A Apple, empresa fundada por Steve Jobs, é um ícone por qualquer ângulo que se examine. Enquanto seus produtos encantam os clientes, um item menos glamouroso faz brilhar os olhos dos investidores. No fim de junho, data de sua demonstração financeira mais recente, a companhia gerida por Tim Cook mostrou que, depois de pagar os US$ 52 bilhões que deve, ainda ficaria com US$ 152 bilhões em caixa. Essa fortuna torna a Apple uma potencial pagadora de dividendos polpudos. E o melhor: agora, ficou mais fácil para os investidores brasileiros participar desse banquete.

Uma alteração das normas de investimento por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que entrou em vigor no dia 1º de outubro, reduziu a aplicação mínima necessária nos fundos de investimento dedicados às ações e aos títulos de renda fixa internacionais. “Os fundos estão mais acessíveis, o que facilita a diversificação”, diz Carlos Takahashi, principal executivo da BB DTVM, empresa de gestão de recursos vinculada ao Banco do Brasil. É simples de entender a mudança. Até 30 de setembro, quem quisesse aplicar em um fundo brasileiro que compra ações internacionais tinha de provar que era um investidor qualificado.

Para isso, era preciso ter pelo menos R$ 300 mil para cada aplicação. A intenção da CVM em estabelecer um limite tão elevado era impedir que produtos muito sofisticados ou arriscados fossem vendidos para investidores com pouco dinheiro e sem conhecimento do mercado. Com a mudança, as exigências aumentaram, mas a barreira encolheu. Agora, para ser considerado qualificado, um investidor tem de demonstrar que possui R$ 1 milhão em aplicações financeiras. No entanto, uma vez que comprovou essa condição, ele poderá investir em fundos com aplicações mínimas bem menores.

No caso da BB DTVM, por exemplo, os produtos com esse perfil, que ainda estão sendo adaptados às novas regras, exigem aplicações mínimas de R$ 25 mil. “Isso facilita a montagem da estratégia por parte do investidor”, diz Takahashi. Os bancos já se mobilizam para explorar esse novo nicho de mercado. Dentre os grandes, o pioneiro na adaptação é o Citibank. O banco já preparou quatro fundos, três de ações que dedicarão 100% do portfólio a papéis internacionais, e um de renda fixa. “A captação deverá começar na segunda quinzena de outubro”, diz o engenheiro paulistano Mauro Morelli, superintendente de investimentos do segmento do banco dedicado aos clientes que possuem a partir de US$ 1 milhão para investir.

“A mudança na regulamentação transformou o brasileiro em um investidor global.” A mesma receita vale para o espanhol Santander. O único fundo 100% internacional do banco é um composto por ações globais, oferecido para os clientes do private bank, aqueles com vários milhões de reais em patrimônio. “A aplicação mínima do fundo é de R$ 1 milhão, mas agora vamos reduzir essa cifra”, diz João Morais, superintendente de produtos da empresa de gestão de recursos do Santander. Ao longo do ano, todos os bancos deverão colocar um ou mais produtos desse tipo em suas prateleiras, visando atrair o dinheiro dos investidores mais abonados.

Vale a pena embarcar nessa viagem? Takahashi, da BB DTVM, indica uma dicotomia no mercado. “Há oportunidades excepcionais no mercado de renda fixa no Brasil, com juros de 14,25% ao ano e risco baixo”, diz ele. “Quem quiser alternativas mais arriscadas pode optar pelo crédito privado ou por fundos que aplicam em títulos públicos de longo prazo, vinculados a índices de preço.” Segundo Takahashi, esses últimos expõem o investidor a um cenário volátil no curto prazo, mas oferecem taxas atraentes.

Já no caso das ações, o cenário é diferente. Takahashi avalia que a bolsa brasileira tem apresentado solavancos muito grandes nos últimos tempos. Isso decorre não só dos problemas da política e da economia. “A volatilidade é, principalmente, causada pelas oscilações no fluxo de recursos dos investidores estrangeiros, que entra no mercado e que sai dele”, diz ele. Assim, será difícil para o investidor brasileiro encontrar boas oportunidades na renda fixa, mas, quem gosta de ações, pode encontrar boas oportunidades.

Morelli, do Citi, acredita que as melhores oportunidades estão do outro lado do Atlântico. O banco já vem oferecendo ações de empresas européias aos clientes do private bank e agora deverá estender essa alternativa a um público mais amplo, através dos fundos. “A receita que tirou a economia americana da crise está começando a ser implantada na Europa”, diz ele. “A expansão monetária e a injeção de recursos na economia deverão provocar uma valorização expressiva das ações, assim como ocorreu nos Estados Unidos, e esses fundos permitirão acompanhar esse movimento.”

Um ponto fundamental vai diferenciar os fundos: sua estratégia em relação às oscilações do dólar. Morelli, do Citi, afirma que seus produtos reservam uma parte do dinheiro aplicado para montar estratégias de proteção contra os solavancos do câmbio. “O investidor nos fundos de ações vai ganhar ou perder de acordo com o movimento da bolsa, não importando como o dólar se comportou em relação ao real”, diz ele. Já outros bancos, como o Santander, não vão adotar essa proteção, deixando o investidor sujeito aos humores do mercado cambial. “Esses fundos também vão servir como uma proteção contra quem tem dívidas ou despesas em dólar”, diz Takahashi.

É preciso tomar alguns cuidados. O consultor paulista Celso Portásio, especialista em gestão de fortunas, avalia que a diversificação não é recomendável para quem tem pouco dinheiro. “Diversificação de país é algo mais adequado ao investidor abastado, que tem preocupações com o risco soberano brasileiro”, diz ele. Para valores menores, a renda fixa local ainda oferece resultados difíceis de serem batidos, mesmo pelas ações no exterior. “Uma boa aplicação de renda fixa proporciona um rendimento real de 6% ao ano, livre de impostos”, afirma Portásio. “Essa rentabilidade é atraente em qualquer lugar do mundo.”