24/03/2016 - 19:00
Há duas maneiras de encarar o resultado anunciado pela Petrobras na noite da segunda-feira 21, logo após o fechamento do mercado. É possível olhar o prejuízo de R$ 34,8 bilhões, o pior resultado da história da companhia, como um prenúncio do apocalipse. Foi a segunda maior perda de uma empresa brasileira, inferior só aos R$ 44 bilhões perdidos pela Vale em 2015. No caso da Petrobras, as perdas 61,4% maiores que as de 2014 são um sinal de que as políticas incorretas de preço e a desenfreada corrupção da qual foi vítima nos últimos dez anos custaram caro àquela que já foi a maior empresa brasileira em valor de mercado, faturamento e lucro. “Após décadas de relativa independência, o aparelho estatal finalmente escolheu-a como alvo, dilapidando suas finanças principalmente pela manutenção de preços baixos visando o controle da inflação”, escreveu o analista Lenon Borges, da corretora Ativa.
Essa é uma das maneiras de ver o quadro. No entanto, também é possível observar que o crescimento de 22,6% no lucro operacional, apesar de a empresa ter faturado 5% menos devido à retração no mercado interno (veja quadro), é uma indicação de que a Petrobras começou a enfrentar algo mais profundo que as jazidas do pré-sal: o poço de problemas criados por anos de decisões políticas e corrupção. Os investidores preferiram olhar um copo meio cheio. Na terça-feira 22, primeiro pregão após a divulgação das perdas, as ações PN fecharam com uma leve alta de 0,6% em relação à véspera.
Aldemir Bendine, o presidente da estatal, frisou esse ponto ao anunciar os resultados. “O contexto de 2015 foi extremamente difícil, principalmente pela necessidade de cortar custos e gerar caixa para fazer frente ao endividamento”, disse ele. “Conseguimos reduzir nossa dívida de US$ 106 bilhões no fim de 2014 para US$ 100 bilhões em 2015.” Esse resultado dependeu de uma redução de R$ 16 bilhões nos investimentos previstos pela empresa e pela venda de ativos, como as atividades da Petrobras na Argentina. O único ponto favorável, frisou Bendine, foi a queda de 50% nos preços do petróleo do tipo Brent, que é a referência de preços no mercado internacional. O Brent encerrou 2014 cotado a US$ 100 e recuou até cerca de US$ 29 no início de 2016, reduzindo os gastos da Petrobras com importação e melhorando suas margens no mercado interno, pois os preços na bomba de gasolina não recuaram. Por isso, mesmo vendendo 4,6% menos, a empresa teve um resultado operacional 22,6% maior.
Bendine também frisou que boa parte do prejuízo foi apenas contábil. Como ocorreu no balanço de 2014, a Petrobras teve de recalcular o valor de seus ativos. O resultado foram ajustes, as chamadas imparidades, que provocaram perdas de R$ 48 bilhões. A redução dos preços do petróleo tornou menos favorável a exploração das jazidas, tanto as mais antigas, da Bacia de Campos, quanto as do pré-sal. Com isso, o valor das plataformas de petróleo diminui. “Ajustamos o valor dos negócios de exploração e produção, assim como, no ano passado, havíamos ajustado o valor dos ativos ligados ao setor de abastecimento”, disse Bendine. Esse é um ajuste que não afeta o caixa da empresa.
Com tudo isso, vale a pena comprar a ação? O assunto é, como o óleo que jorra das plataformas, altamente inflamável, ainda mais em tempos de Lava Jato e ânimos políticos exaltados. A resposta de um analista de um banco internacional à solicitação de uma entrevista foi “nem sob tortura”. Mesmo assim, DINHEIRO ouviu três profissionais de mercado que comentaram os resultados da empresa, e obteve outros dois relatórios. Na média, a opinião dos especialistas do mercado é neutra: não vale a pena apostar nem na alta nem na baixa dos papéis. O fato de a empresa já ter anunciado que não vai pagar dividendos referente a 2016 é outro ponto negativo.
Em um dos relatórios, o analista Diego Mendes, do Itaú BBA, avalia que os resultados operacionais foram melhores do que o esperado. Em sua avaliação, a geração de caixa operacional medida pelo Ebitda foi de R$ 17,1 bilhões. Retirando-se provisões e contingências, esse número ajustado seria de R$ 22,1 bilhões. “Isso é 8% acima de nossas expectativas e 19% acima do consenso do mercado”, escreveu ele. Mesmo assim, Mendes avalia as ações como em linha com o desempenho do mercado e não recomenda sua compra. “Os investidores estão prestando menos atenção aos fundamentos e negociando os papéis com base nas cotações do petróleo e na melhoria das expectativas sobre o Brasil”, escreveu ele.
Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora, avalia que o grande problema da empresa é sua dívida. “Sem as baixas contábeis, o resultado do ano representaria um retorno sobre o investimento de 15% para o acionista, ao valor de mercado atual”, escreveu ele. Mesmo com o encolhimento das margens, diz Silveira, a atividade de extrair e refinar petróleo é perfeitamente viável se a Petrobras equacionar seu pesado endividamento. Isso, porém, é difícil no curto prazo. A estatal teria de se valer do mercado de capitais para levantar recursos por meio da venda de ações em um momento de bolsas em baixa e desconfiança em alta. A alternativa é vender ativos, algo que Bendine diz ser necessário, mas não possível no curto prazo. Ou esperar que parte dos R$ 2,9 bilhões já recuperados pela Lava Jato voltem à estatal. “Já recuperamos R$ 300 milhões, e temos de esperar novas devoluções”, diz Bendine.