25/07/2012 - 21:00
Em 1983, um jovem funcionário da Siga, desenvolvedora de programas para grandes computadores, conseguiu convencer seu patrão, Ernesto Haberkorn, a embarcar como sócio na nova onda que inundava o mercado, a microinformática. De estagiário promissor, o paulistano Laércio Cosentino lançava a Microsiga, que se tornaria uma das mais bem-sucedidas empresas de serviços de tecnologia do Brasil. Rebatizada como Totvs e com 45 aquisições efetuadas nos últimos sete anos, a companhia, que faturou R$ 1,2 bilhão em 2011, está presente em 23 países. “A próxima etapa é consolidar a empresa como uma referência global”, diz Cosentino, retratado como “mestre das fusões” pela DINHEIRO, em setembro de 2009.
Ação e reação: para se adaptar aos planos econômicos, os bancos tiveram de investir pesado
em automação. Hoje, são destaque mundial na área.
Não se trata de excesso de ambição. Mesmo sem estar na ponta da inovação, o Brasil se tornou uma potência na informática. De acordo com o Gartner Group, toda a cadeia de serviços e produtos ligados à tecnologia da informação (TI) deverá movimentar US$ 140 bilhões, em 2012, no País. Trata-se do principal emergente depois da China, e mais forte que o mercado indiano, que presta serviços de outsourcing para empresas de todo o planeta. “Nosso mercado interno é do tamanho das exportações em TI da Índia”, diz o consultor do IDC, Anderson Figueiredo. Foi isso que atraiu até mesmo as indianas como a Tata e HCL, que aportaram por aqui. A estratégia da Totvs, bem posicionada na América Latina, segue no mesmo caminho de outras empresas de sucesso.
Liderança verde-amarela: a curitibana Positivo Informática é a maior fabricante de computadores
do Brasil. Um caso exemplar de empresa nacional que lidera esse setor.
É o caso da Stefanini, que aparece no ranking anual da Fundação Dom Cabral, de Belo Horizonte, como a terceira empresa brasileira mais internacionalizada, atrás do frigorífico JBS e da siderúrgica Gerdau. A companhia detém 61% de seus ativos no exterior e opera 30 escritórios em países que vão do Canadá à África do Sul. “As empresas brasileiras de serviços de TI têm muita capacitação, mas isso é pouco divulgado”, diz Marco Stefanini, fundador e controlador da empresa. “Temos ainda muito espaço para crescer lá fora.” Segundo ele, 40% das receitas de R$ 1,6 bilhão previstas para 2012 virão das operações externas. Parte dessa trajetória de sucesso de empresas brasileiras como a Microsiga e a Stefanini se deve à controversa Lei da Informática, que restringiu a importação de equipamentos e obrigou os desenvolvedores a ter jogo de cintura para atender à crescente demanda local.
“A gente se virava com os equipamentos disponíveis e, ao mesmo tempo, enfrentava a concorrência direta em software, por isso ficamos muito bons na prestação de serviços”, diz Cosentino. Revogada em 1992, no governo Collor, a lei foi uma alavanca para a indústria do software e também fomentou cursos pioneiros na USP e Unicamp. Foi essa primeira geração de desenvolvedores que ajudou a criar mercados de excelência em setores como o de automação bancária. O caos econômico brasileiro daquela época também deu um empurrãozinho. “Pior que a inflação eram os planos econômicos malucos, que obrigavam os bancos a mudar o sistema inteiro em 48 horas”, lembra o consultor Figueiredo, do IDC.
Destaque global: reportagem de 2011 revelava que o Brasil
era estratégico no plano de renascimento da Dell.
E foi justamente no setor bancário que surgiram companhias como a Itautec, líder em automação bancária que ainda resiste sob o controle do grupo Itausa. Parte das companhias independentes acabou incorporada a instituições financeiras, como a Cobra (Banco do Brasil) e Scopus (Bradesco), enquanto outras foram adquiridas por multinacionais. É o caso da Edisa, com a HP, e da CPM Braxis, hoje da Capgemini. Por outro lado, o fechamento do mercado teve sua faceta perversa, atrasando a indústria de hardware. Na época, o consumidor tinha de se contentar com os pesadões – e caros – computadores da Prológica. Ainda assim, o Brasil conseguiu recuperar parte do tempo perdido e é hoje um dos poucos países no qual o maior fabricante de PCs é nacional.
Criada em 1989, a Positivo Informática lidera os mercados do Brasil e Argentina. Em 2011, foram 2,4 milhões de computadores vendidos pela empresa paranaense, com receita de R$ 2,3 bilhões. Na briga com multinacionais como a Dell, há espaço também para fabricantes que trabalham em faixas de preço mais altas, como a Itautec. O desafio das empresas brasileiras não se resume a crescer no exterior. O mercado interno continua oferecendo vastas oportunidades, com o maior acesso a renda e a serviços básicos pela população. “Estamos em uma encruzilhada. Com a tecnologia, o Brasil pode dar seu grande salto na educação”, diz Stefanini. “Sem ela, nossa distância pode aumentar ainda mais em relação aos países ricos.”