05/02/2016 - 17:00
Nem o compenetrado Mark Mobius, um dos mais famosos gestores de recursos de países emergentes do mundo, resiste. Todos os anos, ele visita o Brasil em fevereiro ou março. Além de conversar com investidores, economistas e empresários, Mobius aproveita para observar o carnaval ao vivo e em cores. “Eu e minha equipe aproveitamos para festejar um pouco depois do trabalho”, escreveu ele aos cotistas da Franklin Templeton, sua empresa, em março de 2015.
“Além da diversão, é uma boa maneira de sentir como está o humor do povo.” Como Mobius, diversos gestores de recursos internacionais estão olhando o mercado brasileiro de uma perspectiva bastante carnavalesca. Não é o caso, ainda, de compromisso sério, muito pelo contrário. Quem dispõe de pouco samba no pé não quer nem ouvir falar no assunto. Um relatório do banco suíço UBS de 29 de janeiro, obtido pela DINHEIRO, mostra a pouca disposição helvética para rasgar a fantasia.
O artigo, assinado pelos economistas Guilherme Loureiro e Thiago Carlos, prevê uma contração da economia de 3,8%, uma apreciação adicional do dólar para R$ 4,30 até o fim do ano, e avalia que, tendo em vista a situação política difícil, os preços dos ativos dos brasileiros ainda não estão baratos o suficiente. “Ajustando pela inflação, o pico do dólar de R$ 4,00 de 2002 é equivalente a R$ 5,50 atualmente”, escreveram eles. Resumindo, não compre agora. Está barato, mas deve cair mais.
Esse é o refrão do puxador na avenida, mas quem tiver apetite por risco – e uma razoável tolerância a eventuais atravessadas no samba – pode aproveitar o câmbio favorável e o baixo preço dos ativos brasileiros, mesmo em reais, para fazer bons negócios. Quem acompanha o mercado já percebeu o interesse renovado, ainda que pontual, de alguns investidores internacionais. “Eles estão comprando papéis muito específicos, sem olhar para setores, ou estão especulando com ações muito líquidas, como Vale e Petrobras, na intenção de ganhar com a volatilidade”, diz o economista carioca Álvaro Bandeira, veterano do mercado de ações.
Ele recomenda cautela a quem pretende rasgar a fantasia. “Não é um movimento de massa, mas algo específico, e ainda não é possível dizer se isso vai aumentar no curto prazo.” Há boas justificativas para isso. Um relatório da economista americana Sheryl King, da empresa de análise fundada pelo economista Nouriel Roubini, avalia que os países emergentes deverão apresentar um desempenho melhor do que os desenvolvidos, apesar da instabilidade econômica provocada pela volatilidade financeira. “O crescimento será inferior ao potencial, mas vai existir”, escreveu ela. Isso atrai investidores dispostos a correr riscos.
Como ganhar com a estratégia dos gringos? Em primeiro lugar, investimentos que só estão disponíveis para quem tem muito dinheiro, como a aquisição de empresas brasileiras. “A hora é boa para fusões e aquisições, temos cerca de 50 operações em planejamento”, diz Rodrigo Puga, do banco de investimentos carioca Modal. Uma possibilidade de ganhar com essa estratégia sem ter de desembolsar várias dezenas de milhões de reais é acompanhar as empresas que podem ser objeto de compra ou de fechamento de capital.
Há várias em análise, e pelo menos mais uma dezena deverá ocorrer ao longo do primeiro semestre, dizem os banqueiros de investimento. Os alvos mais prováveis para essas ofensivas são companhias pouco negociadas, muito baratas e relativamente pequenas. “Construtoras ou empresas de consumo isoladas, que as únicas do seu setor em bolsa, são alvos naturais”, diz um banqueiro de investimentos de um banco internacional. Comprar empresas é para poucos, mas também é possível juntar-se ao bloco com menos confetes.
Algumas empresas bastante defensivas atraem os investidores. Nomes como AmBev, Itaú ou Bradesco são consideradas à prova de crise, diz Bandeira. Nesses casos, a preferência internacional é clara: empresas que vêm registrando lucros crescentes ou consistentemente elevados ano após ano, são pouco expostas aos solavancos do câmbio e dominam seus mercados. Vale dizer, companhias que Warren Buffett compraria. Aqui, não adianta pensar em setores exportadores e acreditar, automaticamente, que todas as empresas serão beneficiadas pela alta do dólar.
Companhias muito endividadas, tanto em reais quanto em dólares, podem ver seus ganhos serem engolidos pelo serviço de suas dívidas, que ficou bem mais caro em relação ao ano passado. A segunda estratégia, diz Bandeira, é bem mais arriscada e vale para quem não tem medo de cair na avenida. Trata-se exatamente de atravessar as alegorias da política e da economia e operar no curtíssimo prazo, tentando abocanhar os ganhos com a volatilidade. Essa é uma alternativa recomendada apenas para quem tem acesso a auxílio profissional ou conhece o funcionamento do mercado.
Finalmente, quem não quer saber de risco pode ganhar um bom dinheiro pelo menos pelos próximos dois anos. É possível investir em títulos de renda fixa prefixados de prazo mais longo que pagam taxas acima de 15% ao ano. Os prognósticos de inflação estão ao redor de 7%, e, para os especialistas, deverão permanecer nesses patamares em 2016 e em 2017 devido à baixa temperatura da economia. Na ponta do lápis, é possível ganhar, sem correr riscos, 5% a 6% ao ano depois de pagar imposto. “Essa é uma excelente rentabilidade”, diz Bandeira. Suficiente para que mais de um gringo se arrisque a desfilar na avenida.