23/12/2016 - 17:00
A arquiteta Ana Paula Prado, de 43 anos, havia acabado de sair de uma exposição às 2 horas da madrugada, na Vila Madalena, bairro da Zona Oeste de São Paulo. Cansada, ela planejava pedir um Uber para voltar para casa. O aplicativo informou que o preço naquele momento era mais alto por conta da chamada tarifa dinâmica, que é cobrada quando a demanda é maior que a oferta de veículos cadastrados pela startup. “A corrida sairia por R$ 46”, diz Ana Paula. “Cancelei o Uber e peguei um táxi no ponto, pagando R$ 26.”
O empresário Anderson Fernandes, de 40 anos, de Salvador, foi também surpreendido por uma conta de R$ 53 do Uber numa corrida às 4 horas da manhã de sua casa até o Ferry Boat, na capital baiana, numa distância de 13 km. “Paguei R$ 31 para ir de casa até o aeroporto, distante 23 km”, diz Fernandes. “Como pode a distância ser menor e o preço maior?” Assim como Ana Paula e Fernandes diversos consumidores vêm reclamando nas redes sociais da alta no preço das corridas do Uber e da cobrança do cartão de crédito antes mesmo do carro chegar para pegar o passageiro. O site Reclame Aqui, por exemplo, registrava que, na semana de 7 de dezembro, o Uber era a 8ª empresa com maior número de reclamações, acima de TIM, Submarino e Ponto Frio.
Essa derrapada do Uber, que havia se transformado em uma opção econômica de transporte, está abrindo espaço não só para os táxis tradicionais, como também para a espanhola Cabify, a principal rival do Uber no mercado brasileiro. “Erros dos concorrentes estão nos ajudando a crescer”, diz Daniel Bedoya, presidente do Cabify no Brasil. “Nas últimas semanas, por conta dessa questão da tarifa dinâmica, o nível de procura pelos nossos carros é o maior desde que chegamos ao Brasil, em junho de 2016.” A startup vem apresentando um crescimento médio mensal de 60% no número de usuários – dados exatos não são informados.
Com 60 mil motoristas cadastrados no aplicativo, a companhia espanhola opera em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte. No primeiro semestre de 2017, deve estrear em novas cidades com mais de um milhão de habitantes, mas os planos são guardados a sete chaves por Bedoya. Com a irritação dos consumidores e preços mais competitivos, a Cabify tenta tirar proveito da situação para fazer com que novos clientes experimentarem seus carros. Nas últimas sete semanas, a companhia realizou a promoção Sou Cabify, que mostrava aos usuários novos lugares da cidade para os clientes conhecerem. A startup também reduziu os preços em 45% para a categoria Corporate, voltada para empresas.
Cupons de descontos foram também distribuídos aos consumidores. “Com certeza, nos posicionamos como uma marca forte nos pontos de transparência de preço”, diz Bedoya. Criado em 2011, em Madri, o Cabify surgiu para ser um competidor do Uber, fundado três anos antes. Ambos são muito semelhantes em seus serviços. Os dois aplicativos oferecem avaliações dos consumidores, aceitam pagamento com cartão de crédito e apostam no serviço de compartilhamento de carros. As duas startups também permitem que os clientes façam agendamentos. A principal diferença é que o Cabify não cobra uma tarifa dinâmica, ao contrário do Uber.
Desde sua origem, a startup já obteve aportes de US$ 143 milhões de fundos de private equity, como Rakuten, Kevin Laws e Seaya Ventures. O mais recente aconteceu em abril deste ano, quando o Cabify recebeu um cheque de US$ 120 milhões. Boa parte desses recursos, de acordo com Bedoya, virá para o Brasil, sem detalhar o montante. O Uber desde sua origem já captou US$ 12,9 bilhões e está avaliada em US$ 68 bilhões. Procurado para responder as críticas de consumidores, o Uber informa que a tarifa dinâmica sempre existiu, mas que, em novembro, deixou de informar o valor do multiplicador das corridas, embutindo agora a tarifa dinâmica diretamente no preço do serviço.
O pesquisador em mobilidade urbana do Idec, Rafael Calábria, diz que o usuário tem o direito de saber antecipadamente o valor da corrida e ter informações claras sobre a cobrança. “Se foi cobrado outro valor, o usuário pode pedir ressarcimento”, afirma Calábria. “O que temos notado é uma variação muito abrupta de preço.” Os usuários, no entanto, não têm o hábito de acionar o Procon. De setembro a novembro, o Uber teve 16 reclamações sobre cobrança indevida. Empresas de telefonia têm média mensal de mil reclamações.
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Alternativa de transporte
Conheça um pouco mais sobre o Cabify
• Criação: 2011, em Madrid, na Espanha
• Início da operação no Brasil: junho de 2016
• Atuação: serviço de transporte de passageiro privado e corporativo
• Cidades que atua no País: São Paulo, Rio Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte
• Número de condutores cadastrados no Brasil: 60 mil
• Crescimento mensal de passageiros: 60%
• Países de atuação: Brasil, Espanha, México, Peru, Chile, Colômbia, Panamá, Equador, Portugal e Argentina
• Investimentos recebidos: US$ 143 milhões, dos quais US$ 120 milhões em abril de 2016 para expansão na América Latina
• Principais investidores: Rakuten, Kevin Laws e Seaya Ventures