18/07/2014 - 20:00
A advogada chinesa Yan Lan pode ser considerada uma exceção em seu país. Enquanto a maioria das mulheres só tinha a opção de trabalhar nas fábricas, no campo ou no Exército durante o governo de Mao Tsé-Tung, ela fez as malas para estudar na Europa e, apenas em 2011, voltou à China, recrutada pela firma de assessoria financeira Lazard, que tem US$ 187 bilhões sob gestão. De lá para cá, o cenário econômico mudou. “Altos e baixos são comuns em todas as economias, o importante é que ainda existem oportunidades”, disse Yan.
Qual o interesse da Lazard no Brasil?
O Brasil é o maior parceiro comercial da China entre os países da América Latina, e esses laços vão se estreitar cada vez mais, porque os dois países têm necessidades que se complementam. Vim para cá ajudar a estabelecer uma ponte entre companhias brasileiras e chinesas.
Quais são essas necessidades?
A China é um dos maiores clientes do agronegócio brasileiro, e essa demanda só tende a crescer, pois, além do aumento da população, as pessoas estão comendo mais e melhor. Ao mesmo tempo, o Brasil está desenvolvendo sua infraestrutura, o que interessa bastante às companhias chinesas.
Que setores da infraestrutura mais atraem os empresários chineses?
As fusões e aquisições no setor de energia estão no topo da lista. Nos últimos oito anos, quatro das cinco maiores transações entre empresas dos dois países foram desse setor. Também há interesse nos setores de petróleo e de recursos naturais. Diversos bancos chineses estão vindo para o País, seguindo seus clientes corporativos que começam a trabalhar aqui. Já as companhias brasileiras estão comprando companhias chinesas na área de materiais e autopeças.
A desaceleração do crescimento do PIB brasileiro atrapalha?
Não. Na China faltam recursos naturais e os chineses precisam importar. Estão interessados em comprar energia e levar para a China. O mesmo acontece com o setor de agronegócio, como soja e carne.
A sra. acha que esse cenário de crescimento mais baixo pode mudar?
Acho que sempre vamos ver altos e baixos nos mercados, mas não é isso que deve guiar as decisões de investimentos. Afinal, o potencial está lá. Vejo que o Brasil e a China vão encontrar uma saída para o momento econômico.
Como a sra. vê o interesse dos brasileiros em ir para a China?
Em geral, investimento na China significa uma vantagem competitiva. Grupos internacionais – inclusive brasileiros – estão de olho no mercado consumidor.
Qual era seu objetivo quando a sra. assumiu o cargo na Lazard?
Minha tarefa era montar uma equipe e fazer networking com os clientes, além de promover o nome da Lazard na China. É muito trabalho, pois o banco leva muito em consideração os países emergentes. Em 2011, quando entrei na empresa, as companhias chinesas estavam começando a expandir sua atuação.
Quais as principais diferenças entre seu trabalho como advogada e como executiva da Lazard?
Como advogada, eu ajudava as partes a chegarem a um acordo e a assinarem o contrato. No banco de investimentos, tenho de ir além, conversar com as pessoas, montar projetos e ver se existe sinergia entre os parceiros. Ao mesmo tempo em que existe muita pressão, tenho muitas oportunidades.
O mercado financeiro é associado a homens e a sra. está à frente de um nome importante desse setor. Como isso é visto na China?
Pelo menos em Hong Kong, o mercado financeiro tem muitas mulheres. Isso é importante porque elas se tornam inspiração para outras mulheres. Na Lazard, metade dos executivos são mulheres, assim como três dos cinco sócios-diretores. Isso mostra que, se a mulher tem ambição, ela consegue chegar ao topo.
Isso é uma realidade para a nova geração, não? Como a sra. equilibra seu tempo como mãe e executiva?
Minha geração viveu a Revolução Cultural; foram dez anos perdidos. As mulheres tinham de trabalhar nas fábricas, no campo ou no Exército. A universidade era o nosso sonho e eu fui uma das poucas sortudas a ir para o exterior estudar. Atualmente, as mulheres que vivem nas cidades têm maior acesso à educação e mais liberdade de escolha. Já equilibrar o tempo é um desafio. Por isso, é importante encontrar um companheiro que compartilhe as tarefas, e isso tem sido mais aceito e comum na China.