04/03/2016 - 19:40
Em qualquer parte dos Estados Unidos, das agitadas metrópoles, como Nova York e Los Angeles, às pacatas cidades agrícolas do chamado Meio-Oeste, o clima entre os eleitores é um misto de euforia e consternação. Isso porque a chamada Super Tuesday (Super Terça, em português), o dia decisivo para as primárias presidenciais dos dois grandes partidos americanos, com eleições em 12 Estados, começou sob a sombra de uma acusação de racismo. O pré-candidato Donald Trump, o bilionário que passou de zebra para líder na corrida pela indicação do Partido Republicano, levou três dias para repudiar o apoio de David Duke, um ex-chefe da Ku Klux Klan (KKK).
A controvérsia já podia ser observada às 7h da manhã da terça-feira 1º. Os hóspedes de um hotel nos arredores de Los Angeles assistiam às discussões nos canais de notícias sobre o candidato e as previsões para a Super Terça, enquanto tomavam café da manhã. De frente para a tevê, um deles comentou: “Trump é louco”. Outro respondeu: “Ele não vai conseguir nenhum voto de negros e latinos, dessa forma”. Na tevê, Ron Paul, o ex-congressista que buscou a indicação republicana nas duas últimas eleições, representante da ala mais radical do seu partido, dizia na CNN: “A mídia plantou a controvérsia da KKK e agora isso virou o centro das discussões da Super Tuesday”.
Também reclamava das tendências autoritárias de Trump, que seria apenas um populista supernacionalista, não muito diferente do estilo centralizador da lady Hillary Clinton, a favorita para a indicação do Partido Democrata. No começo da noite, estava claro que nem mesmo os ataques de dentro de seu partido afetaram Trump. Ele acabou como o grande vencedor das primárias republicanas, e Hillary, das democratas. Trump venceu em sete estados, chamando especialmente a atenção por serem lugares com perfis de eleitores bastante diversos, como os sulistas Arkansas e Alabama, de um lado, e Vermont e Virginia, de outro.
Os seus rivais se saíram pior do que o esperado. O texano Ted Cruz venceu em três Estados, incluindo o Texas. Já o senador Marco Rubio, o favorito do establishment republicano, venceu apenas em Minnesota, considerado o Estado mais politizado do país. Já, do lado democrata, Hillary bateu Sanders com facilidade no voto das mulheres, dos latinos e dos negros, mas perdeu entre os homens brancos. É um dado que assusta os democratas. A imprensa e os analistas políticos discutiam duas teorias sobre o fenômeno Trump. Por um lado, ele estaria expandindo o número de eleitores do Partido Republicano, graças à sua personalidade, atraindo pessoas que não costumavam votar nas primárias.
A segunda visão, mais propagada, é a de que Trump estaria prestes a quebrar o Partido Republicano ao meio. Naquela noite, num popular bar de Amarillo, no Texas, havia menos empolgação com os prospectos de Cruz, o favorito local, do que com o jogo do Golden State Warriors, o atual campeão da NBA, a principal liga de basquete. “É de se compreender o porquê das pessoas que vivem próximas da fronteira com o México estarem apoiando as propostas de Trump de construir um muro para evitar a chegada de imigrantes”, dizia a garçonete Ashley Remoff.
Uma pesquisa divulgada na terça-feira mostrou que o sentimento de 44% dos republicanos é de raiva com o governo atual. Considerando o desempenho de Cruz e Rubio, parece que nenhum candidato republicano conseguirá deter Trump. “Sendo realista, a saída será barrar Trump, não mais vencê-lo”, disse Ben Ginsberg, advogado e conselheiro dos republicanos. “Pode haver uma tentativa de organizar um cerco aos delegados em 40 dos 50 Estados, para que mudem seus votos.”
Se Trump não conseguir uma vitória por ampla margem, o partido pode pedir uma segunda votação. Nesse caso, os delegados dos Estados ficam livres para votar em quem quiserem, sem levar em conta o desejo dos eleitores das primárias. “Nunca ninguém viu isso acontecer”, afirmou Ginsberg. “Mas também nunca tinha acontecido uma recontagem de votos para presidente”, como ocorreu na eleição de George W. Bush, em 2000. Pode ser a única saída para o Partido Republicano se manter de pé depois do furacão Trump.