28/03/2014 - 21:00
O novo patamar do ritmo de crescimento chinês, em torno de 7% ao ano, tem causado preocupações mundo afora. Empresários, investidores e analistas estão assustados com a perda de ímpeto da locomotiva econômica global, que até recentemente registrava expansões anuais superiores a 10%. As mineradoras, por exemplo, temem uma queda no preço da commodity, se a demanda realmente cair. Há, no entanto, no Brasil um setor que esfrega as mãos quando olha para as transformações em curso na maior potência do Oriente: o agronegócio. A razão é simples. A China, que abriga em seu território 1,3 bilhão de habitantes, está mudando o seu modelo econômico, com mais ênfase no mercado interno.
Poder de compra: aumento da renda faz crescer potencial de vendas de carnes
e alimentos processados. Na foto, consumidores em Pequim
“Agora, eles querem ampliar sua classe média e aumentar o consumo interno”, diz o professor especialista em China Jean-Pierre Lehmann, da escola de negócios suíça IMD. A expectativa é de que, nos próximos anos, a inclusão social incorpore ao menos 300 milhões de pessoas, que vão migrar do campo para as cidades. Trata-se de um exército de consumidores, equivalente a 1,5 vez a população brasileira, que passará a ter acesso a bens e serviços antes considerados um sonho distante. A China é o principal parceiro comercial do Brasil, desde 2009, quando desbancou os Estados Unidos.
Em 2013, as exportações brasileiras totalizaram US$ 46 bilhões, dos quais o agronegócio representa quase 50% (leia quadro ao final da reportagem). “Há um certo exagero em dizer que o Brasil será afetado pela desaceleração chinesa”, diz Clodoaldo Hugueney, ex-embaixador do Brasil em Pequim. Avaliação semelhante é feita pelo consultor Plínio Nastari, da Datagro, que promoveu na semana passada o Global Agribusiness Fórum, em São Paulo. “A desaceleração chinesa não é um sinal amarelo para o agronegócio”, afirma. Os produtores de soja têm a China como o seu principal cliente. No ano passado, 32 milhões de toneladas do grão foram embarcados nos portos brasileiros, rumo ao maior mercado da Ásia.
Para o presidente da Aprosoja, Glauber Silveira, o futuro é ainda mais promissor. “Eles não têm como aumentar sua área cultivável”, diz Silveira. Do total de produtos agrícolas exportados pelo Brasil, 22% foram para a China. Os números só não são mais auspiciosos devido aos gargalos logísticos, que colocam o País em desvantagem competitiva em relação a Estados Unidos e Argentina. Ainda assim, as oportunidades estão colocadas à mesa. “Com o aumento da classe média, cresce o consumo de soja e proteína”, diz a senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA).
De acordo com o economista e pesquisador do Gavekal Dragonomics, Arthur Kroeber, que atua no mercado asiático, os novos consumidores chineses estão cada vez mais exigentes. “A população tem nível muito baixo de confiança nos fabricantes locais”, diz. De olho nessa demanda, o frigorífico JBS projeta um aumento de 20% nas exportações para o país, onde mantém três escritórios. Segundo o presidente do conselho de administração, Joesley Batista, a China é o principal cliente dos suínos e frangos exportados pela empresa, totalizando US$ 2 bilhões no ano passado.
“A desaceleração chinesa não vai afetar o setor”, diz Batista. Um estudo feito pelo Boston Consulting Group sobre o poder de compra da classe média emergente na China aponta que o potencial de consumo médio anual de carne per capita passará de 45 quilos em 2010 para 53 quilos em 2020. Já a demanda por laticínios crescerá, no mesmo período, de 25 quilos para 34 quilos por pessoa. Para quem ainda duvida do potencial chinês, o professor Lehmann, do IMD, resume: “Meu conselho para os empresários brasileiros é continuar focando na China.” É uma dica, por sinal, que não está restrita apenas ao agronegócio.
Colaborou: Ana Paula Ribeiro