A nova sede da multinacional Siemens, inaugurada em agosto na cidade de Munique, na Alemanha, é a metáfora perfeita da mudança da empresa nos últimos tempos. Com boa parte das paredes internas e externas envidraçadas, quem passa pela rua consegue enxergar tudo o que ocorre dentro das salas de cada funcionário. Quem está no elevador também tem uma visão panorâmica de todo o edifício. Nada, nem ninguém, fica escondido. Essa transparência não é apenas um trabalho de arquitetura, mas reflete um estilo de gestão que tem sido incorporado ao dia-a-dia da companhia.

A Siemens, que faturou € 75,6 bilhões no ano passado e que fabrica desde máquinas e autopeças até turbinas eólicas, foi um dos pivôs dos escândalos de corrupção do cartel do Metrô em São Paulo, revelados em 2013. Fora do País, a empresa também enfrentou acusações e, nos últimos sete anos, desembolsou mais de US$ 1,5 bilhão em multas e acordos judiciais ao redor do mundo. Agora, a companhia trabalha para ser lembrada mais pela inovação do que pelos desvios de conduta. “A Siemens não tem tolerância com a corrupção e violações dos princípios de competição justa”, afirmou à DINHEIRO o CEO global, Joe Kaeser. “E quando acontece, tomamos medidas rápidas.”

O plano de restauração da Siemens passa por três frentes de trabalho: aquisição de empresas e startups, investimento em pesquisas e desenvolvimento, além do aprimoramento de todos seus processos de compliance em suas subsidiárias. Como exemplo dessa nova postura, até mesmo a prestação de contas de almoços de negócios são analisados de forma criteriosa, assim como todos os contratos assinados pela companhia. As turbulências enfrentadas pelas Siemens nos últimos anos são atribuídas também a problemas de gestão.

Não à toa, uma das missões da Kaeser ao assumir a empresa, em julho de 2013, era pacificar as relações internas e turbinar os resultados com mais investimento em pesquisa e desenvolvimento, que passou a ter o orçamento ampliado em 25% ao ano. Para 2017, a expectativa é que sejam injetados € 5 bilhões na área, em segmentos como automação, energia e digitalização. Além disso, diversas aquisições estão sendo feitas com foco na área de softwares. A mais recente, ocorrida em novembro, foi a compra da americana Mentor Graphics por US$ 4,5 bilhões. “Para ser bem sucedido no longo prazo, você tem que ser capaz de lidar com a evolução dos mercados”, diz Kaeser.

Por conta dessa visão de adaptação, a empresa vem procurando se aproximar de startups. O principal movimento dessa estratégia pode ser acompanhado na criação da Next47, que ocorreu neste ano. Trata-se de uma espécie de fundo de investimentos que, mais do que colocar dinheiro em startups e para lucrar lá na frente, buscará estruturar as empresas iniciantes para trazer retornos também para a Siemens. Não por acaso, o aporte € 1 bilhão nos próximos cinco anos será destinado às pequenas companhias que trabalham no escopo da multinacional alemã.

Para tocar o projeto, foi recrutado o indiano Lak Ananth, com experiência de 20 anos em empresas do Vale do Silício, nos EUA, como a Hewlett Packard (HP) e Atos. Segundo Ananth, a criação de um novo negócio serve para “tornar a Siemens menor aos olhos dos empreendedores”, ou seja, uma empresa com tomadas de decisão mais ágeis em comparação às grandes corporações. “Queremos ser um elo global da Siemens com startups”, diz ele.

O primeiro trabalho em andamento da Next47 é a construção de um motor híbrido, movido a energia elétrica e a combustão, para aviões, que está sendo realizada em parceria com a francesa Airbus. A meta é que até 2030 estejam nos ares máquinas com capacidade de transportar até 100 passageiros. Os investidores parecem estar gostando do rumo da Siemens. As ações da empresa subiram 38,5% com Kaeser. No ranking das marcas mais valiosas do mundo, realizado pela Kantar Millward Brown, está na 20ª posição. Até no Brasil, com a mancha causada pelo escândalo, a empresa tem se recuperado, de acordo com especialistas.

Para Eduardo Tomiya, diretor geral da Kantar Vermeer, diante dos escândalos das operações Lava Jato e Zelotes, a Siemens, por ter assumido a culpa antes das investigações, sofreu menos desgaste do que outras companhias envolvidas. “O impacto foi forte no curto prazo, porém é mais simples chegar a uma resolução”, afirma Tomiya. Responsável pela operação brasileira, Paulo Stark afirmou que o mais difícil de todo o processo foi lidar com a comunicação para a sociedade. “Até todos entenderem que fizemos isso pelo nosso compromisso com o compliance, demorou”, diz Stark. “Agora deixamos claro que se alguém pisar fora da faixa, será investigado e punido.”

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Saiba o que a bilionária multinacional está fazendo para deixar os tempos ruins no passado

• Criação da Next47, empresa que terá € 1 bilhão para investir em startups
• Aquisição de empresas voltadas a digitalização de processos
• Aumento do investimento em pesquisa e desenvolvimento. Em 2017, serão € 5 bilhões
• Setor de compliance com mais força e penas mais duras contra desvios de funcionários

Fonte: Empresa