As notícias da economia real nas últimas semanas de julho não foram boas. Na terça-feira 22, o Ministério do Planejamento reduziu de 2,4% para 1,8% as estimativas de crescimento econômico para 2014, no Brasil. A inflação rompeu o teto da meta e, apesar dos sinais de queda dos índices antecedentes, deverá permanecer rondando os 6,5% durante mais um trimestre. Mesmo assim, o Índice Bovespa, um dos principais indicadores de expectativas econômicas, vem surpreendendo. Ele subiu 8%, em julho, e 27,5% desde março, uma das maiores altas entre os pregões relevantes.

A primeira explicação parecem ser as pesquisas eleitorais, que mostram sucessivas quedas na intenção de voto na presidenta Dilma Rousseff. No entanto, todos os levantamentos, inclusive o mais recente, também da terça-feira 22, mostram que, mesmo com as baixas, Dilma ainda seria vencedora no primeiro e no segundo turno da eleição deste ano. Tem de haver outra causa. Ela existe, e é simples: há dinheiro em excesso no mundo procurando o que fazer, e isso vem distorcendo os preços dos ativos financeiros, o que eleva os riscos de um solavanco inesperado nos preços das ações, no Brasil e nos demais mercados.

A gênese do problema veio dos programas de socorro aos bancos, estruturados a partir de 2009, nos Estados Unidos. Desde então, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) já injetou cerca de US$ 1,5 trilhão na economia. Quatro anos mais tarde, no fim de 2012, Shinzô Abe, recém-eleito primeiro-ministro japonês, deu início à sua versão da brincadeira, imprimindo 10,3 trilhões de ienes (cerca de US$ 100 bilhões) para estimular a economia do Japão. Um ano mais tarde, em 2013, o Banco Central Europeu (BCE) entraria no baile.

Sua própria versão do afrouxamento monetário passaria não pelos títulos públicos, mas pelos bancos. Mario Draghi, presidente do BCE, concedeu-lhes € 490 bilhões (US$ 655 bilhões) em empréstimos longos e baratos, de modo a reforçar a economia europeia, ao mesmo tempo em que se preparava para mais uma rodada ao longo do segundo semestre. Essa onda de capital barato salvou os bancos, mas não os bancários – nem os demais trabalhadores. Ela não tem sido capaz de estimular o crescimento econômico e os empregos, pois o ímpeto investidor dos empresários continua em baixa.

A economia americana contrariou todos os prognósticos e encolheu 2,9% no primeiro trimestre, após ter crescido 1,9% em 2013. Na Zona do Euro, o crescimento foi de apenas 0,2% nos três primeiros meses do ano. Como há pouca demanda por investimentos produtivos, o enorme estoque de capital disponível fica circulando nos mercados, à caça de oportunidades, e as ações estão no topo da lista. No ano, apesar do crescimento medíocre da economia, que em tese seria pernicioso para as empresas listadas, o Índice S&P de 500 ações subiu 7,5% no ano e 39% desde o fim de 2012.

Esse descolamento da realidade tem levado as principais lideranças financeiras a emitir alertas com graus variáveis de alarde. O mais recente foi do Instituto de Finanças Internacionais (IIF), divulgado na quarta-feira 23, através do qual a entidade, que representa bancos e investidores de todo o mundo, advertiu contra uma alta insustentável dos preços dos ativos financeiros, agravada por uma volatilidade muito baixa dos papéis. Esse fenômeno é atribuído à continuidade das taxas de juros próximas de zero nos Estados Unidos, no Japão e na Europa.

Em bom português: juros baixíssimos tornam muito fácil investir em ações, pois mesmo um ganho pífio torna a aplicação compensadora para os investidores. Isso estimula os investidores a comprar qualquer coisa por qualquer preço. “Uma alta consistente sem volatilidade indica que há dinheiro em excesso no mercado”, diz o economista carioca Alexandre Póvoa, sócio da gestora de recursos Canepa Asset. Tudo vai bem enquanto houver dinheiro novo chegando. No entanto, quando a fonte de dinheiro dá sinais de secar, a primeira reação do mercado é vender as ações para embolsar os ganhos.

No início de julho, o Fed anunciou que a injeção de recursos novos na economia dos Estados Unidos acaba em outubro. A economista Janet Yellen, que preside o Fed, é partidária da retirada gradual dos estímulos financeiros para evitar solavancos na economia americana, mas tem citado – assim como os documentos oficiais do banco – os riscos da retirada dos estímulos. “Os movimentos mais recentes dos mercados mostram que os investidores não estão considerando devidamente os riscos em suas decisões de investimento”, segundo a mais recente ata do Fed.