À medida que os tempos de hiperinflação ficam mais distantes, a memória dos preços descontrolados se desvanece. Para 62,9 milhões de cidadãos com menos de 20 anos, pouco menos de 33% da população, moeda é algo que não muda e cujo valor oscila pouco ao longo do tempo. Para saber o que pensam alguns desses cidadãos, DINHEIRO foi ouvi-los. Em duas horas de conversa com cinco estudantes de economia da Universidade de São Paulo – Ahmad Mourad, Lucas Dallaverde, Marina Sacchi, Rafael Passos Vicente e Victor Orestes –, a constatação é de que esses jovens, nascidos em São Paulo ou na região metropolitana da capital paulista, com idade ao redor de 20 anos, são mais otimistas e, paradoxalmente, mais pragmáticos que seus pais. A seguir, os principais pontos da conversa.

 

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Inflação e previsibilidade:

A inflação é um problema mais perceptível para quem está na base da pirâmide. “Eu não tenho uma percepção clara da inflação, eu acho que ela é sentida no bolso de quem ganha menos, de quem não tem capacidade de investir dinheiro no banco, a classe pobre”, diz Dallaverde. “Quem não coloca dinheiro no banco não tem acesso a produtos bancários, esse sente mais a inflação”, avalia Orestes. “Quem sente mais a inflação é quem frequenta supermercado, que é o meu caso”, diz Passos Vicente. “Já Mourad diz acreditar que a estabilidade brasileira é algo ainda relativo. “O Brasil é muito mais estável do que era antes do Real, mas ainda é instável quando comparado com os países desenvolvidos”, diz ele.

 

Segurança e planejamento:

Se a inflação não é um problema, o que realmente incomoda esses jovens são problemas sentidos por quase todos os brasileiros: a falta de segurança e as deficiências no planejamento público, expressas principalmente na falta de mobilidade urbana – tema principal dos protestos de rua em 2013. “A insegurança é tão perceptível que passa a ser algo natural, algo que está na minha cabeça a todo momento, e não deveria ser assim. Eu deveria poder sair à rua de boa, sem medo”, diz Marina. A mobilidade é outra grande questão. “O cidadão sai de casa e usa transporte público, precisa da saúde pública, da educação pública, e elas são ruins, então ele está todo dia sofrendo as consequências da falta de planejamento”, diz Passos Vicente. Soluções? “Eu acredito que o problema de saúde e educação não é falta de dinheiro, é falta de planejamento mesmo. É preciso mudar o sistema, melhorar a gestão, pois não adianta injetar dinheiro em algo que não funciona”, diz Orestes.

 

Carreira e oportunidades:

Sair da universidade e conseguir um bom emprego em uma empresa de primeira linha não é uma sequência automática. Ao contrário, as possibilidades de escolha são muitas. “Meu pai trabalha em banco, ele conseguiu um emprego e permaneceu a vida toda trabalhando para o mesmo empregador, mas eu não me vejo fazendo isso”, diz Marina. “Quero ficar cinco anos por aqui, depois mudar, ir trabalhar em outro país”, diz ela. Nem todos, porém, descartam uma carreira empresarial. “Eu me vejo trabalhando em empresa, quero trabalhar logo quando sair da faculdade, mas tenho medo de não conseguir”, diz Dallaverde. “Eu penso em seguir carreira acadêmica”, diz Mourad. “E eu quero trabalhar com políticas públicas e consultoria nessas áreas”, diz Passos Vicente. Já a vida profissional não promete ser fácil. “É uma competição absurda por bons cargos e salários”, diz Orestes. “Antes bastava falar inglês, hoje você tem de falar pelo menos dois idiomas para poder se candidatar”, diz Marina.

 

Estabilidade:

Mesmo com as dúvidas pertinentes a quem está começando a vida, os jovens contemporâneos do Plano Real têm uma certeza que faltou às gerações anteriores: a estabilidade veio para ficar. “Não penso que vá haver uma reviravolta, algo que mude tudo”, diz Mourad. “O crescimento da classe C aumentou a disputa por empregos, mas também ampliou a quantidade de consumidores, e isso cria mais oportunidades”, diz Orestes. “Isso não deve mudar tão já”, diz Passos Vicente.