30/09/2016 - 20:00
Não fosse pela língua inglesa, o debate entre a democrata Hillary Clinton e o republicano Donald Trump, na segunda-feira 26, poderia ser replicado no Brasil tanto pelo conteúdo econômico quanto pelo comportamento pouco elegante dos dois candidatos. A palavra “emprego” (job, em inglês) foi mencionada à exaustão durante os 90 minutos de confronto na Hofstra University, em Hempstead, no estado de Nova York. Embora o presidente Barack Obama tenha conseguido reduzir a taxa de desemprego de 10%, em 2009, para os atuais 4,9%, a população americana anseia oportunidades de trabalho com salários maiores.
Trump apresenta um diagnóstico correto do problema, mas apela ao populismo econômico para resolvê-lo. Segundo o republicano, milhares de empresas migraram para outros países, como México e China, que oferecem condições fiscais mais atraentes. “Você vai expulsar empregos do país”, afirmou o candidato republicano à sua oponente, a quem acusa de defender o Nafta (tratado de livre comércio na América do Norte). A solução, segundo ele, é reduzir impostos de forma generalizada, inclusive para o topo da pirâmide social. Com mais dinheiro no bolso, os empresários aumentariam os investimentos no País, gerando empregos.
Mais sensata, Hillary considera a proposta insustentável, pois geraria uma explosão no déficit fiscal do País na casa de US$ 5 trilhões,e propõe taxar os mais ricos. “É preciso repartir os lucros das empresas, não só para seus altos executivos”, afirmou a candidata democrata. O melhor caminho, na sua avaliação, é estimular pequenos negócios, focar em incentivos para a classe média e lutar pela igualdade de salários entre homens e mulheres. Embora nem sempre seja prudente comparar a maior economia do mundo com o Brasil, a nossa experiência recente mostra que uma redução aleatória de impostos pode ser um tiro no pé.
Nos últimos anos, o governo Dilma Rousseff desonerou diversos setores da economia, sem obter uma elevação dos investimentos. A consequência final foi o colapso das contas públicas, com um déficit recorde de R$ 170,5 bilhões previsto para esse ano. “A proposta do Trump é a mesma política fracassada que se adotou no Brasil”, afirma Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management. “No Estados Unidos, o erro seria ainda mais grave, pois a carga tributária é menor que a brasileira.”
Assuntos econômicos à parte, o duelo televisivo teve troca de farpas, ataques pessoais e diversas interrupções abruptas de ambos os lados. Embora Hillary tenha uma pequena vantagem nas pesquisas eleitorais, sua campanha não causa suspiros na população nem no mercado financeiro. O economista Vieira, que morou nos Estados Unidos no início da década passada, conta que seus amigos democratas e republicanos reconhecem que, independentemente de que vem for o vencedor, a Casa Branca terá um comandante pior do que Obama. Nesse contexto, eleger Hillary será muito mais uma decisão anti-Trump do que uma escolha convicta.
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