Logo nas primeiras reuniões de diretoria, após o anúncio de fusão do Itaú com o Unibanco, em novembro de 2008, um fato começou a chamar a atenção de Roberto Setubal e de Pedro Moreira Salles, os controladores do novo banco que surgia, o Itaú Unibanco, a maior instituição financeira privada do País. Era muito comum executivos que ocupavam os mesmos cargos estarem trajados de forma diferente: um de gravata e o outro, não. Uma rápida olhada pelos corredores também demonstrava que os funcionários da sede tinham dúvidas de como se vestir, no que eram seguidos pelos mais de 100 mil empregados espalhados pelo País. No Itaú, a gravata, acessório essencial do uniforme masculino nos negócios, já tinha sido abolida às sexta-feiras, no chamado casual friday. 

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No Unibanco, mais conservador e tradicionalista, o nó apertado no pescoço fazia parte da cultura corporativa. Fazia. Desde novembro do ano passado, o Itaú Unibanco resolveu afrouxar o laço e permitir que seus executivos trabalhem sem gravata diariamente. Agora, todo dia é sexta-feira. “A competência está além do uso da gravata”, diz Sergio Fajerman, diretor de gestão de performance, remuneração e benefícios do Itaú Unibanco. As regras no Itaú Unibanco, agora, são claras. É permitido o uso de trajes menos formais durante toda a semana – exceto quando a equipe tiver de atender clientes. Entenda-se por isso o uso de calças de sarja ou algodão com camisa social. 

 

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Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco:

Por que abandonou a gravata? Para criar

um clima mais agradável entre os funcionários. 

 

O jeans continua restrito às sextas-feiras. “Sem a obrigatoriedade do terno e da gravata, conseguimos um ambiente mais confortável, sem tanta demarcação de hierarquias”, diz Fajerman. Ele mesmo nem lembra a última vez que vestiu o traje social completo. “A proximidade favorece um diálogo maior e, consequentemente, possibilita o surgimento de mais ideias para nossos negócios.” A decisão do banco acompanha um movimento que vem se acentuando no ambiente corporativo nos últimos anos. A informalidade só era permitida no último dia útil da semana. Nos outros dias, a gravata era um item considerado indispensável no vestuário dos executivos de grandes empresas, em especial das do setor financeiro, e dava ares de elegância ao traje e seriedade a quem a vestia. 

 

Mas, com as empresas sentindo cada vez mais necessidade de parecer mais modernas e acessíveis aos seus clientes, o acessório começou a cair em desuso nos escritórios. “A gravata está perdendo espaço nas empresas e na vida das pessoas porque hoje as situações tendem para a informalidade”, afirma a consultora de moda e etiqueta Gloria Kalil, contratada para criar um código de vestimenta para os executivos e funcionários do Itaú Unibanco. Assim como o banco controlado pelas famílias Setubal, Villela e Moreira Salles, várias outras empresas também estão deixando mais informais o ambiente do escritório. Nessa lista estão companhias como a fabricante de bebidas Ambev, a rede de supermercados Pão de Açúcar, a subsidiária local da Unilever, do setor de bens de consumo, e a Philips, da área de eletrônicos. 

 

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Paulo Skaff, presidente da Fiesp: Por que abandonou a gravata? Acredita que Não precisa

usar a peça para estar bem-vestido.

 

Considere o exemplo da subsidiária brasileira da montadora alemã Mercedes-Benz, tradicional marca de carros de luxo comandada pelo executivo Jürgen Ziegler, que também afrouxou o uso da gravata. “Luxo não significa formalidade e conservadorismo”, diz Mario Lafitte, diretor de comunicação corporativa da Mercedes-Benz. A empresa não tem um código formalizado sobre como os funcionários devem se vestir, mas o traje mais informal – com peças como calça jeans – fica restrito às sextas. A gravata, no entanto, há tempos deixou de figurar entre os itens obrigatórios do cotidiano, com exceção de solenidades e encontro com autoridades. “A ideia é passar uma imagem mais jovem e conectada, de acordo com os produtos e com o público que miramos”, afirma Lafitte.

 

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Não é apenas a informalidade um dos motivos que têm feito as empresas a praticamente aposentar as gravatas de seus escritórios. Muitas vezes, o clima tropical brasileiro é um argumento e tanto para isso. Que o diga a fabricante de alimentos J.Macêdo, dona da marca de farinha Dona Benta comandada pelo argentino Enrique Ussher, baseada em Fortaleza. “Elas não combinam com o calor do Brasil, principalmente do Nordeste”, diz Sergio Povoa, diretor de relações humanas da J. Macêdo. Como toda regra, há uma exceção. Quando os executivos têm de viajar para o Sul-Maravilha, o acessório muitas vezes é utilizado. É uma prática semelhante à do grupo Algar, de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, com atuação nas áreas de tecnologia de informação, agronegócios e turismo, entre outras. 

 

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Jürgen Ziegler, presidente da Mercedes-Benz do Brasil: Por que abandonou a gravata?

Para dar uma imagem jovem à marca de carros de luxo.

 

O Algar não exige o uso da gravata em cidades interioranas. “No interior não é tão habitual o uso da peça”, diz Rogério Garchet, diretor de marketing da Algar Telecom, a companhia de telecomunicações do grupo mineiro. Em eventos solenes, a gravata ainda não perdeu o seu charme e importância. Para Paulo Skaff, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a peça se faz necessária, principalmente, em Brasília. “No Congresso ou em reuniões com a presidenta Dilma Rousseff, eu levo a gravata comigo”, afirma Skaff. “Eu sentiria estar faltando com respeito se não a usasse em ocasiões como essas.” Gloria Kalil concorda com o dirigente empresarial. “A gravata não deixa dúvidas de que houve um preparo da pessoa antes de um encontro ou uma reunião”, afirma ela. 

 

Com exceção dos encontros oficiais, Skaff, que diz ficar mais confortável sem a gravata, diz não fazer questão de usá-la com frequência. “Não acho que para a pessoa estar bem-vestida precise estar com gravata”, afirma. Com tantos executivos deixando a gravata de lado na maior parte do tempo, será que a peça terá o mesmo fim do chapéu masculino e virará peça de museu? Segundo o professor de design em moda da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), Lorenzo Merlino, à medida que a gravata passa a ser menos habitual no vestuário masculino, mais ela vira um acessório de estilo. “Você não usa porque é obrigatório, mas sim porque acha legal e combina com sua personalidade”, diz Merlino. 

 

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Enrique Ussher, presidente da J.Macêdo:

Por que abandonou a gravata? O clima

de fortaleza, sede da empresa, 

não combina com a peça.

 

Ao aprender a usar a peça de maneira criativa, a gravata deixa de parecer um uniforme para representar uma expressão do jeito de ser de um determinado indivíduo. É o caso de Skaff, que se diz empolgado com a tendência das gravatas finas, célebres nos anos 1960, quando ganharam fama com a banda de rock inglesa Beatles. “Com essa nova moda eu tive vontade de renovar meu guarda-roupa e usar a gravata por opção mesmo”, diz Skaff. Na França e na Itália, por exemplo, as gravatas foram substituídas por echarpes de seda. “Não acho que essa tendência pegará no Brasil, mas não deixa de ser uma maneira inteligente de diversificar”, afirma a consultora de moda Bia Kawasaki. 

 

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