Na sala de jantar da casa amarela em que o publicitário baiano Nizan Guanaes vive, em São Paulo, e que pertenceu ao magnata da mídia Assis Chateaubriand, há um grande quadro do artista plástico Vik Muniz. A obra, incomum em relação ao estilo mais conhecido do escultor e fotógrafo de juntar peças das mais diversas origens para formar uma imagem, mostra um belo panorama do Rio São Francisco, do qual uma capivara se aproxima. “Essa imagem é da região onde o meu pai nasceu”, contou Nizan, no ano passado, à DINHEIRO.

O empresário é um homem que faz questão de, em suas conversas, se lembrar de suas origens. Mas é cada vez mais um homem do mundo. Uma tese que foi reforçada, na segunda-feira 23 de novembro, quando a holding americana Omnicom, a terceira maior do setor de publicidade do planeta, com um faturamento de US$ 15,3 bilhões, anunciou a compra do grupo ABC por meio da rede DDB Worlwide. O valor da transação envolvendo o conglomerado brasileiro, fundado por Guanaes e Guga Valente em 2002, deve ficar em torno do R$ 1 bilhão.

O plano original era a abertura de capital. Os sócios do ABC nunca esconderam que a estratégia para a holding de agências de publicidade e marketing era ter as suas ações negociadas no mercado brasileiro de capitais. O aporte seria necessário para financiar os investimentos que garantiriam que o grupo continuasse sendo o mais importante do setor no Brasil, num momento em que o mercado de mídia passa por transformações fundamentais com o impacto da internet.

Além disso, a transação poderia remunerar os fundos de investimentos que faziam parte da estrutura acionária do ABC: o Icatu, que detinha 23% das ações, e o Kinea, controlado pelo Itaú e que fez aporte de R$ 170 milhões, em 2013, em troca de 26% de participação. Mas, como a Bovespa permanece desde o início desta década pouco atraente para IPOs e a conjuntura não traz boas perspectivas a médio prazo, a solução foi ceder aos avanços dos grandes conglomerados internacionais de comunicação.

“Quando o jogo muda, você precisa mudar o seu próprio jogo”, afirmou Guanaes, ao comentar o negócio na publicação americana AdAge, especializada em propaganda e marketing. “Essa é uma solução fantástica. A Omnicom é gigante, e esse é um mundo de gigantes. Manteremos o ABC, mas com o apoio de um gigante”. O valor da negociação chama atenção, afinal, o grupo brasileiro foi criado há apenas 13 anos, com um aporte inicial de apenas US$ 1 milhão por parte do Icatu. Nos últimos anos, as maiores holdings globais namoravam as empresas de Guanaes.

Afinal, o ABC fatura mais de US$ 400 milhões, compreende 15 empresas e 30 escritórios no Brasil, incluindo três das 20 maiores agências do País: a África, a DM9 e a Loducca. E atende clientes como P&G, Johnson & Johnson, Itaú Unibanco e Vivo. A DINHEIRO apurou que três grupos tentaram comprar o ABC, incluindo o britânico WPP, o maior do mundo. E a proposta da Omnicom, que começou a ser negociada há oito meses, não foi a maior delas. Pesou em favor dos americanos a proximidade com Guanaes e Valente.

Trata-se de uma relação antiga, construída há 18 anos, quando a DDB adquiriu uma participação na DM9. Os brasileiros sentiram que poderiam manter a liberdade operacional e criativa nos negócios. Valente também possui um bom relacionamento pessoal com John Wren, o CEO da Omnicom. É previsto por contrato que a dupla fundadora do ABC permaneça no comando das empresas no Brasil por, pelo menos, cinco anos.

De fato, é pouco provável que Guanaes se afaste dos negócios tão cedo. “Acho que o Nizan terá um papel preponderante na Omnicom, por seu perfil e reconhecimento internacional”, diz Mauricio Magalhães, sócio da agência de marketing Tudo, que faz parte do ABC. “Abre-se um novo mundo para o grupo. Em especial, para as suas agências com uma cabeça mais internacional.” O primeiro impacto do negócio aconteceu já na semana passada, quando uma agência do ABC foi incluída em uma concorrência global de um grande anunciante não revelado, informou uma outra fonte próxima do grupo.