Um trecho de dez quilômetros separa a residência do presidente da Porsche no Brasil, Marcel Visconde, do escritório dele, na zona sul de São Paulo. Num dia de trânsito relativamente tranquilo, o empresário gasta menos de 20 minutos para ir ou voltar do trabalho. Nos últimos dias, no entanto, as enchentes inviabilizaram até mesmo curtos deslocamentos na capital paulista. “Faz três dias que eu não vou ao escritório por causa das chuvas”, disse Visconde, na quarta-feira 20. “É home office total, uma loucura.” Assim como a Porsche, muitas empresas tiveram de repensar a rotina dos seus executivos, concentrando as reuniões mais importantes na parte da manhã. 

 

6.jpg

Perigo: o guarda-chuva virou item obrigatório para os paulistanos. As fortes chuvas causaram alagamentos e congestionamentos nas ruas e avenidas

 

Na prática, os dias ficaram menos produtivos, e a economia saiu perdendo mais uma vez. Em 2012, o trânsito paulistano e seus enormes engarrafamentos causaram prejuízos de R$ 52,8 bilhões, segundo cálculos do professor da FGV Marcos Cintra. Essa dinheirama, que inclui o consumo desnecessário de combustível, gastos com saúde em decorrência da poluição, e desperdício de tempo dos trabalhadores, equivale a quase 15% do PIB da cidade de São Paulo. Em dias de enchentes, essa conta aumenta ainda mais. Na tarde da segunda-feira 18, as nuvens negras eram um prenúncio de problemas. O diretor comercial da CN Auto, que representa as marcas chinesas de veículos Hafei e Jinbei no Brasil, Humberto Gandolpho, tentou evitá-los, mas não conseguiu.

 

Antecipou para as quatro da tarde a sua saída do Centro Operacional da empresa, em Tamboré, na Grande São Paulo. Foi em vão. “Alagou debaixo do viaduto da rodovia Castelo Branco e eu fiquei uma hora e meia parado”, diz Gandolpho. “E ainda gastei mais duas horas para chegar à avenida Paulista, driblando árvores caídas e semáforos apagados. Um caos!” Ciente da gravidade do problema, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), cobrou a limpeza de bocas de lobo e a manutenção de semáforos pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). “Estou inconformado com a situação”, diz Haddad. “A rede de semáforos da cidade está precária.” Na semana passada, a prefeitura anunciou uma licitação de R$ 100 milhões para a troca dos equipamentos. 

 

7.jpg

Como pode?: o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, diz que está

inconformado com a situação dos semáforos

 

A rede elétrica também foi castigada pela queda de centenas de árvores, deixando escritórios e residências sem luz. Quem tentou utilizar a internet ou tevê a cabo, sofreu. A AES Eletropaulo levou, em média, cinco horas para restabelecer a energia na casa dos paulistanos, mas houve bairros que ficaram às escuras durante 24 horas. Até mesmo o call center da empresa, que é terceirizado, permaneceu seis horas fora do ar. Do governo estadual, no entanto, foram ouvidas apenas lamentações. “A população ficou em situação de total desatenção”, afirma José Aníbal (PSDB), secretário de Energia. Até agora, a Agência Reguladora Estadual (Arsesp) limita-se a avaliar a aplicação de eventuais multas à Eletropaulo.

 

A falta de infraestrutura da maior cidade da América Latina para enfrentar as chuvas de verão não é novidade. Há bairros que convivem com enchentes há pelo menos duas décadas. Na avaliação do presidente do Instituto de Engenharia, Aluizio de Barros Fagundes, o problema é grave e envolve a falta de drenagem. “A cidade tem muitos vales que concentram a água da chuva”, diz Fagundes. Sem um plano de longo prazo, o custo de se fazer negócio em São Paulo só tende a crescer, assim como o desperdício de recursos. Com exceção de quem aluga gerador de energia ou fabrica velas, ninguém ganha com o descaso das gestões paulistanas nas últimas décadas.

 

8.jpg