Em Atenas, a crise não dá trégua. Enquanto as ruas são ocupadas por grevistas e manifestantes que enfrentam as bombas de gás lacrimogêneo da polícia, a cada dia mais lojas e escritórios fecham as portas. Na capital, os efeitos do desemprego, que já supera 25% da população economicamente ativa, são claros. Não é difícil ver mendigos e desocupados fazendo hora nas praças. Enquanto as negociações prosseguiam entre o governo da Grécia e o Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre novas medidas de austeridade para liberar mais recursos para o país, um escândalo político estourou no final de outubro. Uma revista divulgou nomes de altos funcionários do governo e empresários gregos que têm contas bancárias na Suíça e provavelmente sonegaram impostos. 

 

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Dois momentos: manifestantes (à esq.) protestam em frente ao Parlamento grego.

Em um dia normal, vendedor de rua tenta atrair a atenção de turistas

 

A lista revolta a população, principalmente porque foi recebida pelo governo grego há pelo menos três anos e nunca foi investigada pelas autoridades. Em meio ao cenário deprimente, um pequeno grupo de empresários consegue manter empregos e o otimismo. O inchado governo grego terá de cortar muitos postos de trabalho, mas alguns empreendedores acreditam que terão capacidade para contratar. As empresas exportadoras ou ligadas ao turismo estão entre as poucas que conseguem crescer na Grécia. O turismo representa 15% da economia e a indústria, 18%. O setor naval também tem ajudado a evitar uma deterioração maior das contas externas. Apesar de um alto déficit na balança comercial, o grande volume de divisas trazidas pelo turismo reduz o saldo negativo da conta corrente grega a cerca de US$ 10 bilhões anuais. 

 

O presidente da Federação da Indústria de Alimentos da Grécia, Evaggelos Kalousis, acredita que as exportações de alimentos podem ajudar o país a se recuperar da crise. “Crescemos no último ano mais de 20%”, afirma Kalousis. As exportações de alimentos ainda são de produtos de baixo valor agregado, e a criação de uma cultura exportadora, pouco comum no país, poderia elevar as receitas externas num momento tão difícil quanto o atual. Um exemplo é o que ocorre com o azeite de oliva, um dos principais itens da pauta de exportação do país. Apesar de produzir um azeite de alta qualidade, a Grécia nunca se preocupou em lançar marcas nos grandes mercados mundiais ou investir seriamente em marketing. 

 

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Kalfas: empresário tem uma companhia de comércio exterior e acredita

que há muito exagero na gravidade da crise

 

A maior parte da produção é vendida em grandes volumes, como uma commodity, para os produtores italianos. O azeite grego é misturado ao óleo de outras procedências e envasado na Itália, que por sua vez o exporta para mercados que pagam preços mais altos, como os países do norte da Europa e os Estados Unidos. Na Grécia, a produção de azeite concentra-se na ilha de Creta, uma das maiores do Mediterrâneo, que reúne um terço do total de oliveiras do país. Pergunte a qualquer grego e todos dirão que a crise está concentrada na capital, Atenas, e não nos milhares de ilhas, para onde vão os turistas durante o verão. Em Creta, além do turismo, a produção de azeite contribui para reduzir a sensação de crise. 

 

O joalheiro Dimitris Paslis, que tem uma lojinha no centro histórico de Chania, em Creta, está feliz por ter deixado Atenas há quase uma década. A situação nas ilhas é muito melhor, afirma. “Meus amigos que ficaram em Atenas estão desempregados e sofrendo muito mais com a crise”, diz Paslis. Percebendo que a única solução para crescer no momento atual é exportar, as empresas estão buscando uma remuneração maior para seus produtos e tentando entrar diretamente nos maiores mercados. É o caso da Terra Creta, um dos maiores produtores de azeite de Creta, que deve crescer 30% neste ano e produzir dois milhões de toneladas de azeite de alta qualidade. Praticamente toda a produção é exportada.O gerente de exportações da Terra Creta, Fotis Sousalis, está animado com o desempenho nos mercados emergentes. 

 

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Karpadakis: a produtora de azeite de oliva Terra Creta

vai crescer 30% neste ano. Quase toda a produção é exportada

 

“Temos grande crescimento na China e na Rússia, onde já operamos há algum tempo, e no Brasil estamos obtendo bons resultados.” A Terra Creta começou a vender o produto no País neste ano. A empresa também está promovendo diferentes lançamentos para se adaptar ao gosto de cada mercado. “No Brasil, lançamos uma embalagem de azeite com azeitonas inteiras”, diz Emannouil Karpadakis, gerente de marketing da Terra Creta. Mesmo no setor de serviços, onde o cenário é desolador, principalmente por conta da crise dos bancos, há quem esteja se dando bem nos negócios. O chef grego Asterios Lampos, 45 anos, voltou ao país natal depois de um período de mais de 25 anos na Áustria, durante o qual construiu uma carreira de sucesso no ramo de restaurantes. Preocupado com a saúde do país, vendeu a rede de 12 restaurantes que possuía na Áustria e desembarcou na Grécia em meio à crise. 

 

O Tavernaki, pequeno restaurante que abriu em Thassos, está indo bem: neste verão, sua clientela cresceu 20%. E não é composta apenas de turistas. “Muitos gregos sem dinheiro para uma viagem de férias pelas ilhas acabam gastando mais num jantar fora de casa”, diz Lampos. O grego-brasileiro Apostolos Kalfas, proprietário de empresas no Brasil e dono da companhia de comércio exterior Tropical Brasil, em Thessaloniki, também acredita que a exportação possa ser uma saída para a crise. Kalfas decidiu deixar o Brasil por medo da violência, há alguns anos, e brinca que, para quem enfrentou tanta crise nas décadas de alta inflação, não parece tão difícil sair do buraco. “É preciso criatividade, mas a Grécia tem condições de elevar muito os volumes de exportação.” Com o olhar brasileiro, Kalfas acredita que há um certo exagero sobre a gravidade da crise. 

 

“Claro, o país está em recessão, mas você não vê miséria.” Alguns exemplos mostram que, com investimentos na competitividade, as empresas gregas conseguem superar o ambiente econômico hostil — especialmente se estiverem vinculadas ao comércio exterior. Um deles é o forte crescimento do volume de embarques num setor do porto de Pireus, que foi privatizado e adquirido pela estatal chinesa Cosco. A carga transportada pela área privada triplicou nos últimos anos. A administração chinesa investiu na modernização do porto e cortou radicalmente o excesso de mão de obra, aumentando a produtividade. Apesar de utilizar menos mão de obra por unidade de carga, a área privada do porto já emprega mais funcionários do que a parcela que continuou estatal.

 

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Enviado especial a Atenas