Não é novidade para ninguém que as principais agências de classificação de risco passaram vergonha no auge da crise financeira internacional, em 2008, por não terem conseguido prever o estouro da bolha imobiliária. Pior: deram selo de qualidade para produtos financeiros podres, que se mostrariam grandes micos nas mãos de investidores mundo afora. Desde então, recuperar a credibilidade tem sido uma tarefa difícil para esses supostos detentores da palavra final sobre quais países são potencialmente os caloteiros. A má vontade com o Brasil parece ser uma diversão para essas agências, embora não possamos negar que o histórico de moratórias e os pedidos de ajuda ao FMI, nas últimas décadas do século passado, tenham manchado o currículo do País. 

 

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A novidade, no entanto, é uma enorme divergência entre as três principais agências sobre a atual situação fiscal do Brasil. Na segunda-feira 6, a Moddy’s afirmou, em relatório, que o Brasil tem “flexibilidade fiscal limitada” para conter gastos, com 80% das despesas voltadas ao pagamento de salários, aposentadorias e benefícios sociais. No entanto, ao contrário do que previam muitos analistas do mercado financeiro, manteve “estável” a perspectiva para a nota de risco brasileira neste ano. No dia seguinte, outras duas grandes agências internacionais se manifestaram. 

 

A Standard&Poor’s, que em 2011 rebaixou a nota dos Estados Unidos – como se houvesse algum risco de a maior economia do mundo dar um calote –, informou que a classificação brasileira pode ser reduzida a qualquer momento, antes ou depois das eleições. Com um tom de desdém característico de quem se julga acima do bem e do mal, Joydeep Mukherjee, diretor responsável pela área Ratings Soberano da S&P, disse que não pode ficar de “mãos atadas” pelas eleições presidenciais. A Fitch, por outro lado, informou que a nota das contas públicas brasileiras pode ter uma indicação de alta se houver um crescimento expressivo da economia que, consequentemente, reduza a relação entre dívida e PIB. 

 

Estão todas falando sobre o mesmo País? Na verdade, a análise da situação fiscal precisa ser feita sem paixões ou ideologias que normalmente permeiam esse debate. As contas públicas brasileiras estão distantes de uma situação invejável, assim como não guardam nenhuma relação com a crise fiscal enfrentada por vários países europeus. Antes de tirar uma semana de férias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, antecipou o anúncio de que o governo federal havia cumprido a meta de economizar R$ 73 bilhões em 2013. Nas palavras do ministro, o objetivo era acalmar os “nervosinhos”, espécie na qual as agências de risco podem ser incluídas. Como ainda não foram divulgados os detalhes das contas, ficaram dúvidas sobre eventuais manobras que o Tesouro teria feito para atingir a meta, como postergar para 2014 pagamentos do ano passado. 

 

Para faturar mais com a boa nova, bem que o ministro da Fazenda poderia ter dado um banho de chá de cidreira nos mais estressados e cravado a meta fiscal para 2014, explicitando ao mesmo tempo de que forma o governo pretende cumpri-la sem malabarismos e contabilidade criativa, como ele próprio se comprometeu no ano passado. Dados os arranhões recentes na credibilidade junto aos agentes do mercado financeiro, o governo vive o velho problema de Pompeia, a esposa do imperador romano Júlio César, a quem não bastava ser honesta, tinha de parecer ser honesta. No caso das contas públicas, não basta o Tesouro ser transparente, é preciso parecer transparente. Quem sabe, assim, as agências de classificação de risco parem de bater cabeça.