10/06/2016 - 20:00
Na quinta-feira 9, o secretário executivo do Programa de Parcerias e Investimentos, o piauiense Wellington Moreira Franco, estava no Rio de Janeiro e, no dia seguinte, iria para São Paulo. No sábado, planejava voltar ao Rio e, no domingo, tinha voo para Brasília. Talvez isso explique porque demorou para responder à mais simples das perguntas: “Onde o senhor mora?” Incansável, Franco, um dos nomes mais importantes no governo do “presidente em exercício”, como se refere a Michel Temer, viaja muito atrás de seus objetivos. Em sua lista, ele coloca em primeiro lugar a implantação de projetos de infraestrutura pelo Brasil para gerar empregos. Ex-governador do Rio, além de ex-prefeito do distrito fluminense Niterói e deputado federal eleito três vezes pelo Estado – sempre pelo PMDB – é na Cidade Maravilhosa que ele passou a maior parte de seus 71 anos de vida, e onde reside com a família.
Nesta entrevista à DINHEIRO, Franco, que no governo Dilma foi ministro da Aviação Civil, chama a atual situação institucional do Brasil de “esdrúxula”, “histérica”, “crítica” e “perversa” por ter a presidente da República afastada, o presidente da Câmara dos deputados também afastado e o presidente do Senado e do Congresso com pedido de prisão no Supremo Tribunal Federal. Mas, diz ele, temos que nos acostumar com esse cenário e entender que, apesar de tudo, as instituições estão funcionando perfeitamente e esse conjunto de paradoxos compõem uma democracia.
DINHEIRO – Possíveis investidores e empresários querem saber: o governo Temer vai durar? Como o sr. trabalha neste cenário?
MOREIRA FRANCO – Isso é uma questão que existe, sim. E nós tivemos uma experiência recente que mostra o prejuízo que esse impasse está causando ao Brasil. Tínhamos a possibilidade de fazer leilões de seis portos, basicamente no Pará, e já havia a manifestação de grupos interessados. Mas, diante deste quadro de insegurança política ou, pelo menos, de conturbação, eles manifestaram desejo de esperar até que essa situação se esclareça de maneira definitiva. Ter dois presidentes é uma coisa absolutamente esdrúxula.
DINHEIRO – Como o Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) será tocado?
MOREIRA – O PPI é uma força-tarefa que vai trabalhar supervisionando e coordenando ministérios e agências reguladoras com o objetivo de retomar os processos de parcerias nas áreas de aeroportos, portos, óleo e gás, ferrovias e rodovias, mantendo contato com Estados que estejam interessados em fazer concessões. Evidentemente, um dos problemas que já estamos sentindo para que essas iniciativas se realizem por intermédio dos leilões é a confiança na solução deste longo processo de impeachment que obriga o Brasil a ter uma presidente afastada e um presidente em exercício. Um processo longo, atritado e desgastante.
DINHEIRO – Há outros exemplos, além da perda de negócios nos portos?
MOREIRA – Este é um exemplo que dei para mostrar o estado de ânimo. Um dos grandes problemas que o Brasil vive em função dos erros de política econômica, de política de parcerias do governo passado é o da falta de confiança. No caso das concessões, havia mudança de regra no meio do jogo, não ficava claro o papel dos agentes responsáveis pelo processo, algumas agências faziam audiências públicas antes do Tribunal de Contas. Ou seja, o ambiente regulatório é ainda muito confuso. Por outro lado, havia também uma atitude do governo de querer fixar a taxa de retorno, como se fosse possível alguém fixar isso. Vamos exemplificar de forma simples: se uma pessoa quer comprar um quilo de feijão, ela vai a um supermercado, olha o feijão, acha caro, vai a outro supermercado e compra naquele que for mais barato. Não é o cliente e nem o dono do supermercado que fixa o preço. É o jogo do mercado. O governo Dilma quis, ele próprio, praticar a fixação. Para isso, tinha que dar vantagens indiretas para diminuir o custo e adequar o valor de investimento à taxa de retorno. Aí, impunha ao BNDES empréstimos TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), que o Tesouro acabava tendo que cobrir a diferença (do mercado) ou fazia com que as empresas públicas assumissem parte da execução de obras. O governo já estava sem dinheiro, o problema fiscal já era grave, a empresa pública não pagava. Isso gera o desequilíbrio financeiro que faz com que, hoje, várias concessionárias estejam querendo atrasar suas obrigações.
DINHEIRO – Qual é o foco agora?
MOREIRA – São os 11 milhões de desempregados, com projeção de chegar a 14 milhões até o fim deste ano. Então, precisamos urgentemente gerar empregos, e a melhor área é a de infraestrutura. Um real colocado na infraestrutura gera três vezes mais emprego do que em outros setores da produção. E aí, por determinação do presidente Temer, nós criamos esse programa (PPI) que só cuida de parcerias e infraestrutura, para que tenhamos foco e meta, efetivamente. E para cobrar. Vamos trabalhar em conjunto para vencer a mais grave crise econômica da nossa história.
