O superfaturamento de contratos e o desvio de recursos encontrados nas investigações da Operação Lava Jato tiveram duas explicações bem diferentes nos depoimentos à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras, na Câmara dos Deputados, na última semana. Na terça-feira 10, o ex-gerente de Serviços da empresa Pedro Barusco jogou por terra a tentativa do governo de ampliar a investigação para o período anterior a 2005. Embora tenha confirmado que começou a receber propina em 1997 ou 1998, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, Barusco garantiu que se tratava de uma iniciativa pessoal, não de um esquema envolvendo outros fincionários.

“De forma mais ampla, com outras pessoas da Petrobras, mais institucionalizada, foi a partir de 2003 ou 2004”, afirmou. Segundo o ex-gerente, a partir desse período, os contratos tinham um acréscimo de 1% a 2% e a propina recebida dos fornecedores era dividida com o Partido dos Trabalhadores (PT). Entre 2003 e 2013, quando deixou o cargo, ele calcula ter recebido cerca de US$ 50 milhões e estima que entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões tenham sido entregues ao tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Os encontros, conta Barusco, eram normalmente marcados em hotéis, e muitas vezes Vaccari se reunia com o ex-diretor Renato Duque, também integrante do esquema, assim como os executivos Jorge Luiz Zelada e Roberto Gonçalves.

Barusco concordou em devolver cerca de R$ 300 milhões, dos quais R$ 182 milhões já foram repatriados do exterior pelo Ministério Público. Dois dias depois, José Sérgio Gabrielli, que presidiu a empresa entre 2005 e 2012, deu uma versão completamente diferente para os desvios de conduta verificados na empresa. “Eu digo, peremptoriamente, que não há corrupção sistêmica na Petrobras”, afirmou Gabrielli. “Há casos individualizados.” Ele diz que o tamanho da empresa, com 80 mil funcionários, que chegou a investir US$ 40 bilhões por ano, não permite afirmar com certeza que isso não ocorre, mas disse considerar os valores citados pela investigação como relativamente pequenos.

A Polícia Federal e o Ministério Público estimam que o esquema movimentou cerca de R$ 10 bilhões. Gabrielli concordou que os custos de construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, um dos focos da Operação Lava Jato, ficaram fora “dos padrões internacionais”. A obra, orçada em US$ 2 bilhões, acabou custando US$ 18,8 bilhões. Nas seis horas de depoimento, ele foi acusado de falar “inverdades” e de ser “conivente” com o esquema de corrupção da Petrobras. A convocação da quinta-feira 12 foi o sexto depoimento de Gabrielli a diferentes comissões do Congresso em menos de um ano, quando os parlamentares começaram a discutir o prejuízo na compra da refinaria de Pasadena.

Nos meses seguintes, o assunto ganhou fôlego com as descobertas da Lava Jato. Ainda assim, uma CPI instalada no ano passado para investigar o tema foi dominada pelos partidos da base aliada e terminou sem conclusão. Com a divulgação da lista de parlamentares suspeitos de receber recursos, há grandes chances de que a CPI perca fôlego. Citado no relatório do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, como beneficiário de recursos desviados da Petrobras, doados legalmente por construtoras, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), compareceu espontaneamente na sessão da quinta-feira.

Seu depoimento transformou-se num de ato de desagravo dos colegas, que temem ver seus nomes citados. “Não vim aqui buscar qualquer aplauso ou situação de desagravo”, afirmou Cunha. “Vim em respeito ao processo investigativo do maior esquema de corrupção desse país.” Vários deputados concordaram com a afirmação de Cunha de que a lista teve influência política, o que acabou dando o tom dos trabalhos na CPI. Na prática, ex-dirigentes das empresas são tratados com firmeza, enquanto os parlamentares suspeitos tendem a ser vistos como vítimas.