Em discurso de posse no comando do Ministério das Relações Exteriores, o embaixador Mauro Vieira prometeu redobrar os esforços na área de comércio internacional para “aprimorar as relações com todos os mercados externos”. Foi ovacionado por empresários que lotaram o Palácio do Itamaraty e enxergam na retomada das exportações a alternativa ao baixo crescimento – em 2014, após 13 anos no azul, a balança comercial registrou um déficit de US$ 3,9 bilhões. A julgar pela situação que encontrou no ministério, porém, Vieira não terá uma missão fácil pela frente.

Nas primeiras semanas, o embaixador foi alvejado por reclamações de atrasos em pagamentos nos custos de diplomatas e acúmulo de dívidas com instituições internacionais. Um vexame para um país que quer ser protagonista no cenário econômico global. Embora o Itamaraty seja considerado uma das peças estratégicas de promoção do comércio, seu orçamento ficou praticamente estavel nos últimos cinco anos. Em 2014, foram R$ 2,6 bilhões, ou 0,15% do Orçamento total do setor público. Como comparação, o Ministério da Educação recebeu R$ 90,2 bilhões (5,2% do total).

“A política de exportação deve ser central para a política econômica e, nesse contexto, o Itamaraty é uma das peças importantes”, diz Thomaz Zanotto, do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp. Zanotto cita uma visita recente à embaixada na Rússia, onde constatou não haver condições financeiras para a realização de um estudo sobre logistica para empresas brasileiras interessados no país. “Às vezes, por uma economia pequena, perdemos milhões com exportações”, diz. As queixas em relação à falta de recursos nas embaixadas abrangem desde a realização de reuniões, eventos de promoção comercial até itens como o pagamento de aluguéis.

“Às vezes atrasa dois, três meses, e todo mundo fica angustiado e não consegue trabalhar tranquilo”, diz um diplomata na Europa, que não quis se identificar. Como boa parte do seu trabalho e de seus colegas consiste em “vender” a imagem do Brasil, muitos se sentem de mãos atadas. “É um sentimento de frustração profunda”, diz outro diplomata. Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff desistiu de fechar os nove escritórios da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) no exterior e de transferir os funcionários para as embaixadas e consulados, para poupar R$ 28 milhões ao ano. O recuo foi uma resposta à repercussão negativa.

A grave crise fiscal também levou o governo federal a acumular uma dívida estimada em R$ 600 milhões com instituições internacionais e fez com que o País perdesse o direito a voto em painéis como a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Embora débitos não sejam incomuns, analistas consideram esse tipo de pendência contraditório com a posição que o Brasil pretende ocupar no cenário internacional. “Um país que não paga suas contas internacionais perde credibilidade”, afirma o embaixador Rubens Barbosa. O caso da AIEA é um dos mais delicados, pois pode afetar o andamento do projeto de construção de submarinos nucleares brasileiros.

O País ainda corre o risco de deixar de receber da agência recursos para programas de saúde e de agricultura feitos em cooperação. Responsável pelo repasse da verba ao Itamaraty, o Ministério do Planejamento afirmou que há previsão de pagamento dos compromissos, mas o cronograma só será definido a partir da aprovação do Orçamento pelo Congresso, sem data marcada. A estimativa é de que sejam destinados R$ 864 milhões à gestão e participação em organismos internacionais. O Itamaraty afirma, em nota, que continua “a trabalhar, no âmbito do governo para lograr a regularização dessa situação, o mais rapidamente possível”.

Para especialistas, porém, os problemas sugerem que o País abre mão de exercer uma forte presença no exterior. “Perder voto em órgãos como esses fará com que sejamos um país que depende da boa vontade alheia”, diz o embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero. Até mesmo na Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), presidida pelo brasileiro José Graziano, o País deixou acumular um débito de R$ 36 milhões. O compromisso foi quitado recentemente, em um esforço para mantê-lo na cadeira. Tais fatos mostram que a tarefa do novo ministro não se restringirá a abrir mercados. Incluirá ainda uma boa dose de ações para reconquistar a credibilidade no exterior.

Colaborou: Denize Bacoccina