Uma única e solitária vaca, morta em dezembro de 2010, no Paraná, ameaça gerar sérios prejuízos para os principais frigoríficos brasileiros. O animal, de 13 anos, morreu subitamente, sem que seus proprietários ou as autoridades sanitárias pudessem identificar a causa. O episódio ficou esquecido até 6 de dezembro, quando o Ministério da Agricultura recebeu da Inglaterra um laudo que, embora não explicasse o mal súbito, trazia uma informação relevante. A fêmea bovina carregava consigo o agente causador da encefalopatia espongiforme bovina, doença mais conhecida como o mal da vaca louca – a mundialmente famosa “mad cow”, em inglês. 

 

85.jpg

 

O bode que deu, como diz o célebre “Samba do Crioulo Doido”, de Stanislaw Ponte Preta, eu vou te contar. A reação começou menos de uma semana depois, com a decisão de países como África do Sul, China, Irã e Japão de suspender a compra de carne do Brasil. Na terça-feira 11, a Rússia, o maior importador do País, ameaçou fazer o mesmo, o que afetou as ações dos frigoríficos brasileiros. Nesse dia, os papéis do JBS tiveram queda de 2,7%, os da Marfrig, 5,3%, e os do Minerva, 4,5%. Nos pregões seguintes, JBS e Marfrig se recuperaram, mas o Minerva perdeu 8,5% de seu valor até quinta-feira 13. A Abiec, que representa a indústria exportadora de carnes, informou, em nota, que esses mercados representam apenas 1,5% da exportação brasileira. 

 

Esse episódio, no entanto, pode ser utilizado como munição nas negociações internacionais pelos parceiros comerciais brasileiros. Segundo os analistas do banco britânico Barclays Gabriel Vaz de Lima e Rodrigo Coelho, alguns dos países que ameaçam barrar as importações do Brasil, especialmente a Rússia e o Irã, são altamente dependentes da carne brasileira. “A expectativa é de que eles usem essas notícias para criar uma oportunidade de renegociar os preços”, afirmam os analistas em relatório. O Brasil é o segundo maior exportador de carne bovina do mundo, atrás apenas da Austrália. Para Alex Lopes, analista de mercado da consultoria paulista Scot, especializada em pecuária, há pressão também por parte dos maiores competidores brasileiros. 

 

86.jpg

 

 

“Países como EUA, Argentina e Austrália tentam fazer o Brasil reduzir o ritmo de suas vendas”, afirma. No pior cenário, as exportações brasileiras devem cair 30%, entre dezembro e janeiro, e o preço da carne pode ficar 10% menor, segundo o Barclays. As empresas, por sua vez, correm o risco de sofrer com uma redução na geração de caixa, em 2013, que pode chegar a 8%, no caso da Minerva, 4% no caso da JBS e 3% no caso da Marfrig, segundo estimativas do Barclays. Numa ação para tentar evitar que episódio se alastre, o Ministério da Agricultura está enviando missões oficiais para os principais países importadores. 

 

“Em breve, as negociações serão normalizadas”, afirmou o secretário de Defesa Agropecuária, Ênio Marques. Mas o fato é que a situação já poderia ter sido contornada caso o Ministério tivesse cumprido a promessa que fez à Organização Mundial da Saúde Animal, logo após o surto da doença da vaca louca na Europa, em 2000. É que na década de 1990 o Brasil importou uma grande quantidade de gado europeu, como os da raça angus. O órgão de saúde mundial pediu que fosse feito um levantamento desses animais e seus descendentes. Só que o resultado desse trabalho nunca foi entregue. Por conta disso, a classificação de risco do País em relação à doença, apesar de baixa, não é absolutamente zero. Se fosse, esse episódio não teria dado bode nenhum.

 

87.jpg