25/07/2016 - 18:00
Em 2011, quando compraram a Schincariol, tradicional cervejaria de Itu, no interior de São Paulo, os japoneses da Kirin estavam otimistas com o mercado brasileiro de cervejas, na época o terceiro maior do mundo. As perspectivas eram positivas e o cenário competitivo, ainda que dominado pela gigante Ambev, que ainda hoje possui 63% das vendas, parecia promissor em virtude do crescimento das bebidas premium e artesanais, uma das principais forças da Schin. A empresa nipônica também tinha uma dose de confiança a mais em virtude de sua trajetória. Criada em 1907, ela ostentava a incrível marca de nunca ter registrado um ano sequer de prejuízo desde 1949, quando abriu seu capital. Desde que iniciou sua jornada brasileira, no entanto, tudo mudou. O mercado vem caindo e as vendas da Brasil Kirin ainda mais. Tanto que sua matriz se viu obrigada a realizar uma baixa contábil de R$ 3,8 bilhões, no ano passado, o suficiente para interromper mais de seis décadas com o azul predominando na última linha do balanço. A empresa registrou perdas de 56 bilhões de ienes (US$ 462 milhões), em 2015.
Comandada no Brasil pelo CEO André Salles, a Brasil Kirin agora prepara uma série de mudanças para retomar o crescimento e o otimismo no País. Elas incluem o reposicionamento das marcas, o enxugamento das operações e a redução de custos. Entre as possíveis medidas a serem tomadas estão a venda de algumas unidades, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto. Esse processo já começou no ano passado, quando a fábrica da empresa em Cachoeiras do Macacu, no Rio de Janeiro, foi vendida para a Ambev – os valores da venda não foram divulgados. Agora, a companhia estaria negociando duas outras unidades, uma em Horizonte, no Ceará, e outra na cidade de Alexânia, em Goiás. Essas duas fábricas têm capacidade para produzir 3,5 milhões de hectolitros de cerveja por ano, juntas. Em nota, a Brasil Kirin afirmou que “está permanentemente buscando alternativas para otimizar a utilização de seus ativos e elevar a eficiência operacional.” A meta, para este ano, é economizar R$ 200 milhões.
Em apresentação a investidores, realizada em junho, Salles afirmou que a queda nos volumes vendidos impõe desafios às operações. As vendas de cervejas da companhia caíram 16,8% e seu faturamento recuou 7,2%, para R$ 3,7 bilhões, no ano passado. O executivo apontou que, apesar da forte posição da empresa no Norte e no Nordeste, a entrada de novos competidores levou a Kirin a perder mercado nessas regiões. Segundo ele, falta à empresa uma marca forte nas regiões Sul e Sudeste, mercados dominados pela Skol e pela Brahma, da Ambev. Nesse sentido, a aposta está no segmento de cervejas especiais, no qual a companhia está investindo R$ 400 milhões.
Para fazer frente à Ambev no Sudeste, a principal aposta está na Devassa, marca que será reposicionada no mercado. Uma versão popular da cerveja, chamada de Bem Loura, foi descontinuada, dando lugar à sua receita feita com puro malte e sem adição de outros cereais, como milho e arroz – processo que é criticado por admiradores mais ferrenhos da bebida. Segundo a empresa, o preço da Devassa deve ficar acima das concorrentes, porém por uma margem pequena. Para incentivar o consumo de cervejas mais elaboradas, a Kirin também aposta em novas embalagens para sua marca Eisenbahn, que agora é vendida em latinhas e em garrafas de 600 ml.
Apesar dos percalços, a Kirin não considera um erro a compra da Schincariol, diz um executivo do setor. Em grande parte, isso se deve ao fato da companhia brasileira, quando estava sob o comando da família que dá nome à cervejaria, ter sido a primeira a investir no segmento premium com a compra da Baden Baden, em 2007. Essa aposta nas bebidas especiais também está sendo feita pela holandesa Heineken, que vê sua participação de mercado crescer lentamente. Segundo a Euromonitor, a Heineken tinha uma fatia de 6,8% do setor em 2015, ante 6,7%, em 2014.
Pelos cálculos da Kirin, o mercado de cervejas especiais representa 5,7% do total. As marcas populares respondem por 68%, mas elas detinham 72% em 2014. A indústria cervejeira, no entanto, está em queda. No ano passado, o volume consumido no Brasil foi 2,6% menor. No primeiro semestre deste ano, a produção nacional diminuiu 2,2%, de acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria da Cerveja. Para Paulo Petroni, diretor-executivo da entidade, esse é um indicativo de que as dificuldades econômicas do País ainda não foram superadas. A boa notícia é que o setor de bebidas responde rápido ao avanço da economia.