Processos de fusões e aquisições de empresas estão entre os eventos mais sigilosos do mundo corporativo. No entanto, esses encontros a portas fechadas têm contado com uma participação crescente de executivos que podem até não gostar de ficar sob os holofotes, mas estão longe de ser coadjuvantes. O caso mais recente é a possível fusão entre as empresas de logística ALL e Rumo Logística, do grupo Cosan. A união tem sido costurada por Alexandre Santoro, CEO da ALL, e por Rubens Ometto, da Cosan, com a participação de representantes do governo e de um protagonista inesperado, a gestora de recursos Gávea, fundada por Armínio Fraga, ex-presidente do BC. 

 

73.jpg

Costurando parcerias: A gestora Gávea, de Armínio Fraga (à esq.),

está possibilitando o acordo entre a Cosan, de Rubens Ometto

(à dir.), e a ALL, de Alexandre Santoro (ao centro)

 

A Gávea é um pequeno gigante. Com R$ 16,8 bilhões em seu portfólio, a gestora carioca é minoritária no capital da Rumo, mas pode exercer seu direito de preferência e fazer um novo – e parrudo – aporte no negócio. Com isso, a companhia recém-formada ganharia mais fôlego para investir em novas concessões. “Dependendo do desenho da operação, queremos analisar o negócio”, afirma Piero Minardi, sócio do Gávea, sobre a injeção de recursos. Segundo Minardi, o momento é propício. “Muitas empresas precisam prosseguir com seus investimentos, mas o BNDES puxou o freio de mão, os bancos estão mais cautelosos e os juros estão subindo”, diz ele. 

 

“Nesse cenário, o private equity torna-se uma boa alternativa.” As negociações entre ALL e Rumo começaram em outubro do ano passado, para resolver um impasse sobre a duplicação de uma ferrovia, que acabou não saindo do papel. “A qualidade dos serviços que a ALL vinha prestando ao setor sucroalcooleiro estava deixando a desejar nos últimos meses, e a Rumo Logística, seu principal cliente, estava sendo prejudicada pelo não cumprimento de contratos”, diz William Alves, analista-chefe da XP Investimentos. Ele diz ser favorável à participação de fundos como o Gávea e o americano Texas Pacific Group, que é sócio da Rumo nas negociações. 

 

74.jpg

Minardi, da Gávea: ”As empresas precisam investir, mas os bancos

se retraíram, o que abre oportunidades para os fundos.”

 

O mercado parece ter aprovado. Na segunda-feira 13, quando circulou a notícia de que os fundos, além de fundações como Previ, Funcef e o próprio BNDES, estavam participando da negociação, as ações da ALL subiram 8%. A Rumo é de capital fechado. Outra gestora que abocanhou uma fatia minoritária, mas relevante, em uma empresa aberta foi a Credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG), ligada ao banco suíço Crédit Suisse. No caso, a companhia especializada em navegação de cabotagem Log-In. Seu maior acionista era a Vale, que chegou a possuir 31,3% do capital. No processo de venda de ativos para concentrar-se na atividade principal, a mineradora decidiu vender todas as ações, o que ocorreu no fim de dezembro do ano passado. 

 

A decisão veio em um momento no qual a Log-In estava no meio de um grande programa de expansão. Com a venda pela Vale, 50,7% das ações se pulverizaram pelo mercado, sendo que os fundos da CSHG adquiriram 11,15% delas. A gestora independente Fama Investimentos permaneceu a maior investidora individual, com 12,9% do capital, seguida pela Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, com 12,8%. “O fato de a Vale, principal acionista da Log-In, querer sair projetava uma sombra sobre o futuro da companhia”, diz um executivo próximo à operadora logística. “Agora, com a entrada de sócios bons, a sensação é de que há chances de a empresa deslanchar”, comenta um executivo próximo à operadora logística, que preferiu não se identificar.

 

Os dois casos mostram o aumento do interesse dos fundos pelas empresas brasileiras. Segundo um extenso levantamento feito pela DINHEIRO, houve 185 comunicados ao mercado de compra e venda de participação relevante em empresas de capital aberto, em 2013. Esse número é 46 vezes maior do que o total registrado oito anos antes – dado mais antigo disponível na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Entre as explicações para esse salto considerável, está a vinda dos investidores estrangeiros para o Brasil. É que, em meio à crise financeira, o crescimento econômico brasileiro estimulou várias companhias a acessar o mercado de capitais. E, no que depender dos gestores, o apetite permanecerá aguçado em 2014, mesmo que a economia brasileira tenha perdido o fôlego e que Estados Unidos e Europa deem sinais de retomada. 

 

75.jpg

Garry Evans, do HSBC: “Temos muito interesse pelo Brasil, e após as reformas

haverá um grande avanço nos investimentos.”

 

O motivo é a queda de quase 16% da bolsa brasileira em 2013, que fez as ações ficarem mais baratas em relação ao potencial de geração de caixa das companhias. Daí os ganhos se tornam mais apetitosos. Segundo um relatório do BTG Pactual, a BM&FBovespa é a bolsa mais barata entre os seus pares da América Latina, já que a relação entre preço e lucro (P/L) das empresas, em média, chega a 10,7 vezes. No México, o indicador é de 17,6 vezes, enquanto na Argentina é de 16,6 vezes. Segundo Carlos Sequeira, Fabio Levy, Bruno Andreazza e Ronny Berger, analistas do banco, a possibilidade de ganho, no Brasil, é de 12%, em 2014. Se o investidor não comprar ações da Petrobras e da Vale, o prognóstico de ganho sobe para 14%. 

 

A expectativa da equipe é de que o Ibovespa atinja 60 mil pontos no fim do ano, mesmo com as incertezas em relação às contas públicas e ao crescimento da economia. Garry Evans, estrategista-chefe global do HSBC, afirma que a posição do banco em relação às ações brasileiras é atualmente neutra. “Assim como os investidores globais, temos muito interesse pelo País, e por outros BRICs, mas queremos ver reformas estruturais”, diz. “Assim que saírem do papel, veremos um avanço muito grande.” A BlackRock não quis esperar. Desde que desembarcou no País, se tornou de longe a gestora mais ativa na compra e venda de participações relevantes nas companhias. A casa, que administra mais de US$ 4 trilhões no mundo, participou de 39 das 500 operações registradas em 2013. 

 

Como muitas gestoras, a BlackRock tem voz ativa em conselhos. Tanto é que ela liderou um grupo de minoritários para indicar nomes para o conselho de administração da Petrobras. A estatal voltou a ser pressionada pelos pequenos gigantes, mas, desta vez, pela Aberdeen Asset Management, que, no fim do ano passado, arrebatou 5% das ações preferenciais da Petrobras. O ano de 2014 mal havia começado e a Aberdeen voltou a negociar a sua fatia de mercado nas companhias brasileiras. Desta vez, o alvo foi a Cia. Hering. Nas duas primeiras semanas de 2014, foram realizadas 24 operações com participação relevante, sendo 16 de compra e oito de venda. No mesmo período do ano passado, o mercado se mostrava dividido: foram dez aquisições e dez alienações.

 

76.jpg