28/02/2012 - 21:00
O convite chegou por e-mail, no início da semana, e era mais do que irrecusável. Era exatamente o que o setor produtivo vinha querendo há muito tempo. Conforme a DINHEIRO antecipou na coluna Guilherme Barros, na semana passada, a presidenta Dilma Rousseff receberia no Palácio do Planalto um grupo que representava as maiores corporações do País. Na quinta feira 22, ao redor da mesa de reuniões no segundo andar do palácio, 28 empresários foram provocados pela presidenta a falar sobre os seus planos de investimentos e as dificuldades em implementá-los. Ressabiada com o crescimento de apenas 2,7% na economia em 2011, Dilma tenta se aproximar das pessoas que, ela sabe, podem ajudar o País a atingir o PIB potencial de 4,5% para este ano.
Ao sair da reunião, Dilma deve ter gostado do que ouviu: 13 de seus 28 convidados planejam desembolsar neste ano cerca de R$ 80 bilhões em novos projetos, 10% de tudo o que o setor privado aplicou na produção em 2011 (leia quadro ao final da reportagem). É disso que o Brasil precisa. A reunião foi aberta pela presidenta, que falou sobre a meta do governo de ampliar a taxa de investimentos para 24% do PIB – no ano passado, foi de 19,3%. Para atingir o objetivo, ela evocou o “espírito animal” do empresariado, citando a teoria do economista britânico John Maynard Keynes, que relacionava o ímpeto de investir, ou animal spirit, ao grau de confiança de um empreendedor no futuro.
Diante de um cenário de juros baixos, uma política de controle cambial e novos estímulos ao empresariado, não haveria por que inibir esse impulso, segundo a presidenta. “Ela nos pediu para acreditar no mercado brasileiro, pois hoje temos um consumo que ninguém tem”, disse a empresária Luiza Trajano, presidente do Magazine Luiza. A ponderação keynesiana foi a deixa para que os empresários, na verdade, pudessem falar de seus projetos e das dificuldades em implementá-los. Dilma mais ouviu do que falou, e talvez por essa disposição não tenha recebido muitas queixas. Poucos repetiram na frente dela as reclamações que costumam fazer em outras ocasiões em recintos fechados ou em associações de classe.
Ao mesmo tempo, todos ficaram impressionados com o bom humor e a disposição da mandatária, numa reunião que durou quatro horas. Na mesa, somente água e sucos. Não faltaram, porém, assuntos indigestos. O real valorizado, por exemplo, foi um deles. “O que está matando a indústria brasileira é o câmbio”, disse Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). “É o grande dificultador. As outras políticas são de longo prazo.” O ministro da Fazenda, Guido Mantega, que participou da reunião, prometeu atenção ao assunto. “Vamos intervir no câmbio para que a nossa moeda não se valorize mais”, disse o ministro. O endividamento, que atinge 58% das famílias, também foi tema de debate.
Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco, fez um relato preocupante do problema. “Estamos no limite da concessão de crédito”, disse. Luiza Trajano discordou. Segundo ela, embora os consumidores estejam tomando mais crédito, os pagamentos estão sendo feitos em dia e movimentando o comércio. A empresária aproveitou para defender a extensão da redução do IPI para a linha branca, que vence no fim deste mês. A medida, em vigor desde dezembro, garantiu que as vendas do setor subissem 22,6%. A presidenta ouviu, mas não se comprometeu. O governo decidiu priorizar a indústria que mais tem sofrido as consequências do câmbio. Mantega acenou com novas medidas para ajudar a reduzir os custos de produção. Uma delas é a ampliação para outros setores de desoneração da folha de pagamento, com a cobrança do INSS sobre o faturamento, em vez dos salários.
Nas últimas semanas, o ministro conversou sobre o assunto com representantes de dez setores, como bens de capital, autopeças e têxtil. Os fabricantes de ônibus, representados pela Marcopolo, vão pedir nesta semana para ser incluídos no novo regime. Outra boa notícia, que soou como música para os presentes, é a diminuição do custo da energia. Dilma garantiu que as concessões das hidrelétricas que vencem a partir deste ano serão renovadas com redução da tarifa. A presença do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, confirmou a intenção do governo de dar mais atenção ao setor produtivo.
Na atual fase de relações conturbadas no Congresso, a presidenta Dilma aproveitou para pleitear o apoio dos empresários à aprovação de projetos de interesse comum. Um deles é a Resolução 72, que está no Senado, e visa acabar com a guerra fiscal entre os Estados. O projeto unifica em 4% a alíquota interestadual do ICMS incidente sobre produtos importados e elimina os descontos do imposto que alguns governos concedem. “Não se preocupe, vamos trabalhar para aprovar as leis”, ouviu do construtor Marcelo Odebrecht. “O governo acaba de ganhar mais um líder no Congresso”, brincou Josué Gomes da Silva, da Coteminas. Apesar da descontração, o assunto é sério.
Na avaliação do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, a reunião foi um ato político da maior importância, pois deixa claro que o governo e o setor privado trabalham juntos para o crescimento. “O governo é realista, voltado para o fortalecimento da economia. O juro real baixo se traduz em crescimento”, afirmou Trabuco. Os 28 representantes do setor privado celebraram a disposição da presidenta ao diálogo. A ideia de Dilma é reunir os empresários a cada três meses. Se o discurso virar prática, o custo Brasil deve diminuir e a confiança dos empreendedores, aumentar. O resultado prático – maiores investimentos na economia doméstica e um PIB mais robusto – ficará por conta do espírito animal.