tecnologia possibilitou essas novas formas de se fazer negócios”, diz José Caporal, presidente da Auto Avaliar.

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Outra empresa que tem ajudado a modificar os rumos da compra e venda com auxílio da tecnologia é a InstaCarro, startup fundada em 2015, pelo argentino Luca Cafici e pelo engenheiro brasileiro Diego Fischer. O negócio conecta consumidores ávidos para se desfazerem de seus veículos a concessionárias e lojistas. Foi inspirado, inclusive, em uma startup europeia, a Auto1. Assim como suas coirmãs, a InstaCarro recebeu aportes expressivos, que totalizaram R$ 112 milhões. A operação é compartilhada entre os fundos FJLabs, Global Founders Capital, Hummingbird, Rise e Lumia Capital. “Esses aportes fizeram com que nós duplicássemos a empresa de tamanho nos últimos meses”, diz Cafici. “O meu interesse no mercado brasileiro é muito grande.

O País vende mais de 200 milhões de carros usados por ano”, comenta. O modelo de negócios da InstaCarro é parecido com os das concorrentes, mas a operação está concentrada em São Paulo, com 18 pontos físicos. O cliente agenda a avaliação do carro e depois ele vai para um leilão virtual, em que concessionárias de diversas regiões podem participar. Com tantas alternativas, uma coisa é certa: sua dor de cabeça para vender ou comprar um carro será sanada.