Na saída do Estádio do Maracanã, após a partida da última rodada da primeira fase entre França e Equador, uma disputa entre nações continuou no metrô. Felizes com a classificação, os franceses entoavam canções de apoio à sua seleção. Equatorianos mostravam orgulho por seu time. Os brasileiros respondiam, para mostrar que os donos da casa estavam presentes. Mas o mais surpreendente era perceber que os americanos, que nada tinham a ver com a partida, também se destacavam em número e animação.

Um grupo de torcedores do país que chama futebol de “soccer” gritava “I believe we will win” (acredito que vamos ganhar) e “go, go, USA”. Quando um francês provocou, perguntando se o puxador dos gritos ianques sabia o nome dos jogadores de sua seleção, recebeu uma resposta ríspida: “Conheço todos os jogadores do time, não sou um americano típico”, disse, sem considerar que algo está mudando em seu país: o americano típico está ficando mais parecido com ele. Começou a gostar de futebol. São muitos os sinais dessa transformação.

Os americanos foram os estrangeiros que mais compraram ingressos para a Copa do Mundo. Eles adquiriram 200 mil tíquetes antes do torneio, contra 61 mil dos argentinos, os segundos colocados. Os brasileiros, com a Copa no quintal de casa, compraram 1,4 milhão de ingressos. No caso dos sobrinhos do Tio Sam, mesmo quem ficou em casa fez bonito. Para assistir, no dia 1º de julho, à partida de oitavas de final contra a Bélgica, 28 mil pessoas se reuniram em um estádio em Chicago.

A febre de bola se espalhou entre celebridades e cidadãos desconhecidos, que queriam ser liberados do expediente na hora do jogo. Um dos personagens ilustres mais animados era o presidente Barack Obama, que divulgou diversas fotos suas torcendo. Chegou, inclusive, a alterar os horários de reuniões, para que acontecessem de manhã, e justificou: “Todos sabemos que a América estará ocupada esta tarde.” Já estrelas do entretenimento e dos esportes como Tom Hanks, Arnold Schwarzenegger, Justin Timberlake, Rihanna e Lebron James postaram mensagens e fotos, em redes sociais, de apoio ao Team USA, como se referem ao time do goleiro Tim Howard.

Nem mesmo as bolsas de valores escaparam: combinadas, a New York Stock Exchange e a Nasdaq sofreram uma diminuição de 25% de seus volumes de negócios durante a partida contra a Alemanha, na primeira fase. Tudo isso prova como a nação mais poderosa do planeta está ligada como nunca em futebol. Na partida contra Portugal, o índice de espectadores atingiu pico de 25 milhões de pessoas. O número superou com folga as finais da NBA, a liga profissional de basquete, e da MLB, de beisebol. Ambas registraram média de 15 milhões de espectadores por partida.

É um cenário muito diferente do da Copa passada, quando um terço dos espectadores da final, entre Espanha e Holanda, viu a partida pela Univision, a emissora que transmite em língua espanhola. Desta vez, as emissoras de tevê, como a ABC e o canal especializado ESPN, investiram US$ 100 milhões na transmissão do torneio, e preveem o desembolso de US$ 425 milhões com as duas próximas edições. Na África do Sul, em 2010, foram gastos apenas US$ 22 milhões. Tamanho sucesso estaria catapultando os Estados Unidos como o principal candidato para sediar a Copa do Mundo de 2022, planejada para acontecer no Catar, mas que sofre ameaças devido à revelação de que votos foram comprados para a sua nomeação.

O histórico também justifica a opção. Mesmo com pouca repercussão na imprensa local, a Copa do Mundo de 1994, realizada no país, tem até hoje a maior média de público da história, de impressionantes 69 mil espectadores, maior mesmo que a do Brasil, que encerrou as oitavas de final com 52 mil pessoas por jogo. Até a liga de futebol americana, a MLS, criada em 1996, já registra média de público de 19 mil espectadores por partida, maior que a do Brasileirão, que gravita abaixo dos 13 mil espectadores.

E há muito espaço de crescimento. A meta é colocar a MLS entre as principais ligas do mundo, até 2022, à frente do Brasil e da Itália. A estratégia é conseguir mais dinheiro da televisão para poder aumentar os salários pagos aos atletas e atrair mais craques. “A contratação de David Beckham e agora a do Kaká mostra que a liga percebeu que precisa de estrelas para crescer”, diz Pedro Fida, sócio do escritório Bichara & Motta Advogados e ex-conselheiro do Tribunal Arbitral do Esporte, na Suíça. Seguramente, o olho gordo da Fifa, não vai perder isso de vista.

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