Nos últimos dois anos, o que não tem faltado no Brasil é crise. Tem para todos os gostos. Hídrica, energética, política, econômica e epidêmica. Mas nem todos estão lamentando. Algumas empresas vêm aproveitando o momento de inferno astral do País para lucrar mais ou, no mínimo, recuperar perdas dos últimos anos. É o caso do laboratório francês Osler, fabricante do repelente de insetos Exposis. A epidemia do vírus Zika, transmitida pelo mosquito aedes aegypti, caiu como uma luva nos negócios.

Isso porque o Exposis é o único dos repelentes com o princípio ativo icaridina, mais eficaz no combate ao inseto também transmissor da dengue e da febre chikungunya. De acordo com Paulo Guerra, diretor geral do Osler no Brasil, a empresa, em vez de investir em propagandas, preferiu direcionar o dinheiro para a criação de produtos mais eficazes, que se mostrariam mais resilientes aos problemas enfrentados pelos consumidores do que os da concorrência.

Deu certo. Mesmo não divulgando números de faturamento, a expectativa do laboratório francês é de que as vendas da subsidiária brasileira, que iniciou as operações por aqui há 14 anos, aumentem 20 vezes em 2016. “Trabalhamos com uma fábrica terceirizada, que teve de ampliar o número de funcionários e os turnos”, diz o executivo. “Mas tentamos não nos promover em cima da doença, pois é um momento em que diversas pessoas estão sofrendo.” A linha entre ser oportunista ou simplesmente se beneficiar de uma crise é tênue.

Essa é a opinião de Marcelo Pontes, líder da área de marketing, pesquisa e economia da ESPM-SP. Segundo ele, crises envolvendo a saúde pública podem ser prejudiciais para as marcas, caso elas se aproveitem do momento para promoverem práticas abusivas. “Agora não é o momento de venda casada ou aumento do preço, por exemplo”, diz Pontes. Quem não sofre desse mal são as fabricantes de lâmpadas de LED. De olho no consumidor que tenta economizar na conta de luz, que subiu cerca de 45% nos últimos dois anos, as empresas tentam mostrar aos clientes que a nova compra significa gastar de um lado e ganhar do outro.

“As lâmpadas LED são 85% mais econômicas que as incandescentes”, diz Yoon Young Kim, vice-presidente da área de iluminação da Philips. A companhia holandesa, aliás, está comemorando os resultados. As vendas das lâmpadas econômicas, que representam cerca 30% do faturamento da área comandada por Kim, foram multiplicadas por três no ano passado. “A participação do LED no Brasil é de 20%, bem distante de países como o Japão, que ultrapassam os 80%”, diz o vice-presidente. “Existe uma grande oportunidade.”

A opinião é compartilhada por Leonardo Horta, presidente da FLC, líder em LED e dona de um faturamento de R$ 300 milhões, em 2014. A empresa, que construiu a primeira fábrica do produto no Brasil há um ano e meio, viu suas vendas triplicarem no segundo semestre de 2015. “Projetamos que o ano que vem será ainda melhor”, diz Horta. O dólar, que valorizou 48,5% frente ao real em 2015, ajudou algumas companhias do setor calçadista a recuperarem parte das perdas dos anos anteriores. A Piccadilly é uma delas. Agora presidida por Ana Clara Grings, a empresa gaúcha conseguiu manter o faturamento em R$ 380 milhões no ano passado, ante uma queda de 7,7% em 2014.

A alta da moeda americana foi fundamental para isso. “Agora, temos um produto de qualidade europeia, feito no Brasil e competitivo com a China”, diz Ana Clara. “Estamos otimistas para 2016.” Assim como a Piccadilly, a empresa de bebidas Bioleve se utilizou de uma crise para segurar sua receita, de R$ 70 milhões, no mesmo patamar do ano passado. No caso, a hídrica: as vendas para o Nordeste, que sofre com a estiagem, aumentaram em relação a 2014. “Esse fator nos permitiu manter a meta de chegar a R$ 100 milhões em vendas até 2017”, diz Sylvio Parente, diretor executivo.