20/03/2013 - 21:00
A Companhia de Jesus, mais conhecida como ordem dos jesuítas, à qual pertence o papa Francisco, tem uma vasta tradição evangelizadora. Criada em 1540 pelos religiosos Inácio de Loiola e Francisco Xavier, entre outros, a instituição atuou como uma poderosa mutinacional e exerceu papel importante em diferentes regiões no mundo, especialmente na América Latina, para onde enviou missionários na época do Descobrimento, como Manoel da Nóbrega, fundador da cidade de São Paulo e o padre José de Anchieta, que aportou no Brasil em 1553, aos 19 anos, com a missão de catequizar os índios. Para eles, atuou como médico, ensinou latim e usou o teatro e a poesia como instrumentos para levar a palavra de Deus de uma forma lúdica.
Fiéis do mundo todo na praça São Pedro: para evitar que evangélicos e religiões como o islamismo
avancem sobre seus mercados, a Igreja Católica quer reforçar sua atuação em regiões
como América Latina, África e Ásia
Com os nativos, aprendeu tupi-guarani e escreveu a A arte da gramática da língua mais falada do Brasil. Passados cerca de cinco séculos, a vocação missionária dos jesuítas novamente assume um papel central para a instituição católica. Para ser mais preciso, um jesuíta em questão terá de encarnar o espírito evangelizador que fez a Igreja conquistar o Novo Mundo há alguns séculos: o papa Francisco. O argentino Jorge Mario Bergoglio assume o posto de principal líder religioso num momento crucial para uma Igreja, que tem de preservar – ou ampliar – seu rebanho global diante de um cenário marcado pelo avanço dos evangélicos e outras religiões não cristãs, como a islâmica, a que mais cresce no mundo.
O número de católicos, por exemplo, cai na América do Sul e na Europa, onde se encontram seus maiores rebanhos. O outro lado da moeda é que houve uma expansão vertiginosa na África (veja infográfico aqui). Assim, a nomeação de Francisco marca uma mudança no eixo estratégico da instituição fundada pelo apóstolo Pedro, até agora marcadamente eurocentrista. Em outras palavras, baseada na prioridade à Europa e na hegemonia dos religiosos da região em seus postos de comando, como a Cúria Romana e o próprio papado. “A Igreja Católica se deu conta como instituição de que sempre foi focada na Europa”, diz Paulo Bazaglia, teólogo do Instituto Bíblico de Roma. “Só que, agora, ela percebeu que o mundo pulsa para além do Velho Continente.”
O Vaticano demonstra que reforçará sua atuação em regiões onde suas chances de expansão são maiores. É o caso do mercado AAA: América Latina, África e, em menor medida, Ásia. “A África vive um momento de grande efervescência, tanto que foi cogitada a possibilidade de ser escolhido um papa da região”, afirma Valeriano dos Santos Costa, diretor da Faculdade de Teologia da PUC. “A Ásia também cresce para a Igreja Católica, embora numa proporção bem menor do que na África e na América Latina.” Se a análise se estender para o aspecto econômico, é importante observar que a África e a América Latina são as regiões mais promissoras. “A América Latina, por exemplo, possui uma realidade política e econômica muito favorável”, afirma Bazaglia. “Diria até mesmo privilegiada, no sentido de ter gente jovem, o que ajuda a Igreja em seu processo de renovação.”
André Perfeito, economista-chefe da corretora Gradual Investimentos, vai na mesma direção. “A produtividade dos trabalhadores dos países emergente está subindo com o avanço da tecnologia, da educação e da infraestrutura”, diz Perfeito. “Essas mudanças econômicas e estruturais estão criando outros arranjos políticos e, por isso, um papa latino-americano faz parte desse novo contexto.” Como se vê, existem razões de sobra para o Vaticano crer no sucesso da missão evangelizadora do papa Francisco. Ainda assim, seus desafios serão tão grandes quanto foram os vividos por seus pares jesuítas, como Anchieta e Nóbrega, que cruzaram o oceano em busca de novos horizontes para a palavra de Deus.