27/12/2013 - 21:00
Atualmente uma preocupação restrita a empresários, o câmbio já teve papel de destaque em eleições presidenciais nas duas últimas décadas. A paridade do real com o dólar aumentou o poder aquisitivo e ajudou a controlar a inflação, levando o ex-ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, um dos patrocinadores do Plano Real, à Presidência em 1995. Sete anos depois, no entanto, a abrupta desvalorização da moeda brasileira, que chegou a R$ 4 por dólar às vésperas da eleição do candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, derrubaria a popularidade do governo tucano.
Hoje, o câmbio não é mais tema do debate eleitoral, embora ocupe as manchetes na mídia quando registra flutuações inesperadas, que pegam companhias endividadas de surpresa, como na crise de 2008, colocando companhias como a Sadia em situação de insolvência. A aparente tranquilidade decorre das reservas internacionais que o País acumulou nos últimos anos: nada menos de US$ 375 bilhões. Não há consenso sobre a cotação ideal da moeda americana. Exportadores preferem um dólar mais valorizado, enquanto importadores lucram mais com sua desvalorização. Já o mercado financeiro defende uma flutuação sem empecilhos à entrada ou saída de capital estrangeiro.
A boa notícia é que uma economia cada vez mais complexa e interligada tem feito com que esses argumentos se aproximem. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), outrora defensora do câmbio desvalorizado para dar competitividade às exportações, já pondera que um dólar muito alto faria subir os custos das empresas que têm parte dos seus insumos importados e dívidas em dólar.“Se houver uma desvalorização abrupta, essas empresas vão ter problemas”, diz Flavio Castelo Branco, gerente-executivo de política econômica da CNI. Para ele, o atual patamar do câmbio a R$ 2,30 é favorável à indústria, mas o importante é que a taxa não sofra grandes oscilações para não atrapalhar os investimentos.
Janet Yellen: ”é importante não remover o suporte, especialmente quando
a recuperação (econômica) é frágil”
A expectativa tanto do governo quanto do setor privado é de que em 2014 o dólar deve subir um pouco, seguindo a tendência já observada no segundo semestre de 2013. O boletim Focus, elaborado pelo Banco Central com base em projeções de analistas do mercado, prevê US$ 1 a R$ 2,45 para o fim do ano, mesmo valor esperado pela CNI. Essas projeções pressupõem uma saída organizada do programa americano de injeção de dólares no mercado, conforme o Federal Reserve anunciou recentemente. “O programa de redução dos estímulos é muito positivo, porque ele é gradual e vai produzir menos volatilidade”, diz o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Janet Yellen, que assumirá o Fed em 31 de janeiro, já indicou que a retirada dos estímulos se dará de forma suave.
“É importante não remover o suporte, especialmente quando a recuperação é frágil”, disse em audiência no Senado dos Estados Unidos. Mas como resposta ao fim desses estímulos, e já se precavendo para uma situação de dólar mais escasso, o Banco Central anunciou no dia 18 a renovação do programa de venda diária da moeda americana no mercado brasileiro, pelo menos até junho de 2014. Desde o fim de agosto, quando iniciou os leilões diários, o BC já colocou no mercado US$ 75 bilhões e foi bem-sucedido em conter as oscilações. “As intervenções não alteram a tendência de desvalorização, mas servem para suavizar movimentos”, diz o economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria.
O aumento da confiança na economia brasileira e um mercado de câmbio mais desenvolvido também tornaram mais rara a possibilidade de uma elevação exagerada. “Hoje temos medidas muito mais eficazes de defesa contra a volatilidade, com reservas muito superiores ao endividamento externo e fundamentos econômicos mais amplos”, afirma Jankiel Santos, economista-chefe do Banco Espírito Santo. Os US$ 375 bilhões em reservas, acumulados no dia 19 de dezembro, equivaliam a mais de nove vezes os US$ 40,34 bilhões da dívida externa. Como se vê, um colchão macio e resistente, capaz de amortecer eventuais choques que surjam no horizonte.