11/04/2014 - 21:00
A atitude formal do mineiro Pedro Coutinho, vice-presidente executivo de novos negócios do Banco Santander, não deixa transparecer o fato de que o administrador de empresas com pós-graduação em marketing é um cruzeirense apaixonado. Em sua ampla sala, na torre envidraçada que abriga a sede brasileira do banco espanhol, pende uma faixa comemorando o campeonato brasileiro conquistado pela equipe de Belo Horizonte em 2013. A faixa está pendurada em um telescópio, que ocupa seu escritório como um lembrete a Coutinho da importância de não perder o foco. Mas esse alerta é desnecessário, como demonstrou o negócio mais recente fechado pelo Santander.
Pedro Coutinho, vice-presidente executivo do Santander: “Deixamos de ser clientes
e nos tornamos controladores, o que nos permite prioridade para lançar os produtos que queremos”
“Passamos os últimos dois anos negociando a compra do controle da GetNet”, diz ele. Na segunda-feira 7, o banco anunciou a conclusão do negócio. Por R$ 1,1 bilhão, os espanhóis compraram 88,5% das ações da empresa de origem gaúcha, mais conhecida por cadastrar lojas para aceitarem pagamentos via cartão de crédito, atividade conhecida como adquirência. Há cerca de quatro anos, desde que vendeu sua participação na concorrente Cielo, o Santander fechou um acordo de exclusividade com a GetNet para cadastrar lojas. Agora, com a compra da companhia, o banco pretende ganhar musculatura e agilidade para acelerar sua participação em um mercado crescente.
Os investidores gostaram da notícia. Na terça-feira 8, as ações do banco fecharam com alta de 4,05% na bolsa, em um pregão no qual o Índice Bovespa registrou queda de 1%. Os profissionais também aplaudiram o movimento. Tito Labarta, analista de ações de bancos do Deutsche Bank, avaliou que a compra foi positiva. “Trabalhando juntos desde 2010, o Santander e a GetNet construíram a partir do zero um negócio que, em dezembro de 2013, respondia pela captura de 5,8% do mercado nacional de cartões”, escreveu Labarta. Segundo ele, a participação é mais expressiva nas pequenas e médias empresas, onde chega a 10%.
“A fatia de mercado é bem menor nas grandes redes de varejo”, avalia Labarta. Na teleconferência com os analistas, o Santander estimou que terá um lucro de R$ 95 milhões com a nova GetNet nos 12 meses posteriores à conclusão da operação. Aparentemente, não faz sentido desembolsar uma cifra bilionária para adquirir o controle de uma empresa na qual o comprador já era o principal cliente. No entanto, Coutinho avalia a transação como um dos passos mais importantes da estratégia do Santander por aqui. Atualmente, a parceria entre Santander e GetNet funciona por meio de uma joint venture em uma empresa de captura de transações eletrônicas, na qual as atividades são bem divididas.
Rômulo Dias, presidente da Cielo: colecionando bons resultados, e o mercado ainda espera mais
A GetNet cuida da tecnologia e o Santander faz a parte bancária, transferindo o dinheiro e, quando possível, ganhando os juros de antecipar o pagamento dos recebíveis para os comerciantes. Segundo um executivo com amplo conhecimento do mercado, a tarifa que a GetNet vinha cobrando do Santander estava muito elevada. Coutinho não comenta os números, mas, segundo Carlos Daltozo, analista da BB Investimentos, o percentual elevado limitou o crescimento do Santander junto às maiores redes de varejo, que costumam pagar menos pelo uso das maquininhas. Olhando apenas os números do balanço, o negócio faz sentido.
A aposta do banco lembra o movimento do Itaú, que gastou, em 2012, R$ 10 bilhões para fechar o capital de sua subsidiária Redecard, transformando-a na atual Rede, exatamente para capturar todos os ganhos com as transações. “Os pagamentos eletrônicos são a maneira mais rápida e eficaz que um banco possui para crescer em mercados de massa”, diz Celso Sato, fundador da companhia paulista independente de pagamentos Accesstage. Não por acaso, a única empresa de pagamentos ainda listada em bolsa, a Cielo, que tem Bradesco e Banco do Brasil como controladores, vem enchendo os olhos e os bolsos de seus acionistas.
As ações da companhia presidida pelo executivo paulista Rômulo Dias subiram, em média, 45% ao ano em 2011, 2012 e 2013. Até abril de 2014, a alta supera 14%, mesmo com os resultados ruins para a bolsa. Para os analistas, apesar de tantas altas, o papel ainda aparece como uma boa alternativa. “As ações estão sendo negociadas perto dos máximos históricos, mas, mesmo assim, ainda são uma boa opção defensiva”, escreveu Victor Schabbel, do Credit Suisse, em um relatório da terça-feira 8. No entanto, segundo Coutinho, a compra da GetNet vai muito além de dividendos e da rede de POS, as maquininhas que processam as transações.
Celso Sato, da Accesstage: “Os pagamentos eletrônicos são a maneira
mais eficaz que um banco tem para crescer em mercados de massa.”
Ao adquirir uma empresa que possui 440 mil estabelecimentos cadastrados e emprega 1.500 profissionais especializados, o Santander ganha musculatura e agilidade, além de trazer para dentro de casa produtos que, sem a aquisição, seria demorado e caro para desenvolver. “Deixamos de ser um cliente, que tem de entrar na fila dos desenvolvedores, e nos tornamos controladores, o que nos permite ter prioridade para lançar os produtos que queremos”, diz ele. Um bom exemplo, lembra Coutinho, foi a parceria com a empresa sueca Izettle, que desenvolveu um leitor de cartões que pode ser conectado a um smartphone.
Com ele, é possível a um profissional receber pagamentos eletrônicos sem ter de arcar com os custos do POS. Uma solução desse tipo amplia significativamente o número dos clientes em potencial, que não têm condições de pagar por uma maquininha, como médicos e dentistas. Se tivesse o controle da GetNet, o Santander já poderia ter desenvolvido esse sistema dentro de casa, mais depressa, sob medida e sem ter o trabalho de costurar uma parceria internacional. “Vamos levar o contrato com a Izettle para a GetNet”, diz Coutinho.
Nas próximas semanas, o banco deverá anunciar dois novos produtos, sobre os quais Coutinho, mineiramente, esconde os detalhes. “Serão lançamentos muito alinhados com a estratégia do banco”, limita-se a dizer. No curto prazo, serão reforçados o carregamento de celulares pré-pagos e o de correspondentes bancários. Além disso, a aquisição permitirá ao Santander ter muito mais informações sobre os hábitos de pagamento e as necessidades de capital de seus clientes, podendo crescer na concessão de créditos sob medida – uma ajuda muito necessária para um banco que vem emprestando menos do que poderia em comparação com seus concorrentes privados.