08/07/2016 - 20:00
Todos os olhos da Europa estão voltados para a Itália. O país da bota, acredite, é o próximo grande desafio da União Europeia, que, nos últimos meses, tem assistido a um roteiro político-econômico confuso e surpreendente, cujo início se deu com o Brexit. Antes da votação, a saída do Reino Unido foi vendida como uma série de comédia para o mundo, mas, no final, sua exibição foi dramática. Agora, o Velho Continente não pode mais reescrever essa história. As poucas lágrimas a um dos membros (menos leais) da comunidade têm a ver com a continuidade do roteiro.
A segunda parte caminha para transformar o drama em terror. Se, até aqui, ficou implícito que a histórica votação dos britânicos abriu caminho para novas rupturas como consequência natural, saiba que a menor das preocupações é com o final separatista pensado por extremistas de direita, como a francesa Marine Le Pen, o holandês Geert Wilders ou o italiano Matteo Salvini. A chave para entender essa nova história tem como cenário a cidade de Siena, na região da Toscana. Alguns vão lembrar que a Unesco elegeu o local como patrimônio artístico da humanidade, embora ele possa se transformar no símbolo da ruína financeira europeia, nos próximos meses.
O problema, que poucos ainda se deram conta, está concentrado no Palácio Salimbeni, onde fica o banco Monte Dei Paschi di Siena. Ele é o mais antigo em atividade do mundo e hoje considerado o mais fraco do Velho Mundo. Fundada em 1472, com quase 2,2 mil filiais e aproximadamente 5,3 milhões de clientes, a instituição financeira detém uma carteira de crédito podre de cerca de € 47 bilhões, o que tem provocado calafrios no Banco Central Europeu (BCE). Desde a crise financeira global de 2008, o valor das ações do banco de Siena despencou de € 80 para € 0,30, na semana passada.
Isso significa que o valor de mercado dele caiu de cerca de € 300 bilhões para € 1 bilhão. O governo italiano gritou por socorro e pediu um aporte de € 3 bilhões para equilibrar o velho banco enfraquecido. Um banco só não faz estrago, é verdade. Mas o perigo está na fragilidade de todo o sistema bancário italiano. O nível de crédito podre nas carteiras dessas instituições é 10 vezes maior do aquele que havia nos bancos americanos no episódio que desencadeou a mais grave crise financeira global: o famoso subprime. Esse problema apareceu há dois anos, quando o BCE passou a fiscalizar todas as instituições financeiras do Continente e encontrou erros administrativos e de gestão, como a falta de garantias para cobrir calotes.
Na Itália, há € 360 bilhões de créditos emprestados sem cobertura. O risco iminente de uma explosão é o teste de estresse que o BCE irá promover no final de julho. Instituições como JP Morgan Chase, Citibank e Deutsche Bank começaram a enviar análises sobre o potencial destrutivo concentrado na Itália e o contágio em bancos fragilizados de Portugal e Espanha. Qual é a culpa do Reino Unido sobre tudo isso? A saída de um membro da União Europeia exige que os bancos tenham mais dinheiro para cobrir eventuais perdas.
Na Itália, isso é considerado impossível de acontecer sem a ajuda dos países-irmãos. Os mercados estão novamente ameaçados. Assim que o resultado do referendo no Reino Unido foi anunciado, em 23 de junho, o primeiro ministro italiano Matteo Renzi correu para conversar com a chanceler alemã Angela Merkel para explicitar a necessidade de uma injeção de € 40 bilhões para reequilibrar o sistema financeiro italiano e evitar uma epidemia. Uma injeção de recursos não está descartada, desde que algumas regras sejam cumpridas pelos italianos. Melhorar o roteiro econômico é uma exigência, antes que o choro vire tragédia.