07/11/2012 - 21:00
Quando o executivo americano Bob Iger assumiu o comando, em outubro de 2005, a Disney parecia um reino de conto de fadas decadente. Desde então, Iger recolocou-a no rumo, dedicando-se, sobretudo, a fortalecer sua vasta e lucrativa galeria de carismáticos personagens. Na terça-feira 30, Iger anunciou a sua mais recente – e talvez surpreendente – cartada. Em um negócio de US$ 4,05 bilhões, tornou a companhia de Mickey Mouse dona do maquiavélico Darth Vader, do guerreiro Luke Skywalker e do robozinho R2-D2, alguns dos célebres protagonistas da saga Star Wars. Criada em 1977 pelo americano George Lucas, a série de filmes é uma das mais adoradas e rentáveis da história da indústria do entretenimento mundial.
Bob Iger, CEO da Disney: ideia de comprar a Lucasfilm nasceu em um encontro com George Lucas,
em que ele aprendeu a usar um sabre de luz
“Nos últimos 35 anos, um dos meus maiores prazeres foi ver esses personagens passar de uma geração para a outra”, declarou Lucas, que se tornou, com o negócio, o segundo maior acionista individual da Disney, atrás apenas do espólio de Steve Jobs, morto no ano passado. “Agora é hora de passar Star Wars para uma nova geração de cineastas”, afirmou. O acordo selado na semana passada começou a tomar forma em maio de 2011, quando Lucas mostrou para Iger como se usa um sabre de luz, a icônica arma dos guerreiros Jedi da saga Star Wars. A dupla estava no parque temático Hollywood Studios da Disney, em Orlando, para a inauguração de uma nova atração relacionada à série.
Iger ouviu os ensinamentos de Lucas com atenção e o encontro acabou por aproximá-los. As negociações, no entanto, esquentaram apenas neste ano, quando Lucas, 68 anos, confidenciou a Iger que planeja se aposentar. Mas não sem antes garantir a sobrevivência de sua criação no futuro. Além da franquia, a Disney comprou também a divisão de efeitos especiais e sonoros, bem como a desenvolvedora de games pertencente a Lucas. Hábil negociador, Iger já havia adquirido de Steve Jobs o estúdio de animação Pixar, em 2006, por US$ 7,4 bilhões. O negócio trouxe o Senhor Incrível, o peixinho Nemo, o monstro de um olho só Mike e o astronauta intergaláctico Buzz Lightyear para o seu portfólio.
Como se não bastasse, esse negócio reenergizou toda a divisão de animação da companhia, que desde então acumula sucessos, como Bolt e Enrolados. O mais recente filme da Pixar, Valente, que conta a história de uma jovem e ruiva princesa escocesa, atingiu a respeitável marca de US$ 532 milhões nos cinemas. Outra grande aquisição orquestrada por Iger aconteceu em 2009, quando investiu US$ 4 bilhões para ficar com a gigante dos quadrinhos de super-heróis Marvel, criadora do nerd Homem-Aranha, dos mutantes X-Men, do magnata Homem de Ferro e do nervosinho Hulk, entre tantos outros. Bastante contestado pelos investidores na ocasião do anúncio do acordo, Iger calou os críticos com o lançamento do longa Os vingadores, que reuniu boa parte dos heróis da Marvel e se tornou a terceira maior bilheteria da história do cinema mundial, arrecadando, até agora, US$ 1,5 bilhão.
Uma continuação da trama já está programada para 2015. “Provamos com as aquisições da Pixar e da Marvel que sabemos como expandir o valor de uma marca”, disse Iger, ao anunciar a compra da Lucasfilm. E há, realmente, poucas propriedades na área de entretenimento tão boas para serem expandidas quanto Star Wars. A partir da demanda do público, Lucas transformou a história do filme em uma mitologia complexa com diferentes partes dela sendo contadas em diversas mídias há mais de três décadas. Um universo bastante fértil para a Disney. Estima-se em mais de US$ 30 bilhões a receita gerada pela franquia, dos quais “apenas” cerca de US$ 4,5 bilhões vieram das bilheterias dos cinemas.
Guerra animada: George Lucas, criador da saga interplanetária, junto com os tradicionais
personagens Disney devidamente caracterizados
O restante veio de games, livros, desenhos animados, além de uma infinidade de produtos associados, de sabres de luz a canecas e bonecos. Modelo esse, aliás, criado pelo lendário Walt Disney, que, no início do século passado, era visto como temerário por boa parte dos outros donos de estúdios em Hollywood. Enquanto os rivais apostavam na venda de ingressos para ganhar dinheiro, a maior parte da receita de Disney vinha das licenças de uso de Mickey Mouse e de outros personagens em toda sorte de brinquedos, além de discos e livros. Muita coisa mudou desde então na Disney, é verdade. A empresa é hoje um vasto conglomerado do qual fazem parte a rede de tevê ABC e o canal de esportes ESPN. Ainda assim, é sobre a divisão de filmes e desenhos que todo o império Disney está alicerçado.
Duas das áreas mais rentáveis e lucrativas da companhia, a de parques de diversões e resorts, bem como a de produtos de consumo, estão apoiadas nos novos e, sobretudo, nos velhos – e adorados – personagens Disney. “A compra da Lucasfilm foi um movimento bastante inteligente de Iger, uma vez que eliminou o risco de um possível competidor controlar a franquia Star Wars, não apenas no cinema, mas também em parques de diversão e brinquedos”, disse à DINHEIRO Edward Jay Epstein, autor do livro O grande filme, sobre a evolução da indústria cinematográfica americana. Sem querer perder tempo, a Disney já programa um novo capítulo da saga Star Wars para 2015. E outras sequências, a partir daí, em intervalos de dois a três anos. Isso, é claro, se os fãs aceitarem a ironia do destino: o mestre Darth Vader, quem diria, virou o aprendiz de Mickey Mouse.