23/01/2015 - 20:00
Demorou, mas saiu. E veio um pouco melhor do que o esperado. Na quinta-feira 22, o economista italiano Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), anunciou um programa de estímulo à economia da Zona do Euro. Com um atraso de pelo menos cinco anos, em uma medida semelhante às aplicadas pelos bancos centrais dos Estados Unidos, Inglaterra e Japão, o BCE vai injetar cerca de € 60 bilhões, o equivalente a US$ 69 bilhões, todos os meses na economia europeia através da compra de títulos públicos, cifra superior aos € 50 bilhões por mês previstos pelos analistas.
O programa de estímulos terá início em fevereiro e deverá durar até a economia dar sinais de recuperação ou, então, até setembro de 2016. Os mercados reagiram de maneira eufórica: o índice Euro Stoxx 50, que representa ações dos 19 países da Zona do Euro, subiu 1,6%. A moeda única europeia recuou 1% para US$ 1,14, menor nível em 11 anos, o que deverá estimular as combalidas exportações da Europa. A ajuda pode ter demorado demais. Draghi, ex-presidente do Banco Central italiano, chegou à presidência do BCE em novembro de 2011 e foi logo apelidado de “Super-Mario” pela imprensa europeia, por seus esforços para tirar a Europa do atoleiro econômico.
A região foi duramente atingida pela crise financeira internacional de 2008. Muitos bancos perderam dinheiro com títulos imobiliários de alto risco e recebimento incerto. Algumas instituições fecharam as portas ou contabilizaram perdas bilionárias. A crise atropelou a economia real, reduziu o crescimento e elevou o desemprego aos maiores níveis desde os anos 1930. Diferentemente dos Estados Unidos, onde o Federal Reserve, o correspondente americano do BCE, começou a injetar dinheiro na economia ainda em 2008, o banco de Draghi não conseguiu fazer nada mais relevante do que reduzir os juros para abaixo de zero, em junho de 2014.
O maior entrave foi político. A Zona do Euro dividiu-se em relação à ajuda. Países como Alemanha e Holanda cerraram fileiras contra o gasto de dinheiro público, liderados pela primeira-ministra alemã, Angela Merkel. Enquanto isso, vizinhos pobres como Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda e Itália sofriam com a retração da demanda. A intransigência alemã e as dificuldades estruturais, como um mercado de trabalho muito regulado e a necessidade de conciliar legislações de 19 países, retardaram a chegada da ajuda.
Como resultado, a Europa amargou sete trimestres seguidos de retração da produção. Os níveis de atividade ainda não retornaram aos níveis anteriores à crise, e a taxa de desemprego permanece acima de 11% desde 2012. Na Grécia, 50% dos jovens não conseguem trabalho, o pior percentual desde os anos 1930. Essas dificuldades acirraram os ânimos. Na eleição marcada para o domingo 25, a Grécia deverá eleger um político de oposição cuja principal bandeira é retirar o país da Zona do Euro. Não por acaso, ao anunciar o pacote, Draghi disse que está observando a situação grega “com um cuidado especial”.
Em Atenas, Alexis Tsipras, líder do partido de oposição Syriza, o favorito nas pesquisas, declarou que a medida do BCE é uma “decisão importante, que o próximo governo grego vai usar para beneficiar a economia.” No entanto, devido às condições do plano, a Grécia só poderá participar do pacote de ajuda a partir de julho, quando o plano de recuperação econômica definido pelo Fundo Monetário Internacional e pela Comissão Europeia estiver concluído. Entraves como esses têm levantado alertas sobre a capacidade de a Europa sair da crise e preservar o euro.
Segundo o americano Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia, uma das forças do Velho Continente é a solidez de sua democracia, mas esta está ameaçada, pois os eleitores perderam o controle sobre as economias de seus países. “Sucessivos governos foram substituídos por eleitores insatisfeitos, mas os sucessores eleitos continuaram seguindo as ordens de autoridades em Bruxelas e Berlim”, disse ele ao Financial Times, no início do mês. “Isso tem provocado o crescimento de partidos nacionalistas e movimentos separatistas. Até quando a Europa pode suportar essa tensão antes de naufragar politicamente?” Questão que o “Super-Mario” agora começa a tentar responder.