27/06/2012 - 21:00
Um tipo ousado de planejamento tributário entrou no radar da Receita Federal. Empresas e cidadãos brasileiros perceberam que poderiam economizar 34% de IPI e ICMS se registrassem nos Estados Unidos seus jatos executivos comprados lá fora. Uma operação deflagrada na semana passada pela Receita e pela Polícia Federal promete acabar com a estratégia considerada sonegadora pelas autoridades, ao rastrear a origem e o uso frequente desses aviões em solo brasileiro. Na quarta 20, foram apreendidos 12 desses aviões, no valor total de R$ 560 milhões – somente um deles, de modelo não revelado, custa R$ 100 milhões. A sonegação é estimada pela Receita em R$ 192 milhões. Os jatos foram apreendidos nos aeroportos de Viracopos, em Campinas, e em Guarulhos, na Grande São Paulo.
Cadê o dono?: aeronave apreendida pela Polícia Federal, que não revelou
dados sobre o proprietário.
Dos 12 aparelhos com mandado expedido, cinco já foram encontrados – os outros estão sendo procurados em aeroportos e hangares no Brasil e no Exterior. Mas o pente-fino das autoridades continua e outros aviões podem ser apreendidos nos próximos meses. “A investigação está apenas começando”, disse à DINHEIRO o superintendente-adjunto da Receita Federal em São Paulo, Marcos Siqueira. “Temos outros casos em andamento.” As autoridades não revelam a identidade dos donos das aeronaves apreendidas, por causa do sigilo fiscal. Na Justiça, os processos também correm em segredo. Os envolvidos estão sendo acusados de dois crimes fiscais: descaminho (contrabando) e falsidade ideológica, por forjar uma identidade falsa para a propriedade da aeronave.
A operação era feita da seguinte forma: a empresa ou pessoa física brasileira que pretendia comprar um avião montava uma empresa num paraíso fiscal – no caso dos aviões apreendidos na semana passada, a maioria estava registrada no estado de Delaware, nos Estados Unidos. A empresa americana fazia um contrato de “trust” com um banco local. Esse contrato, que não existe na legislação brasileira, mas é comum nos países que seguem o direito de tradição britânica, mantém a propriedade em nome do banco, mas dá o direito de uso ao cliente brasileiro. “Não é ilegal ter uma empresa num paraíso fiscal, nem fazer um contrato deste tipo com o banco. Mas houve uma tentativa de esconder o real proprietário do avião”, diz o superintendente-adjunto da Receita.
“É uma blindagem patrimonial e um planejamento tributário abusivo.” Aviões estrangeiros podem voar no Brasil, desde que peçam autorização para as autoridades de aviação civil e seus tripulantes e passageiros passem normalmente pelas autoridades alfandegárias, no desembarque. O que despertou a suspeita das autoridades é que os aviões entravam no Brasil como se fossem de uma empresa estrangeira trazendo seus diretores em viagens de negócios ou turismo, mas aqui permaneciam em viagens domésticas por todo o tempo permitido pela licença temporária, de dois meses. Alguns, inclusive, operavam como táxi aéreo. As suspeitas surgiram em Viracopos, onde, nos últimos 12 meses, houve seis casos desse tipo.
Os fiscais viram, então, que não eram episódios isolados, mas um novo meio de registrar aviões particulares sem pagar os impostos de importação. O Brasil conta com a segunda maior frota de jatos executivos do mundo, com mais de 1,2 mil unidades em circulação. Na avaliação do advogado tributarista Bruno Zanim, do escritório Mesquita Pereira, Marcelino, Almeida, Esteves Advogados, de São Paulo, a prática de manter o registro de aviões lá fora tem sido comum entre as empresas brasileiras. “Não é ilegal que, num país que tem um emaranhado de leis em vigor, as pessoas escolham o caminho que lhes permite pagar menos imposto”, afirma Zanim. “E não é ilegal ter uma empresa no Exterior.”