24/03/2016 - 19:00
No discurso proferido após sua condução por policiais federais na Lava Jato, o ex-presidente Lula afirmou que se a intenção era matar a jararaca, haviam acertado o rabo, numa indicação de que saíra fortalecido do episódio. A figura de linguagem cabe também à nova polêmica do caso. Nela, o ministro da Justiça é quem tenta acertar a cobra (integrantes da força-tarefa) e fere apenas o rabo, despertando a reação de policiais federais. O levante da categoria contra Eugênio Aragão, recém-empossado na pasta, se deu em resposta às declarações de que poderia afastar servidores suspeitos de vazar documentos, mesmo na ausência de provas, além das informações de uma possível troca de comando na entidade.
A Polícia Federal é subordinada ao Ministério da Justiça, que tem, portanto, a prerrogativa de alterar cargos de confiança e o dever de apurar suspeitas de vazamentos. Porém, a indicação de Aragão foi cercada de questionamentos, por sua proximidade com o governo, e levantou a suspeita de que poderia haver interferências na Lava Jato. “Cheirou vazamento de investigação por um agente nosso, a equipe será trocada, toda. Não precisa ter prova”, bradou o ministro à Folha de S.Paulo, no dia 19. A Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) classificou as afirmações de arbitrariedades e estuda tomar medidas judiciais. Para a entidade, a ameaça demonstra a fragilidade da Polícia Federal diante da falta de autonomia orçamentária. “A troca do diretor-geral implica a troca de todo o corpo diretivo e pode causar atraso nas investigações”, afirmou o presidente da ADPF, Carlos Eduardo Sobral.
O PPS, de oposição ao governo Dilma, entrou com uma ação na Justiça para evitar “uma indevida interferência na autonomia de investigação da Polícia Federal.” O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu prazo de 72 horas para o ministro Aragão dar explicações. Para o professor de Direito da FGV Rio, Ivar Hartmann, sugerir a troca na Polícia Federal neste momento é um erro político. “Quando um ministro dá uma declaração assim, qualquer classe mencionada vai reagir”, afirma Hartmann. O Ministério da Justiça entendeu o recado. Em nota, informou que não há decisão sobre mudanças e garante que o atual diretor-geral, Leandro Daiello, há cinco anos no cargo, goza de “plena confiança”. Na semana passada, a força-tarefa da Lava Jato inaugurou a primeira etapa internacional, em Portugal. Mais uma vez, cabe a analogia ao que disse Lula: a jararaca ainda está viva.