Basta colocar os dados mensais de produção num gráfico, como o da página ao lado, para perceber que há algo de errado com a indústria brasileira. Desde agosto do ano passado, o setor produtivo vive numa gangorra sem fim, cujo resultado final é a estagnação. Neste início de ano, esse quadro ficou ainda mais evidente com a alta de 2,6% de janeiro e a queda de 2,5% de fevereiro. “A indústria não sai do lugar há sete meses”, diz Júlio Sérgio Gomes de Almeida, consultor econômico do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O instituto, que reúne as maiores empresas do País, projeta uma alta de 2,5% a 3% neste ano. Se confirmado, o resultado apenas anulará a queda de 2,7% de 2012. 

 

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Altos e baixos: o setor industrial está com dificuldade de engatar um crescimento sustentado

 

Sem ações capazes de estimular a competitividade da indústria no curto prazo, o governo federal vem lançando mão de “puxadinhos” que apenas aliviam temporariamente o sofrimento do setor produtivo. O último deles foi o cancelamento da elevação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre veículos, prevista para abril. O Ministério da Fazenda cedeu aos apelos das montadoras, que temiam não cumprir a meta de crescimento de 3,5% a 4,5% neste ano – no primeiro trimestre, a expansão foi de apenas 1,5%. Com a credencial de representar quase 25% de todo o setor industrial, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) defende com unhas e dentes a ajuda estatal. 

 

“A carga tributária brasileira no setor automotivo é uma das maiores do mundo”, diz Cledorvino Belini, presidente da Anfavea, à DINHEIRO, ao ser questionado sobre por que a indústria não consegue prosperar sem a ajuda do governo. “Isso já responde à questão.” O sucesso da Anfavea em seu pleito gerou alvoroço em outras entidades, como a de eletroeletrônicos e a de móveis, que também vão solicitar a extensão do benefício. A linha branca, que cresceu 15% no ano passado, já prevê uma expansão mais tímida neste ano, de 3% a 5%. “Ainda que não consigamos crescer em relação ao ano passado, não será um desastre, pois a base de comparação é muito alta”, diz Armando Valle, vice-presidente de relações institucionais da Whirlpool, dona das marcas Brastemp, Consul e KitchenAid. 

 

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Valle, da Whirlpool: expansão menor neste ano levará o setor eletroeletrônico a pleitear

a manutenção do IPI reduzido a partir de junho

 

O setor trabalha com a expectativa de que o aumento do IPI não ocorra mais em junho. Na avaliação de Gomes de Almeida, que foi secretário de política econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula, será mais um erro do Planalto. “O IPI é um instrumento muito eficaz em momentos de grave retração”, diz o economista. “Se você usa todo dia, perde o impacto.” Além da redução da carga tributária, as soluções definitivas para resgatar a competitividade à indústria, na opinião de muitos empresários, passam pela melhora da infraestrutura e pela desvalorização do câmbio. Da parte do governo, várias medidas foram tomadas, mas muitas ainda estão em processo de maturação, como a queda dos juros e as concessões na área de transportes. 

 

Por outro lado, a redução no preço da energia e a desoneração da folha de pagamentos estão gerando um alívio no caixa das empresas, o que possibilita a ampliação dos investimentos. Há, no entanto, nas entidades empresariais, um intenso debate sobre se o excesso de medidas pontuais da Fazenda, ainda que bem intencionadas, não estaria causando muitos ruídos e assustando os investidores. Gomes de Almeida acha que sim, pois “o governo mexeu em muitas coisas ao mesmo tempo”. Valle, da Whirlpool, discorda. “Nosso planejamento é de longo prazo e, por isso, estamos ampliando a nossa fábrica de Joinville”, afirma. A questão é saber quantas indústrias se atrevem a seguir esse exemplo para, finalmente, tirar o setor produtivo desse sobe e desce sem fim. 

 

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