02/08/2013 - 21:00
Tão certo quanto dois e dois são quatro é imaginar o que acontece quando algum político brasileiro fica doente. Não importam seu Estado de origem, seu partido, seu sexo ou sua cor, o enfermo é removido de avião ou helicóptero para os principais hospitais particulares de São Paulo. Não foi diferente com o senador e ex-presidente da República José Sarney (PMDB-AP), de 83 anos, que passou mal durante o casamento de sua neta na noite do sábado 27, no Maranhão. Num primeiro momento, por precaução, ele foi internado no UDI Hospital, uma instituição privada, de São Luís, capital do Estado, cujo comando político há mais de quatro décadas está nas mãos do clã Sarney.
Diagnosticado um quadro de pneumonia e controlada a febre, o senador e sua família decidiram transferi-lo, na quarta-feira 31, para o hospital Sírio-Libanês, na metrópole paulistana, um dos mais conceituados da América Latina. É legítimo, evidentemente, que qualquer ser humano que esteja com sua vida em risco busque o melhor atendimento disponível ao seu alcance. Se o paciente dispõe de recursos suficientes para ter acesso a médicos renomados, não deveria haver motivo para críticas – embora no caso dos políticos nunca fique claro quem exatamente paga a conta dessas internações. Mas, ainda que as despesas médicas saiam do bolso do ilustre paciente, fica uma óbvia sensação de que ele não confia no sistema de saúde pública do seu próprio Estado – no caso específico do senador, nem no principal hospital particular da capital maranhense.
Não é difícil imaginar a indignação da população do Maranhão ao saber que seu político mais famoso não se dispõe a utilizar os leitos locais. Se perguntar não ofende, por que nunca se construiu um hospital público de ponta no Maranhão? Nem mesmo se pensou em propor uma parceria público-privada com as renomadas redes particulares de saúde de São Paulo para a construção de uma filial por lá, criando a oportunidade para que mais pessoas compartilhassem a excelência de seus serviços? Incompetência? Descaso? Ou a certeza de que o melhor plano de saúde é uma passagem de avião?
Sarney está longe de ser o único a ter esse tipo de comportamento. Prefeitos, governadores, ministros e parlamentares que deveriam zelar pela saúde pública brasileira não hesitam em pegar o primeiro voo rumo à capital paulista quando ficam doentes. E os políticos de São Paulo fogem do Sistema Único de Saúde (SUS) – a exceção talvez seja o atendimento no Incor. Haveria teste mais legítimo de eficiência administrativa do que um governador ser obrigado a utilizar o serviço público de saúde do seu Estado após concluir um mandato? O mesmo raciocínio vale para a educação.
De acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) divulgado na segunda 29, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com base em dados de 2010, o ensino melhorou muito no Brasil nas últimas duas décadas. Porém, ainda estamos distantes dos países desenvolvidos. Como no caso dos hospitais, é legítimo que as pessoas busquem as melhores escolas para os seus filhos – o que no Brasil, com raras exceções, significa pagar caro na rede privada de ensino. Mas, quantos políticos colocam os seus filhos ou netos em instituições gratuitas? Definitivamente, o Brasil só será um país desenvolvido quando os parentes dos nossos governantes estudarem em escolas públicas e forem atendidos pelo SUS.