O início da recuperação da economia, no segundo semestre, começa a dar um alento à indústria, que espera um desempenho melhor nos próximos meses. Em contrapartida, a melhora no cenário também estimula o movimento sindical, que considera o momento ideal para pleitear ganhos reais de salários. Categorias organizadas, como bancários, metalúrgicos, petroleiros, químicos e comerciários, com data-base a partir de setembro, já estão em plena campanha salarial. Os petroleiros pedem aumento real de 10%. Os metalúrgicos das montadoras paulistas já garantiram 2,5% acima da inflação, graças a um acordo de dois anos fechado em 2011 – um levantamento do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que, no ano passado, 87% dos acordos coletivos resultaram em reajustes de salários acima da inflação. 

 

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O mesmo se deu com os pisos salariais, que incorporaram ganhos reais em 92% dos casos. Neste ano, com índice de desemprego de 5,8%, o cenário continua favorável ao trabalhador. “As negociações do primeiro semestre mostram que o desempenho de 2012 será melhor do que no ano passado”, diz o coordenador de relações sindicais do Dieese, José Silvestre. No primeiro semestre, os custos da mão de obra aumentaram 6,8% em relação a 2011 (veja quadro ao final da reportagem). Aumento real é excelente para o trabalhador. Para as empresas, no entanto, representa mais custos, num momento em que a indústria brasileira reclama da concorrência dos produtos estrangeiros. 

 

A competição com os importados se traduziu numa queda de 4% da produção industrial, no primeiro semestre. Algumas companhias já indicam a pressão dos salários como um fator de peso para reduzir o quadro de pessoal. É o caso da DHB Indústria e Comércio, de Porto Alegre (RS), que fornece autopeças para montadoras como Ford, Volkswagen, Fiat, Peugeot e Renault. Em maio, a empresa reajustou em 7,5% a folha de pagamento, com um aumento real de 2,49%, que acabou repercutindo em seu desempenho. “Tivemos uma redução de 10% a 12% nas vendas, e precisamos demitir 10% dos funcionários”, afirma José Roberto Silveira, diretor-superintendente da DHB. “O preço das peças cai e meus custos só aumentam. A equação não fecha.” 

 

Uma saída encontrada por Silveira foi aumentar o uso de automação em sua fábrica para depender menos de força de trabalho, reduzindo assim os custos trabalhistas que aumentaram muito nos últimos cinco anos. O consultor Dráusio Rangel, negociador do setor de autopeças, dá razão a Silveira. Segundo Rangel, o pleito de aumento real de 2,5% dos trabalhadores é excessivo, dado o cenário atual. “As empresas estão com lucratividade muito baixa”, afirma. Não é a avaliação dos representantes dos trabalhadores. Do outro lado do balcão, o presidente da Federação dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo (FEM), Valmir Marques, o Biro-Biro, acha que as empresas têm espaço para os aumentos, com a melhora do cenário econômico. 

 

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José Roberto Silveira: diretor-superintendente da DHB: “O preço das peças

cai e os meus custos só aumentam”

 

“O que nos dá um conforto maior é ouvir das empresas que a economia brasileira já está retomando seu crescimento e que não haverá demissões”, diz. Para o economista José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ e especialista em mercado de trabalho, a alta dos salários só piora o fraco desempenho da indústria. “Com aumento real, a indústria perde competitividade e cresce menos”, diz Camargo. Dessa forma, os fabricantes nacionais terminam por não se beneficiar com o crescimento do consumo interno, que vem se mantendo elevado neste ano, inclusive por conta dos ganhos salariais dos trabalhadores (leia mais aqui). Em outras palavras: cada vez mais, a demanda do varejo está sendo atendida pelos importados, cuja penetração na economia quase duplicou na última década, passando de 12,1% em 2003 para 22% neste ano. 

 

“O ganho de renda aumenta o consumo, mas a indústria não está conseguindo absorver toda essa melhora”, diz o economista Marcelo de Ávila, da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A chave para os aumentos reais é o reajuste do salário mínimo, que subiu 14,13% no início deste ano. “Quanto mais o mínimo sobe, mais pressiona os demais salários”, diz José Carlos Bastos, sócio da Total Consultoria, de Belo Horizonte. Desde 2007, o salário é corrigido pela inflação do ano anterior, mais o percentual de crescimento do PIB de dois anos anteriores. Dessa forma, os salários de 2012 levaram em conta o PIB de 7,5% de 2010. 

 

Uma pesquisa feita pela consultoria na capital mineira entre empresas do setor industrial mostra que os trabalhadores com menor salário foram justamente os que tiveram maiores ganhos. Nos últimos dois anos, as empresas mineiras concederam aumentos reais de 9,77% para os empregados de nível administrativo e operacional, de 6,59% para os gerentes e de 3% para os profissionais de nível superior. “Está havendo um achatamento no topo dos salários”, diz Bastos. Para o próximo ano, a pressão salarial deve ser menor, uma vez que o reajuste vai considerar o PIB de 2,7% de 2011. Mesmo assim, as empresas terão de se preparar para um aumento em torno de 8% no salário mínimo, o que pode levar a novas pressões no restante de salários. 

 

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