Megatragédias, como a que devastou a região Nordeste do Japão há duas semanas, geram desdobramentos em duas vertentes. A primeira, e sem dúvida a mais importante, é a questão humanitária, que envolve o trabalho de resgatar e acolher as vítimas. 

 

E isso vem sendo feito, inclusive com ajuda internacional. Diversas campanhas para arrecadação de recursos, feitas por empresas de diversos países, além de personalidades como a descolada cantora americana Lady Gaga. 

 

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Terra arrasada: estradas, portos, e cidades inteiras da região Nordeste do país terão de ser reerguidos 

 

Voluntários estrangeiros também integram equipes de resgate que tentam localizar sobreviventes. Finda essa etapa, começa a hora de fazer o rescaldo da situação e pensar na recuperação da infraestrutura necessária para que a rotina das empresas e dos cidadãos, na medida do possível, volte ao normal. Foi assim em 1946, ao fim da Segunda Guerra Mundial. 

 

A recuperação do continente gerou os dividendos que fizeram dos Estados Unidos a principal potência do planeta. Processos maciços de reconstrução fazem parte da trajetória dos japoneses, que souberam reconstruir e multiplicar o potencial da economia do país, a partir dos escombros deixados pelo mesmo conflito. 

 

Mais recentemente, em 1995, a cidade de Kobe foi arrasada também por um terremoto. Na época, sua reconstrução consumiu cerca de US$ 100 bilhões. 

 

Agora, estima-se gastos de US$ 200 bilhões. Nessa conta estão incluídos os recursos para reerguer pontes, estradas e edifícios, por exemplo. E é nesse quesito que as companhias brasileiras poderiam se beneficiar. Especialmente as de engenharia, apontadas como das mais competitivas do mundo. 

 

?Trata-se de uma oportunidade de negócios para as construtoras brasileiras?, disse à DINHEIRO Juan Quirós, presidente do grupo Advento, que atua nas áreas de construção e manutenção. ?E o melhor caminho para entrar naquele país seria por meio de parcerias com as empreiteiras de lá.? 

 

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A Odebrechet é uma das candidatíssimas a aproveitar esse filão. Afinal, a construtora  traz em seu portfólio obras expressivas nos Estados Unidos, incluindo a ampliação do aeroporto de Miami. Além disso, possui experiência em reconstrução de áreas devastadas por catástrofes. 

 

Atualmente, a Ode-brecht toca projetos em Nova Orleans, afetada pelo furacão Katrina, e Angola, país africano arrasado por mais de 20 anos de guerra civil. No ano passado, 55% de sua receita líquida foi obtida no Exterior. 

 

Como a tragédia japonesa ainda está em andamento, as construtoras evitam tratar do assunto, temendo serem alvos de críticas como as desferidas contra o ministro do Trabalho, Carlos Lupi. 

 

Na terça-feira 15, ao ser questionado sobre as possíveis perdas de empresas brasileiras que fazem negócios com o Japão, ele argumentou que, no médio prazo, o saldo deverá ser positivo para elas. 

 

?O Brasil vai acabar, apesar de não desejarmos essa tragédia para ninguém, não tendo prejuízos e até ganhando com isso?, disse Lupi. ?O cenário é realmente positivo para o Brasil?, afirma Paulo Eduardo Palombo, doutor em administração e professor de economia da Brazilian Business School, de São Paulo. 

 

Na verdade, para ele, o terremoto, seguido de um tsunami , poderá, inclusive, interromper o ciclo de estagnação vivido pelo Japão.?O governo terá de injetar recursos no mercado para fazer com que a economia continue girando?, afirma Palombo. ?E isso pode se refletir na compra de mais matérias-primas, especialmente do Brasil.?

 

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E agora? Dificuldade para abastecer fábricas poderá
atrasar a retomada dos negócios em diversos segmentos  

 

As trocas comerciais entre os dois países vêm crescendo ano após ano. Em 2010, as exportações do Brasil  atingiram US$ 7,14 bilhões. Trata-se do maior valor, em termos nominais, dos últimos 20 anos. 

 

Desse montante, US$ 5,07 bilhões se referiram a produtos primários (minério e soja, por exemplo) e US$ 1,16 bilhão foi obtido com itens como motores, por exemplo.  Mais que vender produtos e serviços, o Brasil também surge como uma opção de diversificação industrial para as empresas japonesas.

 

A falta de espaço físico no arquipélago e a ocorrência de megacatástrofes tendem a fazer com que a expansão industrial japonesa cada vez mais se dê fora de suas fronteiras. Esse deve ser o caminho seguido pela gigante Hitachi.

 

?Ainda é cedo para se tomar qualquer decisão. Mas, até para diminuir riscos futuros pode haver uma aceleração das atividades da empresa no Brasil?, diz Flávio Tsuyoshi Iwata, diretor de novos negócios do grupo Hitachi. Dona de um faturamento global de US$ 96 bilhões, a companhia produz desde aparelhos de ferro de passar roupa até navios de carga. 

 

?Hoje, o Brasil responde por apenas 0,3% das receitas mundiais e vínhamos ampliando os negócios paulatinamente com a abertura de uma nova fábrica de ar-condicionado, em Manaus e de subsidiárias locais para negociar antenas parabólicas para tevê digital e ferramentas elétricas?, diz Iwata. 

 

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A Hitachi aponta para a direção correta. ?Faz muito sentido que as empresas japonesas concretizem agora seus planos de internacionalização, que antes eram tratados apenas como projetos?, afirma Cristina Helena Pinto, professora de administração e relações internacionais da ESPM-SP. 

 

Dinheiro parece não ser problema. As companhias japonesas terminaram 2010 com US$ 2,4 trilhões em caixa, acima do valor total do PIB brasileiro. 

 

Essa capacidade de fazer negócios, segundo analistas, vale para corporações de diversos segmentos. Em 2010, os investimentos produtivos do Japão no Brasil somaram US$ 2,4 bilhões. Montante seis vezes maior que o aplicado pela China em igual período. 

 

E um dos principais projetos leva a assinatura da Toyota. A montadora está quintuplicando sua capacidade produtiva no Brasil com a fábrica que será aberta em Sorocaba (SP), em 2012. Orçada em US$ 600 milhões, a planta produzirá até 400 mil veículos por ano. 

 

E a maior fabricante de automóveis do planeta está sendo duramente atingida pela catástrofe. A previsão é deixar de produzir 95 mil carros até quarta-feira 22, período estimado para que seja reestabelecida a produção de veículos em suas 12 unidades no Japão. 

 

No futuro, a unidade de Sorocaba poderia até suprir uma necessidade de exportação da matriz. Mas, no curto prazo, quem deve ter problemas é a filial daqui. Sua aposta no segmento de sedãs grande é o Camry, que custa a partir de R$ 120 mil e é importado do Japão.