O governo do Estado de São Paulo previa no orçamento do ano passado R$ 15,1 bilhões para a aquisição de bens e serviços, através da Bolsa Eletrônica de Compras (BEC). Ao fechar as contas, em dezembro, o gasto totalizou R$ 11 bilhões, sem que nenhum item da lista tivesse sido cortado. A economia de R$ 4,1 bilhões foi a maior já registrada desde o início do pregão eletrônico, em 2000, e 47% superior à alcançada no ano anterior. Longe de ser fruto do acaso, o resultado é consequência de investimentos em cursos de gestão para os servidores, que aprendem a identificar problemas e apresentar soluções. 

 

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Classe imaginária: 1a fila: governador de SP, Geraldo Alckmin, presidenta Dilma

Rousseff e govenardor de MG, Antônio Anastasia. 2a fila: prefeito de Porto

Alegre, José Fortunati, ministro da Defesa, Celso Amorim, e presidente

da Caixa, Jorge Hereda. 3a fila: ministros da Agricultura, Antonio Andrade,

e da Ciência, Marco Raupp, e presidente do TJMG, Joaquim Rodrigues 

 

No caso específico, ao analisar onde era possível economizar, os funcionários da Secretaria estadual da Fazenda constataram que os cadastros de fornecedores da BEC não eram padronizados, o que limitava o número de participantes. Com a falha corrigida, os pregões ganharam mais concorrentes e geraram valores menores. Ponto para os cofres públicos – e para os contribuintes, naturalmente. Colocar funcionários na sala de aula, para aprender técnicas da iniciativa privada, já é uma realidade em um grande número de instituições, e vem ganhando força com a crescente cobrança por melhores serviços e mais transparência de parte dos governantes. 

 

Segundo a coordenadora da área de Entidades Descentralizadas e de Contratações Eletrônicas da Secretaria da Fazenda de São Paulo, Maria de Fátima Alves Ferreira, a adoção de processos adequados e o mapeamento das competências de cada servidor ajudam na entrega de um resultado melhor. “Com isso, a administração pública vai vendo como fazer mais com menos recursos”, diz Maria de Fátima. Na sua área, cada funcionário participou de, no mínimo, 20 horas de treinamento, em 2013, inclusive com opções no Exterior. A própria Fátima frequentou um curso de gestão da Japan International Cooperation Agency, em Tóquio, no qual pôde observar a padronização existente nas escolas públicas, uma forma de gastar menos e manter a qualidade do serviço. 

 

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Fazer mais com menos: processos adequados contribuem para melhor

resultado, diz Maria de Fátima, da Fazenda paulista

 

“A gestão qualificada melhora os parâmetros de governança e torna o uso dos recursos mais eficiente”, diz Andrea Calabi, secretário da Fazenda de São Paulo. Nessa busca pela excelência, o setor público se apropriou de ferramentas de gestão há muito utilizadas nas empresas privadas. Uma das mais conhecidas é a “Balanced Scorecard” (BSC), desenvolvida por professores da Universidade Harvard, dos Estados Unidos, e que ajuda na implementação e execução de projetos. Há três anos, o Conselho Nacional de Justiça escolheu essa metodologia para melhorar a qualidade nos tribunais de todo o País. 

 

Segundo o oficial da Secretaria de Planejamento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Fernando Teixeira, os servidores capacitados passam a ter uma maior percepção da importância do cumprimento dos prazos. Há um plano bianual para a implantação dos projetos traçados e o acompanhamento da execução de cada um deles. Entre os exemplos, ele cita a criação de novas varas do TJMG e a digitalização de processos. “A capacitação do serviço só vem a somar no trabalho, porque o servidor aprende a melhor maneira de planejar e executar”, diz Teixeira. No entanto, o oficial judiciário reconhece que a execução muitas vezes esbarra na burocracia do setor público, pois se trata de uma cultura nova. 

 

Para conseguir quebrar paradigmas, o setor público tem recorrido a consultorias e empresas de educação executiva. De acordo com Dôra Amiden, diretora de educação da consultoria Symnetics, tem crescido a participação de servidores nos cursos de capacitação. Em 2012, os cursos atraíram 335 alunos, um terço deles de órgãos dos diferentes níveis de governo e do Judiciário. Já no ano passado, a participação dos servidores chegou a 50%. O investimento de R$ 3 mil para cursos com duração de dois ou três dias é quase sempre pago pelo órgão público contratante. DINHEIRO acompanhou uma dessas aulas em uma turma de 20 alunos, com profissionais do setor público e privado, em São Paulo. 

 

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De olho no futuro: o coronel Carlos José Sinésio, do Estado Maior

do Exército, quer atrair jovens profissionais para as Forças Armadas

 

Nela, entre definição de conceitos como o do BSC e técnicas para desenvolver uma maior capacidade de liderança, os participantes trocam experiências e impressões relacionadas aos temas discutidos. O que fica claro é que, muitas vezes, os servidores sabem qual caminho devem seguir, mas estão limitados pela falta de autonomia. “Implementar ainda é um grande desafio”, diz Dôra. Pelo curso e por grupos de estudos ministrados pela Symnetics já passaram profissionais dos ministérios da Agricultura e da Saúde, do Instituto Nacional de Tecnologia, ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, da Prefeitura de Porto Alegre, da Caixa Econômica Federal e do Exército, entre outros. 

 

O principal ponto é discutir, trocar experiências e aprender a motivar, uma vez que, ao contrário do que ocorre no setor privado, em muitos casos não há um bônus no salário a título de incentivo ou mesmo a ameaça de demissão. Outra preocupação é como atrair jovens talentos e retê-los. Isso porque grande parte dos recém-formados não se sente motivada. As novas gerações que chegam ao mercado têm uma necessidade maior de mudanças, o que não combina com os processos mais lentos do setor público. Ciente do desafio, o Estado-Maior do Exército tem feito esforços de gestão e capacitação para manter e atrair esses quadros. 

 

“Não podemos ficar tão fechados”, diz o coronel Carlos José Sinésio, da subchefia de Política e Estratégia da Força. “Já aperfeiçoamos diversos processos para apresentar um serviço melhor.” Essa necessidade fica ainda mais evidente quando se trata de uma empresa pública, mas com concorrentes privados. É o caso da Caixa Econômica Federal, que precisa buscar clientes e resultados no mesmo espaço em que atuam bancos como Bradesco e Itaú. Por essa razão, é comum a presença de funcionários do banco estatal em comunidades de práticas de gestão estratégicas, em que há uma troca de ideias com profissionais das mais diferentes áreas. Afinal, o que o setor público mais quer é aprender a ser eficiente como o privado. 

 

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