20/12/2013 - 21:00
O programa de governo que permitiu à socialista Michelle Bachelet retornar à Presidência do Chile, a partir do dia 11 de março de 2014, é composto por alguns itens polêmicos. Um deles é a oferta de ensino universitário gratuito, que demandará uma elevação da carga tributária do País. Os empresários, é claro, já estão torcendo o nariz para a consequência. A seu favor, no entanto, Bachelet tem um enorme capital político: foi eleita com 62,6% dos votos no dia 15 de dezembro, quando massacrou a rival conservadora Evelyn Matthei na sucessão de Sebastián Piñera, e retomou o poder das mãos da centro-direita.
Michelle Bachelet, ao ressaltar a importância das empresas
privadas no Chile: “necessitamos de um setor privado dinâmico que permita
que nossa economia siga se desenvolvendo”
Há dúvidas sobre o efeito que o aumento da carga tributária, de cinco pontos percentuais em quatro anos, poderá ter sobre a competitividade do País e na atração de investimentos. Bachelet recorre ao seu primeiro mandato (2006-2010), marcado pela responsabilidade fiscal e pelo equilíbrio macroeconômico, para tranquilizar o mercado. “Assim como necessitamos de um Estado forte, eficiente e efetivo, também necessitamos de um setor privado dinâmico e ativo que permita que nossa economia siga se desenvolvendo”, disse ela, na terça-feira 17. A tentativa de reduzir o receio do empresariado tem a sua razão de ser.
A economia chilena é considerada a mais aberta da América Latina, com elevada atração de investimentos estrangeiros – em 2012 chegaram a 11,3% do PIB. Perder uma parte disso pode tornar mais difícil alcançar as metas divulgadas em campanha. Mas, apesar das incertezas corriqueiras em mudanças de gestão, o que especialistas enxergam pela frente são apenas ajustes pontuais. O economista Ernesto Lozardo, da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, lembra que o Chile é menos afetado pelo nebuloso cenário econômico internacional por possuir custos de produção menores que os de outros países da região.
Essa vantagem não deve ser perdida mesmo com o aumento da carga tributária, que está em 20,8%, ante 35% do Brasil. A priorização do social a partir do ano que vem é vista com cautela, mas não como uma ameaça. “Oferecer educação gratuita é uma proposta popularmente interessante, mas há um certo risco fiscal”, diz Lozardo. “Mas, mesmo que o Chile cresça menos em 2014, ainda tem poupança.” A Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) prevê uma alta do PIB de 4,2% para este ano e de 4% para o ano que vem. Apesar de mais baixo do que em anos anteriores, o crescimento chileno, associado à estabilidade política e a regras definidas, é atraente para os investidores.
“O Chile tem tradição de 40 anos com economia estruturada e é o País da região que mais cedo abriu a sua economia”, diz Sherban Leonardo Cretoiu, coordenador do Núcleo de Negócios Internacionais da Fundação Dom Cabral, que descarta uma mudança de política econômica que possa afastar investidores. E é justamente essa estabilidade das regras, aliada à estrutura econômica mais moderna, que tem atraído empresas brasileiras a fazer negócios com o Chile. O Itaú Unibanco tenta aumentar a sua presença por lá e já fez uma oferta pelo Corpbanca.
O presidente do Itaú BBA, braço de investimentos da instituição financeira, Candido Bracher, afirmou na semana passada que está confiante. “Estamos negociando este banco e temos uma confiança grande em comprar”, disse Bracher. Empresas de outros setores também querem ampliar as relações comerciais com o Chile. É o caso da fabricante brasileira de caminhões Marcopolo, que tem no país um de seus principais mercados. O Chile é também o país da América do Sul que mais investe no Brasil. Neste ano, até novembro, foram US$ 2,79 bilhões. Resta agora saber se Bachelet terá pulso firme para implementar suas reformas e manter aquecidas essas relações.