16/09/2016 - 20:00
Na década de 1990, o então presidente da Samsung, Lee Kun-Hee, visitou Los Angeles, nos EUA, e surpreendeu-se com a imagem negativa que seus produtos transmitiam aos consumidores americanos. Quando voltou a Seul, onde fica a sede da empresa, escreveu um memorando para os principais executivos. O texto dizia que a Samsung havia se tornado uma companhia de “terceira categoria”. E determinou: “Nossos produtos não podem apenas atender às necessidades dos consumidores, precisamos que eles capturem a imaginação deles.”Algumas décadas depois e muitos bilhões de dólares investidos em pesquisa e desenvolvimento, pode-se dizer que a Samsung chegou lá, transformando-se em referência em design e uma potência do setor eletroeletrônico. Sem exageros, a companhia coreana é uma das poucas capazes de rivalizar com a Apple. No caso de smartphones, ela chega até a superá-la com sua linha baseada nos sistemas operacionais Android, do Google.
Mas, desde 2 de setembro, a Samsung enfrenta uma crise que está provocando danos à sua imagem. O seu recém-lançado Galaxy Note 7, um dos mais modernos e tecnológicos aparelhos da empresa, começou a superaquecer por conta de problemas na bateria. Só nos EUA, 92 incidentes foram relatados, sendo 26 deles com queimaduras. Em um deles, um carro pegou fogo depois que seu dono, o americano Nathan Dornacher, deixou o aparelho carregando dentro do veículo. A Samsung convocou um recall que atinge mais de 2,5 milhões de aparelhos nos 10 países em que o produto foi lançado – o Galaxy Note 7 chegaria ao Brasil no fim de setembro, mas foi adiado. Cálculos do Credit Suisse, da Daishin Securities e da Pelham Smithers Associates estimam que a troca deve custar em torno de US$ 1 bilhão aos cofres da fabricante coreana. As ações caíram mais de 7%, queda que só não foi maior devido à venda de sua divisão de impressoras para a HP, por US$ 1 bilhão (saiba mais aqui).
Por conta dos riscos, a Federal Aviation Administration (FAA), órgão que regula o setor de aviação nos EUA, classificou o aparelho como de ‘alto risco’ e decidiu recomendar que passageiros evitem usar, ligar e carregar os dispositivos a bordo de aeronaves. Empresas como Qantas, Jetstar e Virgin, da Austrália, e a Singapore Airlines, de Cingapura, proibiram por tempo indeterminado o uso do Galaxy Note 7 em seus jatos. A Samsung, por meio de nota, disse que está investigando as causas dos incidentes. “Nossa prioridade número um é a segurança de nossos consumidores”, disse DJ Koh, presidente global da divisão mobile da Samsung Eletronics. “Estamos pedindo aos usuários que desliguem seus Galaxy Note7 e o substituam o mais rápido possível.”
A Samsung não é a primeira, nem será a última, fabricante de celular a sofrer com superaquecimento nas baterias. A Apple, a LG, a Motorola e a própria Samsung já enfrentaram esse problema. A causa, em geral, são as baterias de íon-lítio, um material altamente inflamável que, por conta de algum defeito de fabricação, ocasionam uma reação que pode provocar explosões. Mas, neste caso, dois fatos chamam atenção. Esse é um dos maiores recalls de smartphones convocados até agora. E, para desespero dos coreanos, a falha afeta a sua principal marca, poucas semanas depois de seu lançamento, no começo de agosto. “Será difícil não afetar as vendas por algum tempo, pois é um dos principais produtos da empresa”, diz Willy Shih, professor de práticas de gestão da Harvard Business School.
O incidente acontece em um momento delicado à Samsung. A companhia estava em ascendência no mercado global de smartphone, no qual lidera com mais de 20% de participação. A Apple, sua principal rival, amarga três trimestres consecutivos de queda nas vendas. Mas o anúncio do iPhone 7 em conjunto com os problemas da fabricante coreana fizeram as ações da empresa da maçã subir mais de 10% em três dias. Seu valor de mercado atingiu o pico deste ano, superando os US$ 600 bilhões. Não há, no entanto, consenso se o incidente da Samsung deve beneficiar a Apple. “O impacto deve ser regional”, diz Tuong Huy Nguyen, analista da consultoria Gartner. “Acredito que os usuários insatisfeitos com a Samsung devem migrar para outros fabricantes que usem o sistema operacional Android, como LG, ZTE, Huawei e TCL, e não para o iPhone.”