A desaceleração econômica da China não afetou apenas as cotações do minério de ferro. O mercado de arte global também se ressentiu da retração dos endinheirados chineses. Nos últimos anos, eles foram participantes ativos e vorazes dos leilões realizados por casas tradicionais, como Christie’s e Sotheby’s, turbinando os preços das obras colocadas à venda. No entanto, a retração da economia chinesa e as crescentes suspeitas de corrupção os afastaram. Resultado: as vendas globais de arte recuaram 7%, no primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado, segundo uma pesquisa da empresa canadense ArtInfo.

Esse movimento global, simultâneo à forte retração da economia brasileira, também afetou as obras de artistas nacionais. Em 2012, “Meu Limão”, óleo sobre tela de Beatriz Milhazes, foi vendida por US$ 2,1 milhões na Sotheby’s, estabelecendo um recorde para artistas brasileiros vivos. Atualmente, preços como esses dificilmente seriam atingidos. “Os trabalhos de artistas de primeiríssima linha não caíram de preço, mas não se alteraram desde o ano passado”, diz o carioca James Lisboa, com um leilão marcado para o próximo dia 5 de outubro, em São Paulo, A estrutura do leilão de Lisboa mostra que o mercado mudou.

Normalmente realizado em duas ou três noites, o evento de outubro vai concentrar os lances em apenas uma noite. “No passado recente, o que eu colocava à venda era arrematado, agora o mercado está mais seletivo”, diz o leiloeiro. Assim como ocorre na bolsa de valores, que oferece pechinchas em tempos bicudos, o mercado de arte também pode apresentar surpresas boas em momentos de crise. Embora os preços dos artistas brasileiros possam permanecer estáveis em reais (e cair em dólares) por um ou dois anos, quem pensa na arte como um investimento de longuíssimo prazo pode tirar proveito do momento.

“O especulador desapareceu, o que desinflou os preços”, diz Lisboa. A disparidade dos preços iniciais mostra bem o momento incerto do mercado. É possível disputar esboços de Di Cavalcanti ou Portinari em papel por preços iniciais ao redor de R$ 4.200, embora os lances pelo óleo sobre tela “Paisagem de Diadema”, de Anita Malfatti, partam de R$ 500 mil. Vale a pena? A desaceleração do mercado pode ser momentânea.

Uma pesquisa internacional realizada no início do ano pela consultoria Deloitte junto a 700 family offices – instituições que administram recursos de famílias com grandes posses –da Europa e dos Estados Unidos –mostra que 82% dos gestores de recursos consideram investir pelo menos uma fatia do patrimônio em arte, um percentual superior aos 65% registrados em uma pesquisa semelhante, realizada antes da crise de 2008. A liquidez é pequena, mas obras de primeira linha ou com público específico – como arte brasileira ou latino-americana, que recentemente encontraram seus entusiastas – são capazes de manter seu valor no longo prazo.