Chegou a hora de virar a página, após um ano recheado de notícias econômicas desanimadoras. Pelo menos essa é a disposição do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, que, assim como os demais banqueiros, viu a rentabilidade do setor encolher em 2012. “Não podemos nos impressionar pelos últimos resultados”, afirma Trabuco. “As perspectivas para 2013 são muito mais auspiciosas.” O ano também não foi fácil para as famílias brasileiras, que lutaram para colocar suas contas em dia. Apesar dos juros menores, a cautela predominou no mercado, desacelerando o ritmo do crédito para o menor nível, desde 2003 (leia quadro ao final da reportagem). 

 

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Vai um dinheiro aí?: no centro de São Paulo, lojas oferecem crédito mais barato, uma tendência para 2013 

 

Passado o período de “arrumação da casa”, os bancos e os consumidores estão prontos para retomar os negócios, e, por tabela, impulsionar a economia. Acompanhar de perto o volume de crédito será a chave para antever se o Brasil terá fôlego para uma expansão de 4% no ano que vem, como deseja o governo. Embora o Planalto aposte num PIB puxado pelos investimentos, destravar os financiamentos é fundamental para turbinar a demanda dos consumidores. Um levantamento feito pelo banco Santander, a pedido da DINHEIRO, mostra que a aceleração do consumo nos últimos anos esteve sempre atrelada aos financiamentos. 

 

De 2004 a 2011, o crescimento médio real das concessões de empréstimos foi de 15%, o que resultou numa ampliação média real de 5,5% do consumo. Já a desaceleração do crédito neste ano, para um ritmo de 7%, ajuda a explicar a alta modesta do consumo de apenas 3%. “O problema é que o crescimento das concessões no ritmo de 15%, como o do passado, é insustentável”, diz Maurício Molan, economista-chefe do Santander. “É um patamar que aumenta demais o endividamento das famílias.” Um meio-termo, segundo Molan, parece ser o caminho mais provável e sustentável em 2013. Se a oferta de crédito crescer 10%, terá o poder de ampliar em 4% o consumo, nas previsões do Santander. Para tanto, não se pode descuidar dos devedores. 

 

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Corrêa, da Saint-Gobain: “A redução gradual da inadimplência traz o crédito

de volta. Esperamos uma alta de 8% das vendas na rede Telhanorte”

 

“Monitorar a inadimplência será o fator determinante”, afirma Amaury Bier, presidente da Gávea Investimentos. “Estamos colhendo os frutos negativos da chamada ‘safra 2010’, que foi um processo de concessão menos técnico do que deveria ter sido.” De fato, os dados do Banco Central mostram que o nível dos calotes subiu muito desde 2011, de 5,7% para 7,9%, por culpa das dívidas contraídas em 2010. Daqui para a frente, segundo os economistas, esse patamar deve cair gradativamente. Um setor em particular sentiu na pele essa alta da inadimplência e seus respectivos impactos no crédito. Trata-se do segmento de automóveis, que tem, em média, 60% de suas vendas financiadas. 

 

O estoque de crédito praticamente não cresceu neste ano, em consequência das concessões irresponsáveis de dois anos atrás. Na época, os motoristas compraram carros em até 96 prestações, sem entrada. “O mais prudente são os bancos exigirem 20% de sinal, pois é esse o percentual de desvalorização do carro no primeiro ano”, diz Wermeson França, economista da LCA Consultores. Para ele, o crescimento do estoque de crédito para veículos deve saltar dos minguados 3%, em 2012, para 12,5% no ano que vem. Com a torneira dos bancos um pouco mais aberta, as montadoras já esfregam as mãos e projetam o sétimo ano consecutivo de recorde nas vendas, em 2013, com quase quatro milhões de carros comercializados. 

 

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Mendes, da Localiza: ”Projetamos vendas de 72 mil carros semi-novos

em 2013, 18% a mais do que neste ano, com financiamento de 48 meses”

 

O segmento de seminovos, que também quer surfar essa onda, espera dias promissores. A Localiza, a maior locadora de automóveis do País, por exemplo, opera 73 lojas próprias de vendas de usados. Neste ano, a Localiza vendeu cerca de 61 mil carros e projeta outros 72 mil para 2013, uma alta de 18%. Desse total, ao menos 50% serão financiados. Para oferecer crédito aos seus clientes, a Localiza conta com uma parceria com o Banco Votorantim. O setor trabalha atualmente com prazo máximo de 48 meses, com 30% de entrada. “Os bancos perceberam que estavam se arriscando muito, e ficaram cautelosos na análise das fichas”, diz Roberto Mendes, diretor-financeiro da Localiza. 

 

Um estudo do Bradesco aponta que 17,4 milhões de brasileiros são potenciais compradores de carro popular no valor de até R$ 25 mil, com uma entrada de 20%. Restarão, portanto, R$ 20 mil, cujo financiamento dependerá do sinal verde dos bancos. Como a preferência é pelos bons pagadores, os inadimplentes correm para limpar o nome. “Nossas pesquisas mostram que mais de 50% da força de trabalho vai utilizar o 13º salário para quitar suas dívidas”, diz Dorival Dourado, presidente da Boa Vista Serviços. Outro setor que aguarda com muita expectativa a retomada do crédito é o de materiais de construção, que registrou um crescimento de apenas 1,5% neste ano. 

 

Embora esteja crescendo acima da média, em torno de 5%, a Telhanorte também sofreu com essa desaceleração do crédito, responsável por dois terços das vendas nas suas 37 lojas. “A inadimplência saltou de um patamar histórico de 5% a 6%, para 14,3%, em fevereiro deste ano”, diz Manoel Corrêa, diretor-geral da Saint-Gobain Distribuição Brasil, holding francesa que controla a Telhanorte. Desde então, a inadimplência vem caindo lentamente, e atualmente se encontra na casa dos 10%. “O cenário está melhorando”, diz Corrêa. “Com a volta do crédito e a aceleração do PIB, vamos crescer 8% no ano que vem.”

 

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Colaborou: Geovana Pagel