Vivemos tempos de paz. Talvez seja difícil acreditar nessa afirmação, tendo em vista a crise de refugiados e as sangrentas guerras em curso na Síria, no Iraque, no Iêmen, no Sudão do Sul, entre outras. Mas a verdade é que, desde 1945, o mundo experimenta um momento de tranquilidade sem precedente na história – levando em consideração o período entre os faraós e os tempos atuais. Isso se deve, em grande parte, ao fim dos grandes impérios e à bomba atômica. Antes da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, os ingleses governavam, com mão de ferro, um quarto do planeta.

Nas décadas seguintes, seu vasto território foi se desfazendo até sobrarem apenas algumas pequenas ilhas. Esse processo, em tempos passados, só seria possível por meio do surgimento de uma força ainda maior do que o império britânico e, possivelmente, teria custado alguns milhares de vidas. É o caso de absolutamente todos os impérios da antiguidade, desde o Romano, pré-cristão, até o Sassânida, pré-islâmico. Os ingleses, no entanto, aceitaram a perda de território quase de uma forma complacente na maioria das suas colônias (exceto por alguns lugares como a Malásia e o Quênia). As guerras que vivemos hoje estão restritas ao interior dos Estados.

São conflitos civis. Apesar de alguns deles envolverem, indiretamente, outras nações, são, majoritariamente, desentendimentos entre grupos rivais de uma mesma nacionalidade. Não há, atualmente, nenhum país com arroubos expansionistas, como a Alemanha de Hitler. A Europa Ocidental, por exemplo, está há mais de 70 anos sem nenhuma declaração de guerra. Nunca, na história do mundo, o Velho Continente ficou tanto tempo sem um país tentar conquistar o outro. Os Estados Unidos invadiram o Iraque e o Afeganistão e a Rússia vem gerando certa apreensão na Criméia, é verdade.Mas essas são exceções que confirmam a regra. E, mesmo assim, são guerras muito mais econômicas do que territoriais. Há quem diga que essa onda de paz se deva ao surgimento da bomba atômica. Pode ser.

Quando invadir o território do vizinho pode gerar uma briga capaz de dizimar a humanidade do mapa, é natural pensar nisso uma segunda vez. Agora, se fomos capazes de resolver boa parte das nossas diferenças em nível internacional, por que não conseguimos nos entender quando estamos entre iguais? O que leva os colombianos, por exemplo, a votarem não para uma proposta de acabar com um conflito que já dura cinco décadas e causou milhares de mortes e sequestros, como o da senadora Íngrid Betancourt? Guerras civis possuem algumas características únicas que as tornam mais sangrentas. Há uma dificuldade adicional à paz no fato de os dois lados terem de viver juntos após o fim do conflito. Isso cria algumas ansiedades.

Para os vencedores, há o risco de permitir a reorganização do inimigo. Ao mesmo tempo, é difícil oferecer garantia ao lado perdedor contra uma vingança generalizada. Sem perspectivas de estabilidade, os conflitos tendem a durar até que um dos lados esgote completamente seus recursos, sejam financeiros ou humanos. Nesse cenário, parece que a lógica perde espaço para a ideologia. Em vez de um acordo que poderia beneficiar a todos e salvar vidas, escolhe-se a luta até a morte ou a aniquilação completa do inimigo. Mas esses são casos extremos que não têm nada a ver com o Brasil. Afinal, não entramos em guerra com um vizinho desde a década de 1860. Ou, talvez, podemos aproveitar este momento para refletir sobre que o tipo de política que queremos. É uma questão de escolha.