A economia brasileira cresceu 2,9% em 2022, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Resultado muito bom para os padrões brasileiros. Melhor ainda seria se o dado não fosse artificial. Os estímulos fiscais dados à economia pela dupla Jair Bolsonaro & Paulo Guedes durante a corrida eleitoral amorteceram o resultado do quarto trimestre e distorceram os números finais. Mas o que aparece forte no papel, se torna etéreo quando se conversa com as pessoas da economia real. Os vouchers e auxílios na campanha do ex-presidente não interromperam um enfraquecimento da atividade que começa após o chamado efeito reabertura, período em que o retorno a bares, restaurantes, salões de beleza, turismo e outras atividades provocou deu um salto com consumo represado. Essa euforia ficou concentrada no primeiro semestre e esfriou conforme o Brasil dava sinais de que nem tudo estava bem.

Todos esses números, no entanto, são uma imagem no retrovisor. Depois de cinco trimestres de altas puxadas pela retomada do setor de serviços, o resultado do 4º trimestre de 2022 (-0,2%) mostra que os aumentos da taxa básica de juros, a Selic, feitos pelo Banco Central desde 2021, começaram a trazer consequências fortes para a economia. Somam-se a isso os efeitos da inadimplência e da concessão de crédito, que devem repercutir no PIB até o final de 2024, segundo especialistas. O cenário é uma junção de um quadro de juros elevados, inflação ainda expressiva e de um maior endividamento das famílias. Um caminho tortuoso para o presidente Lula. A projeção para 2023 é que o PIB tenha um crescimento de apenas 0,84%, segundo o último relatório Focus do Banco Central.

Para Paulo Henrique Duarte, economista da Valor Investimentos, o crescimento do PIB não vai se repetir porque foi resultado de ações eleitorais do governo passado, com corte de impostos e auxílios pré-eleição para tentar turbinar dados econômicos. “O PIB já desacelerou. Hoje tá variando entre 0,5% e 1,2%, em reflexo da taxa de juros”, afirmou Duarte. “Impossível imaginar uma alta pujante da economia com a Selic entre 13% e 14% ao ano.”

Já na avaliação de Felipe Sichel, economista-chefe do banco Modal, os compromissos fiscais do governo Lula impedem uma repetição da política expansionista de Bolsonaro. “Um PIB maior em 2022 e 2023 só seria possível se o governo anterior tivesse perseverado nas reformas e gerado menos volatilidade e incertezas”, afirmou Sichel. Para ele, o fator externo também gera incertezas sobre como será desempenho neste ano, principalmente no que se refere à retomada da economia chinesa e à capacidade de reação das economias europeias e dos Estados Unidos. Por isso, nessa queda de braço, enquanto o governo Lula não definir sua política fiscal e qual será a nova âncora das contas públicas, os juros não vão cair e o PIB será incerto. Para Josilmar Cordenonssi, professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, essa luta inglória só prejudica o povo, em especial o mais pobre. “Mas com as reformas e sem artifícios eleitoreiros, o Brasil pode crescer de 2% a 3% ao ano, de forma natural”, disse.

GUINADA Se embalar no ritmo de Bolsonaro, Lula terá muita dificuldade de equilibrar a tríade macroeconomia que envolve um equilibrio entre crescimento do PIB, controle da inflação e taxa de desemprego. Não haverá caminho fácil. As reformas estruturantes precisam estar combinadas com medidas como o Desenrola, que pode ser lançado na primeira quinzena de março e que promete revisar as dívidas de famílias que ganham até dois salários mínimos. A nova tabela do IR e ampliação do Bolsa Família também ajudam a aumentar a riqueza do País, mas precisam ser combinadas com medidas de controle fiscal do governo para ter efeito na queda dos juros.

Em cifras, o PIB brasileiro bateu R$ 9,9 trilhões em 2022, com taxa de investimento de 18,8%. O per capita teve alta real de 2,2%. O setor de serviços foi destaque pela ótica da oferta, com alta de 4,2% no ano. Em valores correntes, foram R$ 5,8 trilhões no ano (veja mais no gráfico acima). Diante disso, Lula pega um PIB inflado artificialmente, mas pode virar o jogo se usar as armas básicas da política fiscal e assim lograr a primeira grande vitória de seu governo.