Os “nerds”, como são chamados os aficionados por tecnologia, deixaram de ter fama de “perdedores” quando um dos seus, um certo Bill Gates, o fundador da Microsoft, se tornou o homem mais rico do mundo, em meados da década de 1990, abrindo as portas do setor para sua tribo. Uma outra turma, a das mulheres, no entanto, levou bem mais tempo para ser admitida e chegar ao cume da carreira nas gigantes do mundo digital. Afora o exemplo pioneiro de Carly Fiorina, CEO da HP, entre os anos 1999 e 2005, o Olimpo corporativo parecia interditado ao blush, batom e salto alto. Mas isso está mudando. A indicação de Virginia Rometty, 54, para suceder o chefão da  IBM, Sam Palmisano é o mais novo lance desse processo de ascensão e valorização das profissionais do sexo feminino na área,  considerado um campo privilegiado dos homens. Ao mesmo tempo, sua nomeação elevou para 18 o número de mulheres que comandam uma das 500 maiores empresas do mundo, listadas pela revista americana Forbes. Virginia forma, ao lado de Meg Whitman, da HP, e de  Ursula Burns, da Xerox, o trio de CEOs mais poderosas do ramo tecnológico.

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Será a primeira vez que uma mulher vai presidir a IBM em seus mais de 100 anos de história. Virgínia ingressou na Big Blue em 1981, como engenheira. Em 2002, ano em que Palmisano assumiu a presidência da companhia, Virginia teve um papel fundamental na compra da PricewaterhouseCoopers, por US$ 3,5 bilhões, e na formação da divisão de consultoria da IBM, hoje uma das áreas mais estratégicas para seus negócios. O sucesso da empreitada, na época encarada com ceticismo por muitos analistas, deu início também a uma parceria de sucesso entre a executiva e seu chefe. Virgínia passou a liderar a transformação da IBM, conhecida como fornecedora de software e equipamentos, em uma empresa de serviços, como traçara Palmisano. Em 2009, ela assumiu a vice-presidência de marketing, vendas e estratégia da companhia, já transformada na maior empresa de serviços de tecnologia do mundo, com receitas anuais de US$ 100 bilhões.  

Desde o ano passado, o mercado já especulava sobre a sua promoção.Sua afinidade com Palmisano, que completou 60 anos em 2011, idade em que, tradicionalmente, os CEOs da IBM se aposentam, a   transformava em candidata natural para sucedê-lo. “Ela é mais do que uma esplêndida executiva operacional”, afirmou Palmisano ao anunciar o nome da sucessora, há duas semanas. A expectativa é de que Virginia possa continuar o trabalho de seu antecessor, sem muitas mudanças. Se Virginia é um fator de continuidade, numa IBM que aparentemente navega em céu de brigadeiro, sua colega, Meg Whitman, chega ao comando da grande rival HP, num período de turbulências, encarregada de apagar incêndios. Enquanto Virginia colhe os frutos de uma estratégia bem-sucedida adotada por seu antecessor, Meg, CEO da HP há um mês, tem pela frente a tarefa de recolocar no rumo a número um entre os fabricantes globais de computadores e equipamentos de informática, com receitas de US$ 126 bilhões,  após a conturbada saída do executivo Leo Apotheker da presidência. 

 

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Em menos de um ano no posto, Apotheker conseguiu indispor-se com o conselho de administração e com os acionais da companhia. Seu último ato foi anunciar, de forma prematura, que a HP planejava vender sua divisão de computadores, responsável por um terço do faturamento, para se transformar em uma empresa de software e serviços. Mais ou menos como fez a IBM há mais de dez anos. A diferença é que a HP não está preparada para se desfazer de um negócio que, sozinho, seria uma das 100 maiores empresas dos Estados Unidos com faturamento superior a US$ 40 bilhões. O primeiro anúncio importante de Meg à frente da HP não poderia ter sido outro: a empresa vai manter sua divisão de PCs. “A HP é uma empresa de hardware”, afirmou a executiva. “Queremos crescer no setor de software, mas sem abandonar os computadores.” Nem o posto de CEO é uma novidade para Meg, nem para a HP a entrega do seu principal cargo executivo a uma mulher é uma experiência desconhecida. 

 

A executiva foi a presidente do site de comércio eletrônico eBay de 1998 a 2007. Sob seu comando, a empresa passou de uma startup com 30 funcionários e US$ 4 milhões em receita para uma das gigantes do varejo eletrônico americano, com 15 mil funcionários e faturamento de US$ 8 bilhões. Apesar do sucesso, sua gestão ficou marcada pela malsucedida aquisição do Skype, por US$ 2,6 bilhões, e por um processo de agressão a uma funcionária. Em 2009, ela ingressou na política e, no ano seguinte, concorreu ao governo da Califórnia pelo Partido Republicano. Sua campanha ficou famosa por ter sido a mais cara da história de um pleito estadual nos Estados Unidos — ela gastou US$ 144 milhões do próprio bolso, fora outros US$ 178 milhões em doações. Mesmo assim perdeu para o democrata Jerry Brown. Já a experiência da HP com uma presidenta não é muito positiva. A pioneira entre as CEOS de saias das grandes corporações de tecnologia, Carly Fiorina, acabou sendo demitida pela HP após resultados decepcionantes e operações criticadas pelos acionistas, como a compra da Compaq, um fabricante concorrente de computadores. 

 

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Virginia e Meg fizeram história ao entrar para um seleto grupo de mulheres líderes de grandes empresas. Ursula Burns, CEO da Xerox, no entanto, foi além. Ela é a primeira mulher negra a comandar uma grande companhia americana ( quarta entre os fabricantes de computadores, com vendas de US$ 21,6 bilhões) e também a primeira a suceder outra mulher, Anne M. Mulcahy. De origem humilde — foi criada apenas pela mãe em um conjunto habitacional construído pela prefeitura de Nova York —, Ursula ingressou na Xerox em 1980, como estagiária, e passou por quase todos os departamentos, até se tornar CEO da companhia em 2009. Anne, sua antecessora, havia recuperado a lucratividade da empresa após uma quase falência no ano anterior. Mesmo assim, a tarefa de Ursula não era fácil. O principal negócio da Xerox, as copiadoras, estava em xeque. Logo que assumiu, ela enfrentou uma queda de 18% nas vendas. A resposta da executiva veio com a aquisição da ACS, especializada em terceirização de serviços, por US$ 6,4 bilhões, em 2010. 

 

Focando-se mais em serviços do que na venda de equipamentos, a Xerox voltou a apresentar bons resultados. No terceiro trimestre deste ano, a empresa obteve lucro de US$ 320 milhões, alta de 25% em relação ao mesmo período do ano passado. Apesar de viverem realidades distintas, IBM, HP e Xerox apostam nas mulheres em um momento em que a presença feminina nas companhias é cada vez mais valorizada. Segundo pesquisa da consultoria McKinsey, realizada com executivos do mundo inteiro, 72% dos entrevistados acreditam que quanto mais diversificado em termos de gênero for o ambiente de uma empresa, melhor será seu resultado financeiro. E quanto maior for a presença de mulheres em cargos executivos, maior será a chance de uma delas chegar à presidência. Até que o fato de uma mulher assumir uma grande companhia não seja mais notícia.

 

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