DINHEIRO – Em relação aos modelos de parcerias público-privadas para destravar os projetos de infraestrutura e, consequentemente, a economia para gerar empregos, qual é o mais adequado?
MOREIRA – Antes de falar sobre o modelo escolhido, vou abordar alguns problemas, de uma série, em iniciativas que já estão em andamento. Por exemplo, problemas ambientais. São licenças que estão paradas ou sem solução e precisamos estimular, mobilizar o Ministério do Meio Ambiente para resolver, dar decisões. Tem exigências do Tribunal de Contas não cumpridas e questões decorrentes da qualidade do projeto ou de discussões de contratos e regulações. Então, o modelo que vamos adotar é começar pelos problemas mais rápidos de serem resolvidos até chegar aos mais complexos e demorados. Para isso, temos conversado com o Tribunal de Contas, vamos chamar o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para nos ajudar porque precisamos ter um ambiente concorrencial, coisa que não existe ainda.
DINHEIRO – Onde o sr. vê mais possibilidade de PPPs?
MOREIRA – Em todos os lugares, desde que haja transparência, segurança jurídica, marcos regulatórios que inspirem confiança e sejam claros. Aí, restabelecemos a credibilidade de nosso sistema. Temos uma população grande e com necessidade de infraestrutura eficaz. E esses investimentos vão gerar empregos, que é o que nós precisamos dramaticamente.
DINHEIRO – Como vai lidar com a taxa de retorno?
MOREIRA – Primeiro, a taxa de retorno será fixada pelo mercado, não pelo governo. Segundo, nós precisamos garantir que as nossas regras e os procedimentos dos nossos processos de organização e realização dos leilões sejam do conhecimento de todos. E é exatamente isso que vai reestimular a confiança. Correndo em paralelo, há a importância enorme dos canais de financiamento. Precisamos que o sistema financeiro nacional e estrangeiro se sinta seguro e estimulado a financiar investimentos às empresas que se dedicarem a prestar os serviços nas diversas áreas de infraestrutura.
DINHEIRO – Com os limites de participação do BNDES no financiamento de grandes projetos, uma alternativa seria atrair as seguradoras para obras de infraestrutura, como acontece em outros países. O sr. estudou esse modelo?
MOREIRA – Essa alternativa de trazer as seguradoras já vem sendo debatida no Brasil há muito tempo, não só para parcerias, mas até para obras públicas. Mas essa discussão não tem avançado até porque a introdução de seguradoras nesse processo evita a pouca transparência já que o acompanhamento da execução das obras é feito principalmente pelas seguradoras. São elas, em última instância, que terão que cobrir os prejuízos decorrentes de qualquer trabalho mal feito.
DINHEIRO – O ministro da Fazenda Henrique Meirelles disse que os “investidores começaram a botar a cabeça para fora da caverna”. Concorda?
MOREIRA – Estou muito otimista. A questão é o impeachment, que é um processo longo, inquietante, que não estimula a pacificação, mas a discórdia e a intransigência. Evidentemente, está na lei, tem que se cumprir. Espero que depois dessa experiência se reveja esse procedimento, porque não é possível você ficar esse tempo todo numa espécie de ‘samba de uma nota só’, a defesa do mandato.
DINHEIRO –A Lava Jato está atingindo em cheio o PMDB. Isso pode gerar mais instabilidade e prejudicar os investimentos?
MOREIRA – A Lava Jato vai continuar o seu trabalho. As instituições, criadas pela Constituição de 1988, estão funcionando: o Ministério Publico, o Poder Judiciário, a Polícia Federal. E há independência entre os poderes. Isso faz parte do patrimônio institucional do País. Agora, estamos em uma situação histérica do ponto de vista histórico. Não conheço nenhum outro caso como o nosso porque temos a presidente da República afastada, o presidente da Câmara dos Deputados, segundo na linha de sucessão, também afastado, e o presidente do Senado e do Congresso com pedido de prisão em análise no Supremo Tribunal Federal. Existe cenário mais crítico e perverso que este, do ponto de vista institucional? Provavelmente, não. Mas está tudo funcionando, o Congresso vota, o Tribunal pune e decide, a polícia investiga, o Ministério Público constitui processos que são julgados. Todos têm direito a se defender, os que tiverem culpa serão punidos, os que não tiverem serão inocentados. Então, temos que dar a esse processo um tratamento de coisa absolutamente normal dentro de um sistema democrático e não transformar isso na grande questão nacional. O grande desafio nacional é gerar milhões de empregos para os desempregados. A Polícia Federal deu agora um bom exemplo ao apurar e punir um membro da própria corporação, o policial Newton Ishii, conhecido como Japonês da Federal. Isso vai dando credibilidade ao País, criando cultura institucional, fortalecendo a democracia. É assim que temos que ir.