Nos últimos dez anos, poucas empresas passaram por tantos altos e baixos como a subsidiária brasileira da rede varejista francesa Carrefour, a segunda maior do País, com receita de R$ 29 bilhões em 2010. Após décadas na liderança do mercado brasileiro, o Carrefour  perdeu a posição para o grupo Pão de Açúcar (dono das bandeiras Extra e CompreBem). Em 2007, a rede francesa retomou o posto, após adquirir o controle do Atacadão, para perdê-lo novamente quando o arquirrival se uniu à Casas Bahia, três anos mais tarde. Por fim, trocou o presidente em meio a um rumoroso caso de fraude fiscal, que teria causado um rombo de R$ 1,2 bilhão em 2010. Mais recentemente, o Carrefour quase foi “engolido” pelo Pão de Açúcar, em uma polêmica fusão que envolvia o BTG Pactual e o BNDES. A despeito de todas as turbulências, a filial local ainda é uma estrela de primeira grandeza aos olhos da matriz. 

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Importância global: Lars Olofsson, CEO global, elogiou o desempenho recorde da filial no trimestre,
cujas vendas somaram 3,1 bilhões de euros

No trimestre julho-setembro, as vendas combinadas de Carrefour e Atacadão avançaram 7,1% para o patamar recorde de € 3,1 bilhões. O feito foi saudado pelo chefão Lars Olofsson, CEO mundial da rede. “O crescimento, em um ambiente econômico adverso, foi puxado pelos mercados emergentes, com destaque para o Brasil”, disse Olofsson,  em comunicado divulgado em 13 de outubro. Boa parte desse desempenho se deve à estratégia traçada pelo brasileiro Luiz Fazzio, presidente do Carrefour do Brasil, que sucedeu ao francês Jean Marc Pueyo. Com passagem por empresas como C&A,  Pão de Açúcar,  Makro e  Walmart, nas quais ocupou postos de comando, Fazzio está impondo um estilo mais agressivo aos negócios. Para mudar os rumos da empresa por aqui, ele adotou medidas impopulares como o fechamento de 13 lojas: cinco hipermercados e oito supermercados. “No varejo é preciso tomar decisões rápidas”, disse Fazzio, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. “Por conta disso, não tinha sentido insistir na tentativa de recuperar essas lojas.”  

De acordo com o executivo, isso não significa que a companhia pretenda encolher no País. Muito ao contrário. Seis desses pontos de venda foram convertidos para o formato Atacadão, que atua como atacarejo – atendendo tanto os pequenos comerciantes como os clientes individuais. Além disso, foram abertas mais sete com essa bandeira. “O Atacadão foi uma aquisição importante, pois colocou os franceses em uma posição privilegiada no segmento”, afirma Jacob Jacques Gelman, coordenador do centro de excelência em varejo da FGV-SP. A prioridade de Fazzio, que raramente concede entrevistas e que nunca se deixa fotografar, é preparar o Carrefour para os próximos dez anos. Um dos pilares de seu plano estratégico é exatamente o Atacadão. Ele será usado para disputar clientes em Estados emergentes do eixo Centro-Oeste-Norte-Nordeste, além de bairros das áreas regiões metropolitanas das capitais das regiões Sul e do Sudeste, onde predominam os chamados consumidores das classes C e D. 

 

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Novo modelo: para melhorar a margem de lucro, a filial vai adotar o modelo Planet,

criado pela matriz e que valoriza os produtos mais lucrativos

 

O objetivo é abrir 20 unidades por ano, até 2014. Apesar de as concorrentes estarem de certa forma seguindo o mesmo caminho, os analistas consideram a decisão de Fazzio acertada. “Esse modelo (atacarejo) está longe de se esgotar”, diz Cláudio Felisoni de Angelo, presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo (Provar/Ibevar). “Especialmente em cidades fora do eixo Rio-São Paulo.” Fazzio conta com a simpatia da matriz para tocar seu plano. Prova disso é que ele conseguiu dobrar, para R$ 200 milhões, a verba de investimento em 2011. Para o próximo ano, a meta é manter esse patamar. Além de ampliar as filiais do Atacadão, outro objetivo será a revitalização das lojas, o treinamento de funcionários e a melhoria de áreas sensíveis. Uma delas é a de atendimento ao cliente. Para isso, foi criada uma diretoria para cuidar exclusivamente do setor de check-outs. 

 

A ideia é investir no treinamento das profissionais e na aquisição de novos equipamentos. “Descobrimos que não estávamos preparados para lidar com os consumidores emergentes”, afirma Armando Almeida, diretor corporativo do Carrefour. “Eles estão mais exigentes e têm mais opções de compra.” Para recuperar o terreno perdido para o Pão de Açúcar e evitar a perigosa aproximação do Walmart, a subsidiária da rede francesa também pretende dar uma repaginada geral nas lojas, especialmente nas mais antigas. Vinte delas já foram reformadas. A aposta, no caso dos hipermercados, é usar o modelo Planet, como forma de elevar o desempenho das unidades. O Planet consiste na valorização dos espaços destinados à venda de produtos frescos (peixe, por exemplo), vestuário e perfumaria, que geram maior margem de ganho. Na Europa, seu foco são os integrantes da classe A. Esse modelo começou a ser implantado por uma loja de Santo André (SP). A meta é estender, em maior ou menor grau, para todas as redes. “Ainda temos muito trabalho pela frente”, afirma Fazzio.

 

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